Com efeito
confesso que alguns profetas têm um modo de dizer elegante e polido, até mesmo
esplendoroso, de modo que sua eloqüência não é inferior à dos escritores profanos.
E, com tais exemplos, o Espírito Santo quis mostrar que não lhe faltava
eloqüência, enquanto em outros lugares fez uso de um estilo não burilado, nem
pomposo. Entretanto, quer leias Davi, Isaías e outros, a quem a palavra flui suave
e aprazível; quer Amós, um vaqueiro, Jeremias e Zacarias, cuja linguagem, mais
áspera, tem o sabor da rusticidade, por toda parte se evidenciará essa
majestade do Espírito a que me referi.
Nem me
passa despercebido que Satanás é em muitos aspectos um imitador de Deus,
a fim de, mediante enganosa similaridade, melhor insinuar-se à mente dos simplórios.
Daí, com um linguajar desataviado e quase bárbaro, semeou ele habilidosamente
erros
ímpios, com os quais enganava míseras criaturas humanas, e não raro fez uso até
de formas obsoletas de discurso, para, sob esta máscara, encobrir suas
imposturas. Todavia, todos quantos são dotados mesmo de
discernimento mediato percebem quão vazia e repulsiva afetação é essa.
Quanto,
porém, respeita à Sagrada Escritura, ainda que, muitas vezes, indivíduos petulantes
a tentem corroer, entretanto se faz claro que ela está repleta de
ideias que não poderiam ser concebidas em bases estritamente humanas. Tenha-se
em vista a cada um dos profetas: não se achará sequer um que não haja excedido
em muito
à
capacidade humana, de forma que, todos os que não acham sua doutrina saborosa, são
homens que perderam o paladar e são totalmente néscios.
As
Institutas de João Calvino