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quarta-feira, 30 de maio de 2018

Precária é a base para afirmar-se a realidade de Anjo da Guarda Individual


Por outro lado, não ousaria afirmar como certo, se a cada fiel, individualmente, foi ou não designado um anjo específico para sua defesa. Evidentemente, quando Daniel faz referência ao anjo dos persas e ao anjo dos gregos está dizendo que certos anjos são destacados como guardiões a reinos e províncias. Também Cristo,
quando diz que os anjos das crianças sempre contemplam a face do Pai [Mt 18.10], dá a entender que há certos anjos a quem lhes foi confiada a segurança. Mas disto não sei se deva concluir-se por certo que incumbe não a um só anjo o cuidado de cada um de nós, mas, antes, que todos, em um consenso único, vigiam por nossa
segurança. Ora, é de todos os anjos em conjunto que se diz que se regozijam mais por um pecador voltado ao arrependimento do que por noventa e nove justos que tenham persistido na justiça [Lc 15.7]. Também de muitos anjos se diz que conduziram a alma de Lázaro ao seio de Abraão [Lc 16.22]. Aliás, não em vão mostra Eliseu
a seu serviçal tantos carros de fogo [2Rs 6.17], que lhe haviam sido particularmente destinados.
Há uma passagem [At 12.15] que, confirmando isso, parece um pouco mais clara que outras. Isto é, quando Pedro, retirado do cárcere, batia aos portais da casa em que os irmãos se haviam congregado, como não pudessem supor que fosse ele, diziam que era seu anjo. Isto lhes vem à mente como sendo uma concepção generalizada de que aos fiéis, individualmente, se designaram anjos como guardiões pessoais. Se bem que aqui se pode também replicar que nada nos impede que entendamos a qualquer um dentre os anjos, a quem o Senhor houvesse então confiado a proteção de Pedro, e não obstante nem por isso lhe seria guarda perpétuo, tal como, popularmente, se imagina que foram designados a cada pessoa, como se fossem gênios diversos, dois anjos, um bom e um mau.
Entretanto, não vale a pena investigar ansiosamente o que não nos vem muito ao caso saber. Ora, se porventura isto não satisfaz a alguém, que todas as ordens da milícia celestial velam por sua segurança, não vejo que proveito possa derivar disto, ou, seja, vir a saber que um anjo lhe é particularmente outorgado por guarda pessoal.
Aliás, grande agravo fazem a si próprios e a todos os membros da Igreja quantos restringem a um único anjo esse cuidado que Deus exerce em relação a cada um de nós, como se fosse em vão a promessa relativa a essas forças auxiliares, cercados e assistidos pelas quais, por todos os lados, lutemos mais displicentemente.


João Calvino