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quarta-feira, 30 de maio de 2018

O Ministério dos Anjos motivado pela necessidade Humana


Com efeito, deste perigo faremos bem em guardar-nos, se ponderarmos por que Deus costuma declarar seu poder, cuidar da segurança dos fiéis e comunicar-lhes as dádivas de sua beneficência por intermédio destes, e não de si diretamente, sem a
operação deles. Evidentemente não o faz por necessidade, como se não pudesse prescindir deles; porquanto, sempre que lhe apraz, deixando-os de lado, ele efetua sua obra unicamente por seu arbítrio, tão longe está que eles lhe sejam meio de aliviar alguma dificuldade.
Logo, Deus faz isso para consolo de nossa fraqueza, para que de modo algum careçamos de algo que valha, seja para elevar-nos o ânimo à boa esperança, seja para firmá-lo em segurança. Certamente que isto nos deveria ser mais que suficiente:
que o Senhor declara ser nosso protetor. Mas, uma vez que nos vemos rodeados de tantos perigos, de tantos malefícios, de tantos gêneros de inimigos, tal nos é a flacidez e fragilidade, que poderá acontecer, por vezes, que nos enchamos de inquietação, ou caiamos em desespero, a menos que, em conformidade com nossa capacidade, o Senhor nos faça apreender a presença de sua graça.
Por esta razão, não somente promete que haverá de cuidar de nós pessoalmente, mas ainda que dispõe de inumeráveis guardiães a quem já determinou para provernos a segurança, ou, seja, por todo o tempo em que estamos cercados da guarda e proteção destes, qualquer que seja o perigo que ameace, fomos postos além de toda
contingência do mal. De fato confesso que isto se nos converte em erro: que após essa inconfundível promessa acerca da proteção do Deus único, ainda volvamos o olhar em derredor, buscando donde nos venha o socorro. Mas, em vista disso, por sua imensurável clemência e boa vontade, o Senhor nos quer socorrer deste desvio,
não há por que negligenciarmos seu tão vultoso benefício.
Exemplo deste fato temo-lo no serviçal de Eliseu [2Rs 6.17] que, ao ver que o monte estava cingido em cerco pelo exército dos sírios, não se divisava qualquer meio de evasão, se transtornava de pavor, como se, quanto a si próprio e a seu senhor, tudo estivesse findado. Então Eliseu orou a Deus que lhe abrisse os olhos.
De repente ele percebe o monte repleto de cavalos e carros de fogo, isto é, de multidão de anjos, pelos quais haveria de ser guardado, juntamente com o Profeta; firmado por esta visão recobrou-se e pôde, de ânimo intrépido, desdenhar do inimigo, a cuja contemplação havia quase expirado.

João Calvino