No. 1199
Sermão pregado no Domingo, 18 de Outubro de 1874.
Por Charles Haddon Spurgeon.
No Tabernáculo Metropolitano, Newington, Londres
“E, posto em agonia, orava mais intensamente. E o seu suor
tornou-se em grandes gotas de sangue, que corriam até ao chão.” (Lucas 22:44)
Quando nosso Senhor terminou de comer a Páscoa e celebrar a
ceia com seus discípulos, foi com eles ao Monte das Oliveiras, e entrou no
jardim do Getsêmani. O que o induziu a selecionar esse lugar para que fosse a
cena de sua terrível agonia? Porque haveria de ser arrastado ai por seus
inimigos de preferência a qualquer outro lugar? Por acaso é difícil que
entendamos que assim como num jardim a auto-complacência de Adão nos arruinou,
também em outro jardim as agonias do segundo Adão deveria nos restaurar? O
Getsemani ministra as medicinas para curar os males que foram a consequência do
fruto proibido do Éden. Nenhuma flor que tenha florescido nas ribeiras do rio repartido
em quatro braços foi alguma vez tão preciso para nossa raça como foram essas
ervas amargas que com dificuldade cresciam as margens do enegrecido e sombrio
ribeiro de Cedrom o foram.
Por acaso nosso Senhor também não pode se lembrar de Davi,
quando naquela memorável ocasião, saiu da cidade escapando de seu filho
rebelde, segundo está escrito: ―também o rei passou o ribeiro de Cedrom, e
passou todo o povo na direção do caminho do deserto.” (2 Samuel 15:23), e ele e
seu povo subiram descalços e com a cabeça descoberta, chorando em alta voz
enquanto subiam? Eis aqui, Um mais grande que Davi abandonando o templo e se
acha desolado, e deixa a cidade que havia rejeitado suas advertências, e com um
coração cheio de tristeza atravessa o pestilento ribeiro, para buscar na
solidão um alívio para suas angústias. Mais ainda, nosso Senhor queria que nós
víssemos que nosso pecado havia mudado tudo ao redor Dele em aflição, converteu
suas riquezas em pobreza, sua paz em duros trabalhos, sua glória em vergonha, e
assim também o lugar de seu retiro pleno de paz, onde em santa devoção tinha
estado tão próximo do céu em comunhão com Deus, nosso pecado transformou no
foco de sua aflição, o centro de sua dor. Ali onde seu deleite tinha sido
maior, ali estava chamado a sofrer sua máxima aflição.
Também pode ser que nosso Senhor tenha escolhido o jardim
porque, necessitado de qualquer recordo que o ajudasse no conflito, sentia o
refrigério que lhe viria ao lembrar-se das horas passadas transcorridas ali com
tanta quietude. Ali tinha orado, e obtido força e consolo. Essas enroladas e
retorcidas oliveiras o conheciam muito bem; não havia no jardim uma só folha
sobre a que Ele não houvera se ajoelhado. Ele havia consagrado esse lugar para
comunhão com Deus. Não é nenhuma surpresa, então, que tenha preferido essa
terra privilegiada. Assim como um enfermo escolheria estar em sua própria cama,
assim Jesus escolheu suportar sua agonia em seu próprio oratório, onde as
lembranças dos momentos de comunhão com Seu Pai estariam de maneira vivida
diante Dele.
Porem, provavelmente, a principal razão para ir ao Getsêmani
foi que era um lugar muito conhecido e frequentado por Ele, e João nos diz: ―e
também Judas, o que o entregava, conhecia aquele lugar.‖ Nosso Senhor não
desejava se esconder, não precisava ser perseguido como um ladrão, ou ser
buscado por espias. Ele foi valorosamente ao lugar onde seus inimigos conheciam
que Ele tinha o costume de orar, pois Ele queria ser tomado para sofrer e
morrer. Eles não o arrastaram ao pretório de Pilatos contra sua vontade, mas
sim que foi com eles voluntariamente. Quando chegou a hora de que fosse traído,
ali Ele estava, num lugar onde o traidor poderia o encontrar facilmente, e
quando Judas o traiu com um beijo, sua face estava pronta para receber a
saudação traidora. O bendito Salvador deleitava-se no cumprimento da vontade do
Senhor, ainda que isso implicasse a obediência até a morte.
Chegamos assim até a porta do jardim do Getsêmani, portanto,
entremos; porem, primeiro, tiremos os sapatos, como Moises quando viu a sarça
ardendo com fogo que não se consumia. Certamente podemos dizer com Jacó: ―Que
terrível é esse lugar!‖ Temo diante da tarefa que tenho em minha frente, pois,
como meu débil discurso poderia descrever essas agonias, para as quais os
fortes clamores e as lágrimas seriam escassamente uma adequada expressão?
Quero, juntamente com vocês, repassar os sofrimentos de nosso Redentor, porem,
oh, que o Espírito de Deus nos impeça qualquer pensamento fora de lugar ou que
nossa língua expresse uma só palavra que seja depreciativa para Ele, seja em
Sua humanidade imaculada ou em sua gloriosa Deidade.
Não é fácil quando se está falando de Alguém que é por sua
vez Deus e homem, manter a linha exata da expressão correta; é tão fácil
descrever o lado divino como se estivéssemos entrincheirados no humano, ou
retratar o lado humano às custa do divino. Por favor, perdoem de antemão
qualquer erro. Um homem precisa ser inspirado, ou limitar-se nada mais às
palavras inspiradas, para poder falar adequadamente em todo momento sobre o ―grandioso
mistério da piedade,” Deus manifestado em carne. Especialmente
quando esse indivíduo tem que refletir sobre Deus manifesto tão claramente na
carne sofredora, que as características mais frágeis da humanidade se convertem
nas mais notórias. Oh Senhor, abra Tu meus lábios para que minha língua possa
falar as palavras corretas.
I. Meditando na cena da agonia no Getsêmani, somos obrigados
a dar-nos conta que nosso Salvador suportou ai uma tristeza desconhecida em
qualquer outra etapa de Sua vida, portanto, vamos começar nosso discurso
fazendo a seguinte pergunta: QUAL ERA A CAUSA DESSA TRISTEZA ESPECIAL DO
GETSÊMANI? Nosso Senhor era ―varão de dores e experimentado no sofrimento‖ ao
longo de toda Sua vida, no entanto, ainda que soe paradoxo, penso que
dificilmente existiu sobre a face da terra um homem mais feliz que Jesus de
Nazaré, pois as dores que Ele teve que suportar foram compensadas pela paz da
pureza, a calma da comunhão com Deus, e a alegria da benevolência. Todo homem
bom sabe que a benevolência é doce e seu nível de doçura aumenta em proporção a
dor suportada voluntariamente quando se cumprem seus amáveis desígnios. Fazer o
bem sempre produz alegria.
Mais ainda, Jesus tinha uma perfeita paz com Deus todo o
tempo; sabemos que isso era assim porque Ele considerava essa paz como uma
herança especial que Ele podia deixar a seus discípulos, e antes de morrer
disse-lhes: ―A paz os deixo, a minha paz os dou.‖ Ele era manso e humilde de
coração, e, portanto sua alma possuía o descanso; Ele era um dos mansos que
herdam a terra; um dos pacificadores que são e que devem ser abençoados. Estou
certo que não me equivoco quando afirmou que nosso Senhor estava longe de ser um
homem infeliz.
Porem, no Getsêmani, tudo parece ter mudado. Sua paz o
abandonou, Sua calma se converteu em tempestade. Depois
da ceia, nosso Senhor tinha cantado um hino, porem no Getsêmani não havia
cantos. Descendo pela encosta que levava de Jerusalém a torrente do Cedrom, Ele
falava com muita vivacidade, dizendo: ―eu sou a videira, vós os ramos,‖ e essa
maravilhosa oração com que orou com Seus discípulos depois desse sermão, está
repleta de majestade: ―Pai, aqueles que me tens dado, quero que onde eu esteja,
também eles estejam comigo.‖ É uma oração muito diferente dessa oração dentro
dos muros do Getsêmani, onde clama: ― Pai, se possível, passe de mim esse
cálice.‖ Observem que dificilmente ao largo de toda sua vida o observam com uma
expressão de angustia, e no entanto, aqui Ele fala, não só mediante suspiros e
suor de sangue, mas também por meio das seguintes palavras: ―Minha alma está
muito triste, até a morte.‖ No jardim, o homem que sofria não podia ocultar sua
angustia, e dá a impressão que não queria fazê-lo.
Jesus regressou onde estavam seus discípulos em três
ocasiões, permitiu-lhes observar Sua angustia e apelou pela simpatia deles;
suas exclamações eram lastimosas, e sem dúvida deve ter sido terrível escutar
Seus sussurros e gemidos. Essa angustia manifestou-se primordialmente no suor
de sangue, que é um fenômeno inusitado, ainda que suponho que devemos crer
nesses escritores que registram casos muito similares. O velho médico Galeno
nos fala de um caso em que, pelo horror extremo, um indivíduo suou um suor
colorido, quase que avermelhado, que tinha aparência de sangue. Outros casos
também são relatados por autoridades médicas.
No entanto, nós não vemos em nenhuma outra ocasião nada
parecido na vida de nosso Senhor; foi somente no ultimo lance horrendo rodeado
de oliveiras que nosso Campeão resistiu até o sangue, agonizando contra o
pecado. O que doía a Ti, ó Senhor, que padecias tão dolorosamente nesse
momento?
Fica-nos muito claro que sua profunda angústia e inquietude
não eram causadas por nenhuma dor física. Sem dúvida nosso Salvador estava
familiarizado com a enfermidade e a dor, pois Ele tomou nossas enfermidades,
porem nunca antes se queixou de algum sofrimento físico. Nem tampouco ao
momento de entrar no jardim do Getsêmani havia sido afligido por algum dolo.
Sabemos por que está escrito: ―Jesus chorou.‖ Era porque seu amigo Lázaro
estava morto; porem, no jardim não havia nenhum funeral, nem enfermo, nem causa
de angústia relacionada a esses temas. Nem tampouco se deveu a que houvesse se
lembrado de ofensas do passado que estivessem a flor de Sua mente. Muito antes
disso sabemos que: ―Afrontas me quebrantaram o coração‖ (Salmos 69:20), e tinha
conhecido em toda sua extensão os abusos da injúria e do desprezo. O haviam
chamado de ―homem comilão e beberrão,‖ o tinham acusado de lançar fora aos
demônios pelo príncipe dos demônios; já não podiam dizer mais e, no entanto,
Cristo havia enfrentado tudo valorosamente. Não podia ser possível que agora
Ele estivera muito triste até a morte por tal causa. Deve ter havido algo mais
agudo que a dor, mais cortante que a censura, mais terrível que o luto, que
nesse momento contendia com o Salvador, e o levava a ―entristecer-se e
angustiar-se em grande medida.‖
Por acaso supõem que era o temor do escárnio que se
avizinhava ou o terror da crucificação? Era medo ao pensar na morte? Não é
certo que essa suposição seria impossível? Todos os homens temem à morte, e
como homem, Jesus não poderia menos do que estremecer-se frente a ela.
Quando fomos feitos originalmente fomos criados para a
imortalidade, portanto morrer é estranho e incompatível para nós e o instinto
de conservação fazer que nos esquivemos diante da morte; porem, certamente no
caso de nosso Senhor essa causa natural não podia gerar esses resultados tão
especialmente dolorosos. Se nós que somos uns pobres covardes não suamos
grandes gotas de sangue, por que então causava tal terror Nele? Não é honroso
para nosso Senhor que o imaginemos menos valente que seus próprios discípulos,
e, no entanto temos visto triunfantes a alguns dos santos mais frágeis diante
do prospecto da partida.
Leiam as histórias dos mártires, e com frequência verão
alegres diante dos mais cruéis sofrimentos que se avizinhavam. O gozo do Senhor
lhes deu tal força que nenhum pensamento covarde os alarmou em um só instante.
Eles foram para fogueira ou para onde seriam decapitados, com salmos de vitória
em seus lábios. Não devemos considerar nosso Senhor como inferior a Seus mais
valentes servos. Não pode ser que Ele trema ali onde eles foram valorosos. Oh
não, o espírito mais nobre nesse esquadrão de mártires é o Líder mesmo, que
tanto no sofrimento como no heroísmo, os superou todos; ninguém podia desafiar
de tal maneira as dores da morte como o Senhor Jesus, o qual, pela alegria
posta diante Dele sofreu a cruz, menosprezando o opróbrio.
Não posso conceber que as angustias do Getsêmani foram
ocasionadas por algum ataque extraordinário de Satanás. É possível que Satanás
estivesse ali, e que sua presença houvera obscurecido a sombra, porem ele não
era a causa mais proeminente dessa hora de escuridão. Pelo menos isso está
muito claro, que nosso Senhor, ao início de Seu ministério se envolveu em um
duelo muito severo com o príncipe das trevas. No entanto, não lemos com relação
à tentação no deserto uma só silaba que nos diga que Sua alma estava triste em
extremo, nem mesmo encontramos que ―começou a entristecer-se e a angustiar-se,‖
nem existe tampouco uma só indicação solitária de algo que fora parecido ao
suor sangrento. Quando o Senhor dos anjos condescendeu em enfrentar-se com o
príncipe do poder do ar, não lhe teve nenhum medo como para clamar em grande
voz e derramar lágrimas e cair prostrado em terra rogando três vezes ao Grandioso
Pai. Falando comparativamente, colocar Seu pé sobre a serpente antiga foi uma
tarefa fácil para Cristo, e lhe custou uma ferida no calcanhar, mas essa agonia
do Getsêmani feriu Sua alma até a morte.
O que vocês crêem então que foi o que marcou de maneira tão
especial o Getsêmani e às angústias que ali tiveram parte? Cremos que o Pai o
colocou a sofrer ali por nós. Era nesse momento que nosso Senhor tinha que
tomar certa copa da mão do Pai. A prova não vinha nem dos judeus, nem do
traidor Judas, nem dos discípulos que cochilavam, nem do diabo, mas sim que era
um cálice que tinha sido cheira por Um que Ele sabia que era Seu Pai, mas que,
no entanto, lhe havia designado uma porção muito amarga, uma copa que não era
para o corpo bebera, nem para derramar seu fel sobre sua carne, mas sim uma
copa que de maneira especial atordoava Sua alma e afligia o íntimo de Seu
coração. Ele retrocedia em frente dela, e, portanto podem estar seguros que foi
um gole mais terrível que a dor física, pois frente a ela não arredava; era uma
porção mais terrível que o vitupério. Disso não havia tratado jamais de
escapar; mais horrível que a tentação satânica. Ele a havia vencido: era algo
inconcebivelmente terrível, repleto de horror de forma surpreendente, que vinha
da mão do Pai. Isso elimina toda dúvida quanto ao que era, pois lemos: ―Todavia,
ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por
expiação do pecado” (Isaías 53:10) ―Mas o Senhor carregou nele o pecado de nós
todos.‖ Ao que não conhecia pecado, por nós o fez pecado. Então, isso é o que
ocasionou que o Salvador experimentava uma extraordinária depressão. Ele estava
próximo a ―que pela graça de Deus provasse a morte por todos,‖ e levar a
maldição que os pecadores mereciam. Porque esteve no lugar dos pecadores,
sofreu no lugar deles. Aqui está o segredo dessas agonias que não é possível
declarar ordenadamente diante de vocês, tão certo é que:
“Somente para Deus, e unicamente para Ele Suas angustias são
plenamente conhecidas.”
No entanto, quero exortá-los para que considerem por um
momento essas angustias, para que possam amar a Quem as sofreu. Agora se dava
conta, talvez pela primeira vez, o que significava carregar com o pecado. Como
Deus, era perfeitamente santo e incapaz de pecar, e como homem estava sem
mancha original, puro e sem nenhuma contaminação; no entanto, teve que carregar
com o pecado, ser levado como bode expiatório carregando com a iniquidade de
Israel sobre sua cabeça, ser tomado e feito uma oferenda pelo pecado, e como
uma coisa desprezível (pois nada era mais desprezível que a oferenda do
pecado), ser levado fora do acampamento e ser totalmente consumido pelo fogo da
ira divina.
O surpreende que sua infinita pureza resistira diante disso:
Teria sido o que Ele era se houvera deixado de ser um assunto extremamente
solene para Ele estar ante Deus na posição do pecador? E como Lutero o
expressou, ser visto por Deus como se Ele fosse todos os pecados do mundo, e
como se Ele houvesse cometido todo o pecado que foi cometido em todos os tempos
por Seu povo, pois todo esse pecado foi colocado sobre Ele, e sobre Ele devia
tombar toda a violência que esse pecado exigia; Ele de tinha que ser o centro de toda a vergonha e carregar sobre
Ele com todo o que deveria recair sobre os culpados filhos dos homens.
Estar nessa posição quando já era uma realidade deve ter
sido muito terrível para a alma santa do Redentor. Também a mente do Salvador
estava fixamente concentrada na aborrecível natureza do pecado. O pecado sempre
foi algo aborrecível para Ele, porem agora Seus pensamentos estavam absortos
nele, viu sua natureza que a palavra de um mortal não poderia descrever, seu
caráter atroz, e seu horrível propósito.
Provavelmente nesse momento teve uma visão como homem, mais
clara do que em qualquer outro momento, do amplo alcance e do mal do pecado que
a tudo contamina, e um sentido da negrura de suas trevas, e da desesperada
condição de culpa como um ataque direto sobre o trono, sim, e sobre o próprio
ser de Deus. Ele viu em sua própria pessoa até onde poderia chegar o pecador,
como podiam vender a seu Senhor como Judas, buscando destruí-lo como os judeus
fizeram.
O cruel e pouco generoso tratamento que Ele mesmo tinha
recebido fazia patente o ódio do homem para Deus, e, ao vê-lo, o horror
apoderou-se Dele, e Sua alma estava triste ao pensar que tinha que carregar com
todo esse mal e tinha que ser contado entre tais transgressores, ser ferido por
suas transgressões, e golpeado por suas iniquidades. Nem as feridas nem os
golpes o afligiam tanto como o pecado mesmo, e isso sobrecarregava
completamente Sua alma.
Sem dúvida nesse momento a pena pelo pecado começou a ser
percebida por Jesus no jardim: primeiro o pecado, que o havia posto na posição
de um substituto que sofre, e depois a pena que devia suportar, ao estar nessa
posição de substituto. Lamento ao máximo esse tipo de teologia que é tão comum
nesses dias, que busca depreciar e diminuir nosso entendimento dos sofrimentos
de nosso Senhor Jesus Cristo. Irmãos, não foi um sofrimento insignificante esse
que recompensou a justiça de Deus pelos pecados dos homens. Jamais temo
exagerar quando falo do que meu Senhor teve que suportar. Todo o inferno foi destilado
nessa copa, da qual nosso Deus e Salvador Jesus Cristo foi obrigado a beber.
Não era sofrimento eterno, mas devido que Ele é divino, pode
oferecer a Deus em um curto tempo o desagravo de sua justiça, que os pecadores
no inferno não poderiam ter oferecido ainda que sofressem em suas pessoas por
toda a eternidade. A dor que quebrantou o espírito do Salvador, o grande oceano
sem fundo de angustia inexpressável que inundou a alma do Salvador quando
morreu, é tão inconcebível, que não posso me aventurar muito longe, para não
ser acusado de um vão intento de expressar o inexpressável. Porem, sim, posso
dizer isso, a simples espuma proveniente desse mar tempestuoso, ao cair sobre
Cristo, o batizou em um suor sangrento. Ainda não havia se aproximado as ondas
impetuosas do castigo mesmo, mas simplesmente o ato de estar de pé na costa, ao
ouvir as terríveis ondas rompendo seus pés, sua alma estava muito confusa e
triste. Era a sombra da tempestade que se aproximava, era o prelúdio do
terrível abandono que devia suportar, ao estar onde tinha que estar, e pagar à
justiça de seu Pai a dívida que nós deveríamos pagar – isso o tinha derribado.
Ser tratado como um pecador, ser castigado como um pecador, ainda que Nele não
havia pecado, tudo isso é o que ocasionava Nele a agonia a que nosso texto se
refere.
II. Tendo falado assim da causa de sua especial angustia,
penso que poderemos fundamentar nosso ponto de vista sobre a matéria, enquanto
os levamos a considerar QUAL ERA O CARÁTER DESSA ANGÚSTIA. Irei tratar de
evitar o excessivo uso das palavras gregas usadas pelos evangelistas – estudei
cada uma delas, para descobrir os matizes de seus significados, porem será
suficiente se lhes dou os resultados de minha cuidadosa investigação. Qual era
essa angustia? Como foi descrita? Essa grande pena assediou nosso Senhor mais
ou menos quatro dias antes de sua paixão. Se lemos em João 12:27, achamos essa
assombrosa expressão: ―Agora está minha alma perturbada‖ Nunca o escutamos
dizer algo igual antes. Isso era uma antecipação da grande depressão do
espírito que pronto o ia prostrar no Getsêmani. ―Agora a minha alma está
perturbada; e que direi eu? Pai, salva-me desta hora; mas para isto vim a esta
hora. (João 12:27)‖ Depois lemos em Mateus 26:37, que ―começou a entristecer-se
e a angustiar-se muitíssimo.” A depressão havia chegado para Ele novamente. Não
era dor, não eram palpitações do coração, nem uma dor de cabeça, era algo pior
que todas essas coisas. A turbação de espírito é pior que a dor corporal; a dor
poder trazer problemas e converter-se na causa incidental de angústia, porem,
se a mente está perfeitamente tranquila, um homem pode suportar a dor sem
maiores problemas, e quando a alma está radiante e levantada com um gozo
interno, a dor do corpo quase é esquecida. A alma conquista ao corpo.
Por outro lado, a dor da alma é a causa de dor corpórea. A
natureza inferior se harmoniza com a natureza superior. O principal sofrimento
de nosso Senhor estava em Sua alma. Os sofrimentos de Sua alma eram a alma de
Seus sofrimentos. ―Quem suportará ao ânimo angustiado?‖ a dor de espírito é a
pior das dores, a tristeza de coração é o ápice das aflições. Que todos aqueles
que conheceram alguma vez a depressão do espírito, o abatimento e a escuridão
mental, confirmem a verdade do que eu digo!
Essa angústia de coração parece ter levado o espírito de
nosso Senhor a uma profundíssima depressão. No capítulo 26 de Mateus, no
versículo 37 está registrado que Ele ―começou a entristecer-se e a angustiar-se
muito” e essa expressão está cheia de significado. Muito mais conteúdo, em
verdade, do que poderíamos explicar com facilidade. A palavra em seu texto
original é muito difícil de traduzir. Pode significar a abstração da mente, e a
completa invasão da mente pela angústia, de tal forma que qualquer outro
pensamento que poderia aliviar a pena fica totalmente excluído. Um pensamento
lacerante consumia Sua alma inteira, e queimava tudo que houvera podido dar
consolo. Por uns instantes Sua mente se recusou a considerar o resultado de Sua
morte, o conseguinte gozo colocado diante Dele. Sua posição como O que carregou
com o pecado, e o requerido abandono de Seu Pai, embargava todas as Suas
meditações, impedindo que Sua alma se fixasse em alguma outra coisa.
Alguns viram nessa palavra uma medida de distração, e ainda
que não adentrarei muito nessa direção, pareceria como que a mente de nosso
Salvador tivesse experimentado perturbações e convulsões muito distantes de Sua
usual calma e de seu espírito recolhido. Era lançado de um lado a outro como
que sobre um poderoso mar embravecido, envolto na tormenta, arrastado por sua
fúria. ―e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. (Isaías
53:4)‖ Como o salmista disse, inumeráveis males o cercavam de tal forma que seu
coração decaia. Seu coração se derretia como cera em suas entranhas em um
completo desmaio. Começou a ―angustiar-se muito.‖ Alguns consideram que a raiz
da palavra significa: ―separado do povo,‖ como se o houvesse convertido em alguém
diferente dos demais homens, assim como alguém cuja mente está atordoada por um
golpe súbito, ou está oprimida por uma surpreendente calamidade, não se
comporta mais como os homens comuns.
Os simples espectadores teriam pensado que nosso Senhor era um
homem atordoado, sobrecarregado mais além dos limites humanos, e submergido em
uma angústia sem paralelo entre os homens. O estudioso Thomas Goodwin1 disse: ―a
palavra denota um defeito, uma deficiência, e um espírito abatido como sucede
com as pessoas que sofrem de uma enfermidade e um desmaio.‖ A enfermidade de
Epafrodito2, que o levou a
1 Thomas Goodwin (1600-1680), conhecido como "o
Velho", foi um teólogo inglês puritano e pregador, e um importante líder
dos religiosos Independentes (Congregacionais). Ele atuou como capelão de
Olliver Cromwell. (Fonte: http://historiacongregacional.blogspot.com)
2 Epafrodito foi um companheiro de Paulo de Tarso durante
suas viagens missionárias e é mencionado na Epístola aos Filipenses (Filipenses
2:25 e Filipenses 4:18). beira da tumba, é descrita utilizando-se da mesma
palavra: assim que, vemos que a alma de Cristo estava enferma e desfalecida.
Por acaso seu suor não foi gerado pela prostração? O suor
frio, pegajoso dos moribundos é produzido pela fraqueza corporal, mas o suor
sangrento de Jesus era produzido pelo total desfalecimento e prostração de Sua
alma. Sua alma estava em um terrível desmaio, e sofria da morte interna, cujo
acompanhamento não era as lágrimas usuais dos olhos, mas sim um choro de sangue
proveniente do homem inteiro. Muitos de vocês, no entanto, conhecem em certa
medida o que significa estar angustiado em grande medida sem que eu tenha que
multiplicar minha explicação, e se vocês não o sabem por experiência pessoal,
todas minhas explicações resultam serem vãs. Quando o profundo desalento
chegue, quando não possam se lembrar de nada que os possa sustentar, e seu
espírito decaia profundamente, profundamente, profundamente, então poderão
sentir dor juntamente com seu Senhor.
Outros os consideram néscios, os chamam de nervosos, e lhes
pedem que se reanimem, porem, desconhecem completamente seu caso. Se o
entendessem não zombariam deles com tais advertências, impossíveis para os que
estão afundando-se sob o peso da aflição interna. Nosso Senhor estava ―muito
angustiado‖, muito abatido, muito desalentado, sobrecarregado pela pena.
Marcos nos diz, continuando, no capítulo 14, versículo 33,
que nosso Senhor ―começou a ter pavor, e a angustiar-se‖ A palavra grega não
tem somente a conotação de que Ele estava assombrado e surpreendido, mas sim
que Sua estupefação chegava ao limite do horror, como o que os homens
experimentam quando os pelos se lhes arrepia e sua carne treme. Assim como
quando Moisés recebeu a Lei estava temeroso e tremendo em extremo, e como disse
Davi: “meu corpo se arrepiou com temor de ti, e temi os teus juízos.” (Salmo
119:120), assim nosso Senhor foi alcançado pelo horror diante do espetáculo do
pecado que foi depositado sobre Ele e a vingança que era exigida por sua causa.
O Salvador estava primeiro ―profundamente afligido‖, logo deprimido, e ―angustiado‖,
e finalmente, agudamente estupefato e cheio de assombro; pois, mesmo Ele em sua
condição de homem, escassamente pode saber o que era que se havia comprometido em carregar. O tinha
considerado com calma e tranquilidade, e tinha sentido que independentemente do
que fora, Ele o carregaria por nós; porem, quando chegou o momento de carregar
realmente com o pecado, estava totalmente perplexo e surpreendido pela terrível
posição de estar no lugar do pecador diante de Deus, de que Seu santo Pai o
contemplara como o representante do pecador, e de ser abandonado por
esse Pai com quem Ele havia vivido em termos de amizade e
deleite desde toda a eternidade. Isso fazia cambalear sua natureza santa,
terna, cheia de amor, e Ele estava ―profundamente afligido‖ e ―angustiado‖.
É-nos ensinado que um oceano o encerrava, o envolvia e o
abatia, pois o versículo 38 do capítulo 26 de Mateus contem a palavra perilupos
que significa ―ficar completamente envolto no abatimento‖. Em todas as misérias
comuns geralmente existe alguma via de escape, algum lugar onde se pode
respirar esperança. Geralmente, podemos recordar de nossos amigos que estão em
problemas, que seu caso poderia ser pior, porem, não poderíamos imaginar o que
poderia ser pior nas aflições de nosso Senhor, pois Ele podia dizer com Davi: ―Os
cordéis da morte me cercaram, e angústias do inferno se apoderaram de mim;
encontrei aperto e tristeza.‖ (Salmo 116:3) Todas as ondas e as olas de Deus
passaram sobre Ele. Sobre Ele, debaixo Dele, ao redor Dele, interna e
externamente tudo era angustia, e não havia nenhuma fonte de alívio ou de
consolo. Seus discípulos não podiam o ajudar. Todos, menos um, dormiam, e o que
estava desperto, ia a caminho de o trair.
Seu espírito clamava na presença do Deus Todo Poderoso sob o
peso aplacante e sob a carga intolerável de suas misérias. Não houve piores
aflições do que as de Cristo, e Ele mesmo disse: ―Minha alma está muito triste‖,
ou rodeada de tristezas, ―até a morte‖. Ele não morreu no jardim, porem sofreu
o mesmo que se houvera morrido. Suportou intensamente a morte, ainda que não
extensamente. Quer dizer, não se estendeu até converter seu corpo em um cadáver,
mas foi tão intensa em dor como se verdadeiramente tivesse morto. Sua dor e sua
angústia equivaliam aos de uma agonia mortal, e só fizeram uma pausa quando
esteve à borda da morte.
Para coroar tudo, Lucas nos diz em nosso texto, que nosso
Senhor estava em agonia. A
expressão ―agonia‖ significa um conflito, uma contenda, uma luta. Com quem era
essa agonia? Com quem lutava? Eu penso que era consigo mesmo; a contenda aqui
assinalada não era com Seu Deus; não, ―não seja como eu quero, mas como tu‖ não
descreve uma luta com Deus; não era uma contenda com Satanás, pois, como já o
vimos, não teríamos ficado surpreendidos que se houvera sido esse o conflito,
mas sim que era um terrível combate consigo mesmo, uma agonia dentre de Sua
própria alma. Recordem que Ele teria podido escapar de toda a aflição se Sua
vontade assim o tivesse desejado, e naturalmente sua natureza humana dizia: ―Não
leves essa carga!‖ e a pureza de Seu coração dizia: ―Oh, não leves essa carga,
não te ponhas no lugar do pecador;‖ e a delicada sensibilidade de Sua
misteriosa natureza se retraia de qualquer tipo de conexão com o pecado: no
entanto, o amor infinito dizia: ―leva-a, dobre-se sob essa carga‖; e assim,
existia uma agonia entre os atributos de Sua natureza, uma batalha em uma
escala terrível na arena de Sua alma.
A pureza que não pode suportar entrar em contato com pecado
deve ter sido muito poderosa em Cristo, enquanto que o amor que não queria
permitir que seu povo perecesse era também muito poderoso. Era um conflito em
escala titânica, como se um Hércules tivesse encontrado outro Hércules; duas
forças tremendas lutavam e combatiam e agonizavam, no sangrento coração de
Jesus. Nada lhe causa a um homem maior tortura do que ser arrastado daqui para
lá por emoções em conflito; assim como a guerra civil é mais cruel e a pior das
guerras, assim uma guerra dentro da alma de um homem quando duas grandes
paixões nele pretendem o domínio, e ambas são também nobres paixões, causam um
problema e uma tensão que ninguém póde entender exceto quem experimenta essa
guerra.
Não me surpreende que o suor de nosso Senhor fora como
grandes gotas de sangue, quando tal pressão interna o triturava como um ramo de
uva pisoteado num lagar. Espero não ter olhado presuntivamente na arca, ou ter
visto dentro o lugar santíssimo coberto pelo véu; Deus não queira que a
curiosidade ou o orgulho me levem a querer intrometer-me onde o Senhor colocou
uma barreira. Os guiei tão perto como pude, e devo fechar a cortina de novo com
as palavras que acabo de usar:
“Somente para Deus, e unicamente para Ele
Suas angustias são plenamente conhecidas.”
III. Nossa terceira pergunta será QUAL FOI O ALÍVIO DE NOSSO
SENHOR EM TUDO ISSO ?
Ele buscou ajuda na companhia dos homens, e era muito natural que assim o
fizesse. Deus criou em nossa natureza humana uma necessidade de simpatia. É
perfeitamente normal que nós esperemos que nossos irmãos vigiem conosco em
nossa hora de provação; porem, nosso Senhor deu-se conta que os homens não eram
capazes de ajudá-lo; sem importar quanto seus espíritos queriam ajudar, sua
carne era fraca. Então, o que fez? Recorreu à oração, e especialmente a Deus em
seu caráter de Pai. Aprendi por experiência própria que não conheceremos a
doçura da Paternidade de Deus até que não experimentemos uma amarguíssima
angústia; posso entender que quando o Salvador disse: ―Aba, Pai,” foi a
angústia quem o reduziu como a um menino castigado a apelar queixosamente ao
amor de um Pai.
Na amargura de minha alma clamei: ―Sim, em verdade és meu
Pai, pelas entranhas de tua paternidade, tem piedade de Teu filho;‖ e aqui
Jesus suplica a Seu Pai como nós temos feito, e encontra consolo nessa súplica.
A oração era o canal do consolo do Redentor; verdadeira, intensa, reverente, a
oração que se repete, e depois de cada tempo de oração regressava a calma e
voltava para seus discípulos com uma medida de paz restaurada. Quando viu que
dormiam, suas aflições regressaram, e, portanto voltou a orar de novo, e cada
fez foi consolado, de tal forma que quando orou pela terceira vez já estava
preparado para se encontrar com Judas e com os soldados, e para ir com
silenciosa paciência ao juízo e à morte.
Seu grande consolo era a oração e a submissão à vontade
divina, pois quando colocou Sua própria vontade aos pés de Seu Pai a debilidade
de Sua carne não se queixou mais, sim que em doce silêncio, como uma ovelha
submetida aos tosquiadores, conteve a Sua alma em paciência e descanso.
Queridos irmãos e irmãs, se algum de vocês experimenta seu próprio Getsêmani e
suas pesadas aflições, imitem o seu Senhor recorrendo à oração, clamando a seu
Pai e aprendendo a submeter-se a Sua vontade.
Irei concluir sacando duas ou três aplicações de todo nosso
tema. Que o Espírito Santo nos instrua.
A primeira é essa: Conheçam, queridos irmãos, a humanidade
real de nosso Senhor Jesus Cristo. Não pensem Nele unicamente como Deus, ainda
que certamente é divino, porem sinta-o como relacionado com vocês, ossos de
seus ossos e carne de sua carne. Que plenamente Ele pode compreendê-los! Ele
foi carregado com todas as cargas de vocês, e afligidos com todas as aflições
de vocês. São muito profundas as águas pelas que vocês estão atravessando? No
entanto, não são profundas comparadas com as torrentes com as que Ele foi
golpeado. Jamais penetra no espírito de vocês alguma dor que seja estranha para
a Cabeça do pacto. Jesus pode identificar-se com todas as aflições de vocês,
pois sofreu muito mais do que vocês sofreram, portanto, é capaz de socorrê-los
em suas tentações. Devem apegar-se a Jesus como seu amigo íntimo, o irmão que
os ajudará na adversidade, e terão obtido um consolo que lhes permitirá
atravessar todas as profundezas.
Continuando, contemplem aqui o intolerável mal do pecado.
Você é um pecador, porem Jesus nunca o foi, e, no entanto, estar em lugar do
pecador foi tão terrível para Ele que estava muito triste, até a morte. O que
será para você um dia o pecado se é achado culpado ao final! Oh, se pudéssemos
descrever o horror do pecado não haveria nenhum de vocês que estaria satisfeito
de permanecer no pecado nem por um momento; creio que essa manhã, se elevaria dessa
casa de oração um lamento e gemidos tais que poderiam ser ouvidos nas próprias
ruas, se os homens e as mulheres aqui presentes que estão vivendo em pecado
pudessem entender realmente o que é o pecado, e qual é a ira de Deus que se
acumula sobre eles, e quais serão os juízos de Deus que muito logo os rodearão
e os destruirão, Oh alma, o pecado deve ser uma coisa terrível se ele aplacou
dessa forma a nosso Senhor. Se a pura imputação do pecado produziu suor
sanguinolento no santo e puro Salvador, o que produzirá o pecado mesmo:
Evitem-lhe, não passem perto dele, afastem-se de qualquer coisa que pareça ele,
caminham com muita humildade e cuidado com seu Deus para que o pecado não os
cause dano, porque é uma praga mortal, uma peste infinita.
Vejam em continuação, porem, oh, que poucos minutos me
restam para falar de tal lição, o amor sem par de Jesus, que por causa de vocês
e por mim não somente sofreu no corpo, mas sim que consentiu em carregar com o
horror de ser contado como um pecador, e colocar-se sob a ira de Deus por causa
de nossos pecados: ainda que lhe custou sofrer até a morte, e uma terrível
aflição, o Senhor se apresentou como nossa garantia antes que ver que nós
perecêssemos. Por acaso não poderíamos suportar com alegria a perseguição por
causa Dele? Não poderíamos trabalhar para Ele com total entrega? Somos tão
pouco generosos que Sua causa possa ter necessidades enquanto nós contamos com
os meios para ajudá-la? Somos tão baixos que sua obra pode chegar a um alto enquanto
nós temos a força para continuá-la? Os exorto pelo Getsêmani, meus irmãos, se
possuem uma parte e uma porção na paixão de seu Salvador, amem muito Àquele que
os amou verdadeiramente sem medida, e gastem-se e sejam gastos por Ele.
Outra vez vendo a Jesus no jardim, aprendemos a excelência e
a plenitude da expiação. Que negro sou, que sujo e desprezível aos olhos de
Deus! Eu só mereço ser lançado ao mais profundo do inferno, e me assombra que
Deus não me tenha lançado ali desde muito tempo; porem, entro no Getsêmani, e
observo essas torcidas oliveiras, e vejo a meu Salvador. Sim, o vejo
retorcendo-se no solo cheio de angústia, e escuto Seus gemidos do tipo que
nunca foram emitidos por nenhum peito anteriormente. Observo a terra e a vejo
vermelha com Seu sangue, enquanto Seu rosto está banhado de suor ensanguentado,
e digo a mim mesmo: ―Meu Deus, Meu Salvador, por que te afliges?‖ E Ele me
responde: ―Estou sofrendo por teu pecado,‖ e então sinto muito consolo, pois
enquanto quisera ter evitado a meu Senhor tal angústia, agora que a angústia
terminou, posso entender como Jeová pode perdoar-me, porque feriu a Seu Filho
em meu lugar.
Agora tenho esperança de ser justificado, pois trago diante
da justiça de Deus e diante de minha própria consciência a lembrança de meu
Salvador que sangra, e digo: ―Podes Tu demandar o pago duas vezes, primeiro a
mão de Teu Filho que agoniza, e depois de mim?‖ Pecador como sou, estou ante o
trono ardente da severidade de Deus, e não tenho medo. Podes queimar a mim, oh
fogo consumidor, quando não só tem queimado, mas sim que consumiu completamente
a meu Substituto? Não, por fé, minha alma vê a justiça satisfeita, a lei
honrada, o governo moral de Deus estabelecido, e, no entanto, minha alma que foi
antes culpada agora é absolvida e recebe a liberdade. O fogo da justiça
vingadora se extinguiu, e a Lei consumiu suas demandas mais rigorosas sobre a
pessoa Dele que foi feito uma maldição por nós, para que possamos ser feitos a
justiça de Deus Nele. Oh, a doçura do consolo que flui do sangue de expiação!
Obtenham esse consolo, meus irmãos, e nunca o deixem, Aferrem-se ao coração de
seu Senhor que sangra, e bebam do abundante consolo.
Por último, qual não será o terror do castigo que recairá
sobre aqueles homens que rejeitam o sangue expiatório, e que terão que estar
frente a Deus em suas próprias pessoas para sofrer por seus pecados. Lhes
direi, senhores, que dói a meu coração ao dizer-lhes isso, o que sucederá com
aqueles que rejeitam a meu Senhor. Jesus Cristo, meu Senhor e meu Deus, é um
sinal e uma profecia para vocês do que lhes passará. Não é em um jardim, mas
sim na cama de vocês onde sempre descansaram serão surpreendidos, e as dores da
morte se apoderarão de vocês. Serão entristecidos com uma tremenda tristeza e
remorso pela vida que desperdiçaram, e por terem rejeitado ao Salvador. Então,
o pecado que mais amam, sua lascívia favorita, como outro Judas, os trairá com
um beijo. Quando todavia sua alma dependure de seus lábios, será tomada e levada
por um grupo de demônios, e levada ao tribunal de Deus, tal como Deus tal como
Jesus foi levado a sala do juízo de Caifás. Haverá um juízo sumário, pessoal e
de alguma maneira privado, como resultado de qual serão enviados a prisão onde,
em trevas e rugir de dentes e pranto, passarão a noite antes da sessão do
tribunal que terão o juízo pela manhã. Então virá o dia, e virá a manhã da
ressurreição, e assim como nosso Senhor compareceu ante Pilatos, assim vocês
comparecerão diante do mais alto tribunal, não o de Pilatos, mas sim do
terrível trono de juízo do Filho de Deus, a Quem vocês desprezaram e
rejeitaram. Logo aparecerão testemunhas declarando contra vocês, não
testemunhas falsas, mas sim verdadeiras, e vocês ficarão sem fala, assim como
Jesus não disse nenhuma palavra frente seus acusadores. Logo, suas consciências
e desespero o sacudirão, até que se convertam em tal monumento de miséria, tal
espetáculo de desprezo, até poderem ser descritos adequadamente por outro ―Ecce
Homo‖, eis aqui o homem, e os homens o olharão e dirão: ―Eis ali o homem e ao
sofrimento que lhe sobreveio, porque desprezou a seu Deus e encontrava prazer
no pecado.‖
Depois, serão condenados. ―Apartai-vos de mim, malditos,‖
será a sentença que receberão, assim como ―Seja crucificado‖ foi a condenação
de Jesus. E serão levados pelos oficiais de justiça ao lugar de sua condenação.
Logo, igual ao Substituto dos pecadores, vocês exclamarão: ―Tenho sede,‖ porem
ninguém lhes dará nem uma gota de água; não provarão nada senão o fel da
amargura. Serão executados publicamente com todos os seus crimes escritos sobre
sua cabeça para que todos possam os ler e entendam que vocês foram justamente
condenados; e logo, zombarão de vocês, como zombaram de Jesus, especialmente se
professaram alguma religião falsa; todos os que passem por ai dirão: ―a outros
salvou, e a outros pregou, porem a si mesmo não se pode salvar.‖ O mesmo Deus
zombará de vocês. Não, não pensem que estou sonhando, Ele não há dito: ―Também
de minha parte eu me rirei na vossa perdição e zombarei, em vindo o vosso temor.‖
(Provérbios 1:2)?
Clamem a seus deuses nos que confiaram alguma vez! Obtenham
seu consolo das concupiscências nas que uma vez se deleitaram, oh vocês que
foram condenados para sempre! Para vergonha de vocês e para confusão de sua
nudez, vocês que desprezaram ao Salvador serão feitos espetáculo da justiça de
Deus para sempre. É correto que assim seja, a justiça corretamente o demanda
assim. O pecado fez que o Salvador sofresse uma agonia, não te fará sofrer a
você? Mais ainda, ademais de seu pecado, vocês rejeitaram ao Salvador, vocês
disseram: ―Não colocarei minha confiança Nele‖.
Voluntariamente, presunçosamente, e em contra de sua própria
consciência rejeitaram a vida eterna; e se morrem rejeitando a misericórdia, o
que pode resultar de tudo isso? Pois que primeiro seu pecado e logo sua
incredulidade os condenarão à miséria sem limites e sem fim. Deixem que
Getsêmani lhes advirta, deixem que Seus gemidos, Suas lágrimas e Seu suor
sangrento lhes sirvam de aviso. Arrependam-se do pecado e creiam em Jesus. Que Seu
Espírito assim se lhes permita, no nome de Jesus. Amém.
ORE PARA QUE O ESPIRITO SANTO USE ESSE SERMÃO PARA
EDIFICAÇÃO DE MUITOS E SALVAÇÃO DE PECADORES.
Traduzido de http://www.spurgeon.com.mx/sermon1199.html
Todo direito de tradução protegido por lei internacional de
domínio público
Sermão nº 1199 THE AGONY IN GETHSEMANE -
do volume 20 do
The Metropolitan Tabernacle Pulpit,
Tradução e revisão: Armando Marcos Pinto
Projeto Spurgeon - Proclamando a CRISTO crucificado.
www.projetospurgeon.com.br