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sexta-feira, 30 de março de 2018

Simplicidade e autoridade do novo Testamento


Em seguida, se alguém vem ao Novo Testamento, a verdade nele se firma em sólidos sustentáculos! Três evangelistas narram sua história em um estilo singelo e vulgar. Esta singeleza é para muitos indivíduos arrogantes motivo de desdém, evidentemente
porque não atentam para os pontos capitais do ensino, dos quais lhes seria fácil concluir que eles, os evangelistas, estão a dissertar acerca de mistérios celestiais, que pairam acima do alcance humano. Sem dúvida, quem quer que seja dotado de uma simples gota de cândida decência, lido o primeiro capítulo de Lucas, sentir-se-á tomado de vergonha. Já os discursos de Cristo, dos quais a essência é resumida por esses três evangelistas, prontamente eximem os escritos de todo menosprezo.
João, porém, a trovejar das alturas, quebranta mais poderosamente do que qualquer raio a obstinação daqueles a quem não compele à obediência da fé. Saiam ao largo todos esses censores de apurado faro, a quem o supremo prazer é alijar do próprio coração e do coração dos outros a reverência devida à Escritura. Leiam o
Evangelho de João: queiram ou não, aí acharão mil afirmações que ao menos lhes hajam de despertar a mente entorpecida, na verdade, que lhes acenda na consciência horrível cautério a coibir-lhes o escárnio.
O mesmo se há de dizer de Paulo e de Pedro, em cujos escritos, ainda que a maioria seja cega em relação a eles, contudo a própria majestade celeste neles estampada mantém a todos enlaçados, como que amarrados, nela.
Na realidade, este único fato lhes exala mais do que suficientemente o ensino acima do mundo: que Mateus, antes preso ao ganho de sua banca, Pedro e João voltados à lida em seus barquinhos, todos incultos e iletrados, nada haviam aprendido em escola de homens que pudessem transmitir a outros. Paulo, porém, não apenas
um inimigo declarado, mas até cruel e sanguinário, convertido a novo homem, mostra, pela mudança súbita e inesperada, ter sido forçado pelo poder celeste a afirmar a doutrina que havia combatido. Neguem esses cães que o Espírito Santo haja descido sobre os apóstolos ou, quando menos, anulem a credibilidade da historia.
Entretanto, a própria realidade brada às escancaras que esses homens haviam sido ensinados pelo Espírito que, antes desprezíveis em meio ao próprio vulgo, de repente começaram a dissertar tão magnificamente acerca de mistérios celestiais.

João Calvino