a eles; se fornece remédios, não os negligenciemos.
Com efeito, dirão que nenhum perigo nos fará mal, se não lhe é ordenado
que nos prejudique, pois isso de maneira nenhuma se pode evitar.120 Mas, ao
contrário, que sucederá se os riscos não são fatais, que o Senhor já destinou
remédios para repeli-los e superá-los? Vê como te é
ajustado o raciocínio à ordem da administração divina. Tu concluis que não se deve
precaver do perigo, porque, desde que não seja fatal, mesmo à parte de qualquer
precaução o haveremos de ludibriar. O Senhor, no entanto, prescreve que te acauteles,
porque não quer que te seja fatal.
Esses
desvairados não consideram o que lhes está debaixo dos olhos, que as artes
de se aconselhar e se acautelar foram inspiradas pelo Senhor aos homens, as quais
se tornam subservientes à providência na conservação da própria vida, da mesma
forma que, em sentido contrário, por negligência e inércia, atraem sobre si os males
que lhes impôs. Pois, donde acontece que o homem providente, enquanto cuida bem
de si, se desvencilha até de males iminentes, o insipiente pereça levado por
temeridade, senão que tanto a insipiência quanto a prudência são instrumentos da divina
administração para um e outro desses dois aspectos?
Essa é a
causa por que Deus quis que não conhecêssemos o futuro, para que, sendo ele
incerto, nos preveníssemos e não deixássemos de usar os remédios que ele nos dá
contra os perigos, até que, ou os vençamos, ou sejamos deles vencidos. Por esse
motivo, ponderei de antemão que a providência de Deus nem sempre se manifesta
a
descoberto; ao contrário, é como se Deus, de certo modo, a vestisse dos meios
aplicados.
João
Calvino