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sexta-feira, 11 de abril de 2014

Um Avivamento Em Um Monte De Ossos




“Veio sobre mim a mão do Senhor; ele me levou pelo Espírito e
me deixou no meio de um vale que estava cheio de ossos... eram
mui numerosos... e estavam sequíssimos... Disse-me ele: Profetiza a
estes ossos, e dize-lhes: Ossos secos, ouvi a palavra do Senhor...
Então profetizei segundo me fora ordenado... e o espírito entrou
neles e viveram e se puseram de pé, um exército sobremodo
numeroso” (Ez 37).

Haveria na história humana, fosse na sagrada ou na secular, um quadro mais ridículo que esse? É a encarnação da desesperança. Quem pode dizer que já pregou para uma platéia de surdos-mudos?
Um pregador lida com possibilidades, mas o profeta com o impossível. Isaías tivera uma visão de sua nação, em que ela estava coberta de feridas purulentas. Mas aqui, a enfermidade avançara e dera lugar à morte, e à morte, à desintegração orgânica. Agora ali estava um monte de ossos desarticulados, a própria imagem do desespero. Era uma situação que poderia ter uma legenda em letras garrafais: SEM SOLUÇÃO. Para se realizar o que é possível, não é necessário ter fé. No entanto, basta uma quantidade insignificante dessa “substância” que possui a força do átomo para se realizar o impossível, já que um fragmento do tamanho de um grão de mostarda será suficiente para realizar muito mais do que imaginamos. O que Deus pede dos homens é que façam, não o que são capazes, mas, sim, o que não são capazes. Pede que unam sua incapacidade à onipotência dele, para que a palavra impossível seja riscada de seu dicionário.

Os profetas são homens solitários. Andam sozinhos; oram sozinhos. O próprio Deus, ao criá-los, os faz diferentes do homem comum; não são “fabricados em série”. O divino princípio de seleção é inescrutável. Mas que ninguém se desespere; ou se julgue inútil por achar-se velho demais. Moisés estava com oitenta anos quando assumiu a liderança de um povo escravizado e abatido, os filhos de
Israel. Jorge Müller viajou a vários países do mundo, mais de uma vez, e pregou a milhões e milhões de pessoas, a viva voz, com setenta anos.

Quanto a Ezequiel, ele não convocou reuniões de comissões, nem enviou cartas missionárias solicitando ofertas e orações. Não levantou fundos para seu ministério, e detestava publicidade. Mas a
situação com que se defrontava era questão de vida ou morte. (E a obra de evangelização também o é. Portanto, será bom que nossos evangelistas abram os olhos para que a satisfação teológica que proporcionam a seus ouvintes não arranque deles apenas uma simples exclamação: “Que homem inteligente!”, deixando-os a perecer em trevas). Então Deus ordenou a Ezequiel que dissesse ao seu “monte” de ossos secos: “Ergue-te e lança-te no mar”. Ele o disse, e foi o que sucedeu.

Ali estava uma maldição. Saberia ele revogá-la? Ali havia morte.
Seria ele capaz de transmitir vida? Ele não fez nenhuma exposição
doutrinária. Caros irmãos, ouçam. O mundo não está querendo mais definições do evangelho, e, sim, novas demonstrações do poder dele.
Onde estão os homens de fé — não os doutrinadores — para operar nestes dias de tanta desesperança política e espiritual, e de tanto desregramento moral? Não é preciso ter fé para amaldiçoar as trevas,
nem citar estatísticas sinistras, evidências de que as barreiras se desmoronaram e que a avalanche de impureza infernal encobriu esta geração. Doutrina? Já a temos de sobra, enquanto o mundo enfermo,
triste, saturado de sexo, sobrecarregado ao peso do pecado, perece de fome espiritual.

É nesta hora sombria, quando o mundo está adormecido em trevas, a igreja dorme em luz. E é assim que Cristo é “ferido na casa dos seus amigos”. E uma igreja trôpega é chamada zombeteiramente
de impotente. Enquanto anualmente gastamos montanhas de papel e rios de tinta para reimprimir os escritos de mortos, o Espírito Santo está aí, vivo, procurando aqueles que queiram humilhar-se e
confessar que, apesar de verem, estão cegos; aqueles que estejam dispostos a pagar o preço do quebrantamento e lágrimas, para então buscarem a unção do poder divino, num reconhecimento sincero de sua pobreza de alma.

Faz alguns anos um pastor pregou à porta de sua uma tabuleta
com os seguintes dizeres: “Esta igreja experimentará um
avivamento ou um funeral”.

É esse tipo de desespero que agrada a Deus e deixa o inferno desalentado. Loucura, diz você. É verdade. Uma igreja sóbria demais não tem valor algum. Nesses dias estamos precisando é de homens bêbedos com o poder do Espírito Santo. Será que Wesley, Whitefield, Finney, Hudson Taylor foram pessoas excepcionais? De modo algum.
Se entendo corretamente o livro de Atos, eles eram homens muito normais.

Parece que a bomba atômica perturbou todo mundo — menos a igreja. Nós nos entregamos a intermináveis discussões sobre a soberania de Deus, e as dispensações, e ignoramos nossa pobreza
espiritual. Enquanto isso, o inferno vai só se enchendo. Com o comunismo dominando o mundo, o modernismo na igreja e a moderação dos grupos fundamentalistas, será que Deus vai encontrar
um homem para se colocar na brecha, como Ezequiel se colocou?
Meus irmãos pregadores, hoje em dia nós gostamos mais de estar acomodados do que sentir as dores de parto. É por isso que ocorrem tão poucos nascimentos. Que Deus nos mande, e rápido, um profeta
que se encontre em descompasso com essa igreja que se acha desarticulada.

Já vai muito adiantada a hora para que surjam novas denominações. Neste momento, Deus está preparando seus Elias para a última e grande ofensiva mundial contra a impiedade (seja ela política ou de outro tipo, mesmo com máscara de religiosa). O último e grande avivamento, gerado e operado pelo Espírito Santo, será o rompimento dos velhos odres do sectarismo pelo vinho novo do Senhor. Aleluia!

Observemos que Ezequiel foi levado pelo Espírito. E, como qualquer ser humano, ele deve ter estremecido com o apavorante quadro daquele monte de ossos secos. Mas da fé do profeta
dependia o destino de milhares, talvez milhões de pessoas — da fé dele, não de suas orações. Muitos oram, mas poucos têm fé. Que tremor santo deve ter perpassado sua alma ao ver aquilo! De espectadores, apenas o céu e o inferno. Se Ezequiel vivesse em nossos dias, certamente iria tirar uma fotografia deles para a imprensa. Depois, preocupado com estatísticas, iria contar os ossos.
E quando as coisas começassem a se agitar, iria chamar outros para vê-lo operar (para que o colocassem na ordem certa no “ranking” mundial dos evangelistas). Mas Ezequiel não agiu assim. Vejamos o que ele diz: “Então profetizei segundo me fora ordenado”. (Aí está a questão: ele se tornou um tolo para Deus). “Ossos secos, ouvi a palavra do Senhor”. Loucura? É! Insanidade total! Ele disse para os ossos: “Ouvi”, embora eles não tivessem ouvidos. O profeta fez o que lhe fora ordenado. Mas nós, para evitarmos constrangimento, modificamos as ordens de Deus, e assim passamos uma vergonha maior. Mas Ezequiel obedeceu. E Deus operou, como sempre.
“Houve um ruído”. Ah, disso nós gostaríamos. Mas ele não confundiu barulho com criação, nem atividade com unção, nem agitação com avivamento.

Deus poderia ter insuflado vida nesse monte de ossos com apenas um sopro de seus lábios onipotentes. Mas, não. Seria preciso uma série de medidas. Primeiro, “Ossos que batiam contra ossos e se ajuntavam, cada osso ao seu osso”. (Agora já não são mais um monte de ossos). Um fenômeno desses nos deixaria desorientados; mas não a Ezequiel. Mas de que vale um bando de esqueletos? Eles poderiam, por acaso, lutar nas guerras do Senhor? Será que em tal estágio poderiam honrar o nome de Deus? Hoje, em nossas igrejas, há muitos guias cegos contando esqueletos que “vão à frente”. Estão andando, claro. Mas ainda não nasceram. Ao ver suas lágrimas, dizemos: “Creia nesta promessa”. Contudo ainda não possuem vida.
Falta carne sobre os esqueletos; depois revestirem-se de pele. E ainda assim teremos apenas um vali cheio de... cadáveres. Seriam eles de algum valor para Deus? Por enquanto não. Têm olhos, mas
não vêem; mãos, mas não podem lutar; possuem pés, mas não podem caminhar. É nesse estado que ficam aqueles que vão à frente, caso não ocorra um último ato: “Profetizei como ele me ordenara”.
Ezequiel perseverou; resistiu ao ataque das dúvidas. Em vez de se sentir desanimado à vista dos esqueletos e cadáveres, acreditou que Deus estava com ele. E, a sós com Deus, perseverou. “Profetizei como ele me ordenara, e o espírito entrou neles e v-i-v-e-r-a-m”.

E, hoje, quem é que pode dizer isso: “Profetizei como ele me ordenara e eles v-i-v-e-r-a-m?” Nós, os pregadores, podemos facilmente atrair multidões. Com vistosos cartazes de propaganda,
música, divulgações, pregações pelo rádio, conseguimos isso. No entanto, nem ao menos temos certeza de que ele nos chamou para o ministério. Estamos sentindo, de fato, de todo coração um peso pelos que estão-se perdendo? Será que o fato de que 85 pessoas estão morrendo sem Cristo a cada momento nos causa pesar, transforma nosso cântico em lamento, e coloca em nós um espírito angustiado?
Será que neste exato momento poderíamos fitar o rosto do Deus vivo (já que ele está sempre olhando para nós), e dizer: “Ai de mim se não pregar o evangelho!” Será que poderíamos realmente afirmar: “O Espírito do Senhor está sobre mim” ungindo-me para pregar o evangelho? Somos conhecidos nos infernos? Quero dizer, será que os demônios podem dizer de nós: “Conheço a Jesus e sei quem é o
Pastor Fulano”, ou será que, quando pregamos, eles indagam: “Mas vós, quem sois?”

As pitonisas políticas não nos oferecem augúrios muito auspiciosos, e os maiores estadistas do mundo hoje estão tentando cantarolar para ver se conservam o ânimo um pouco mais elevado. O
cidadão comum observa tudo confuso, enquanto as diversas seitas tentam mostrar-lhe o caminho do céu, cada uma à sua maneira. E esse cidadão já ouviu a pregação do evangelho com os ouvidos
físicos, mas seus olhos nunca viram, e sua alma nunca experimentou a visitação divina. E ele tem todo o direito de nos perguntar: “Onde está o seu Deus?” O que lhe responderemos?

Uma das experiências mais penosas para o ser humano é encarar a verdade de frente. Achamo-nos tão acostumados às pregações que, ao ouvirmos um sermão, quase já sabemos o que o pregador irá
dizer no momento seguinte. Mas a espada dele está cega, se comparada com a verdade de dois gumes que nos oferece o Espírito Santo. Temos a impressão de que os pastores e pregadores do mundo todo levantam o mesmo clamor de desalento à vista da ineficiência do evangelismo moderno. Talvez pudéssemos até denominá-lo “evangelismo-relâmpago” — por uns instantes produz um brilho intenso, mas logo se apaga.

É possível que ainda haja um sopro de vida — de avivamento — nas igrejas, mas não estamos conseguindo despertamento entre os milhões de povos sem Deus. É verdade que milhares e milhares de pessoas estão assistindo a nossas campanhas de evangelismo em massa, mas na maioria são crentes ou gente que freqüenta igreja. O de que precisamos é de um novo General Booth que atinja os
perdidos, tanto ricos como pobres.

Os crentes do passado costumavam cantar um hino que dizia: “Bem-aventurados aqueles que de coração quebrantado, com profundo sentimento choram seu pecado”.

Nessas linhas estão contidos três elementos vitais: coração quebrantado, choro e pecado. Primeiro, “coração compungido e contrito não o desprezarás, ó Deus”. Aliás, ele só usa vasos quebrados. Quando Jesus multiplicou o pão, primeiro pegou os pães do menino e partiu-os. E só então pôde alimentar a multidão. O vaso de alabastro é outro exemplo. Só depois que ele foi quebrado o
aroma encheu o aposento — e o resto do mundo. E Jesus também disse: “Isto é o meu corpo, que é partido por vós”. E se para o Senhor foi assim não deverá ser também para o servo? Pois quando
procuramos salvar nossa vida, não apenas a perdemos, mas também destruímos a de outros.

Em seguida, chorar pelo pecado. Jeremias clamou: “Oxalá a minha cabeça se transformasse em águas”; e o salmista diz: “Torrentes de águas nascem dos meus olhos”. Irmãos, nossos olhos estão secos porque nosso coração também está. Em nossos dias, é possível verse uma religiosidade despida de compaixão. Que coisa mais estranha.

Certa vez, alguns oficiais do Exército de Salvação escreveram a William Booth que haviam empregado todos os métodos possíveis para levar pessoas a Cristo; e nada. E Booth lhes respondeu
sucintamente: “Experimentem chorar”. Foi o que fizeram, e experimentaram um avivamento.

As escolas bíblicas e seminários não ensinam seus alunos a chorar, e é claro que nem o poderiam. Essa lição só se aprende com o Espírito Santo. E qualquer pregador, por mais títulos e doutorados
que possua, não conseguirá muita coisa enquanto não experimentar uma profunda amargura de alma por causa dos pecados que se cometem hoje. Uma oração que David Livingstone fazia sempre era:
“Senhor, quando irá cicatrizar-se a chaga do pecado deste mundo?”
E nós, acaso sentimos o peso da perdição da humanidade quando oramos? Será que ensopamos de lágrimas o travesseiro com uma agonizante intercessão como fazia John Welch?

Conta-se que quando Andrew Bonar, deitado em seu leito, ouvia as pessoas caminhando pela rua nos sábados à noite dirigindo-se para bares ou teatros, sentia o coração pesado e clamava: “Eles estão
perdidos, estão perdidos!”

Infelizmente, irmãos, não possuímos esse peso pelos perdidos. A maioria dos crentes conhece apenas uma longa seqüência de pregações, eloqüentes, sim, mas sem alma, sem lágrimas, sem ardor
espiritual, e é tudo que os pregadores têm para oferecer hoje.

E, em terceiro lugar, o que dizer do pecado? Diz a Bíblia que “os loucos zombam do pecado” (Pv 14.9). (E quem zomba do pecado é louco mesmo.) Os sábios da igreja apontaram “sete pecados
capitais”. É claro que sabemos que eles estão muito enganados; todos os pecados são capitais. Mas esses sete são o ventre do qual nasceram mais setenta vezes setenta milhões de outros pecados.
São as sete cabeças de um mesmo monstro, que está devorando esta geração a um ritmo aterrador. Estamos vendo uma juventude amante de prazeres, que não liga a mínima para Deus. Enfatuados
com seu pseudo-intelectualismo, totalmente indiferentes às coisas espirituais, eles rejeitam os padrões de moralidade vigentes.
Caiamos de joelhos, irmãos. Abandonemos a louca idéia de borrifar perfumes na impiedade individual e internacional, com nossas colônias teológicas. Carreemos para toda essa putrefação rios de lágrimas, de oração e de pregações ungidas, para que seja purificada.

“Há pecado no arraial; há alta traição.
Terei sido eu? Serei eu?
Em nossas fileiras o pecado causa derrota e estagnação.
Estará ele em mim, Senhor?
Há coisas condenadas, capa e ouro.
Há pecado entre velhos e jovens.
Pecado que leva Deus a retirar sua bênção.
Estará ele em mim, Senhor?
Estará em mim? Estará em mim?
Estará ele em mim, Senhor?”

Leonard Ravenhill