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domingo, 15 de abril de 2018

A bíblia condena imagens e representações de Deus


A mesma linha segue esta afirmação: “Os ídolos dos povos são prata e ouro, obras das mãos dos homens” [Sl 115.4; 135.15], pois o Profeta conclui não só de sua materialidade que não são deuses esses cuja imagem é de ouro ou prata, mas ainda assume por pressuposto que é insípida imaginação tudo quanto de nosso próprio
senso concebemos acerca de Deus. Menciona o ouro e a prata antes que a argila ou a pedra, para que, seja o esplendor, seja o valor, não induzam sua reverência para com os ídolos. Conclui também, de modo geral, que nada é menos provável que serem os deuses plasmados de qualquer espécie de matéria morta.
Ao mesmo tempo, insiste não menos neste outro ponto: que os mortais são transportados de temeridade supinamente insana, dando aos ídolos a honra devida a Deus, já que eles mesmos, com muitíssima dificuldade, podem assegurar que viverão um só momento. O homem se vê compelido a confessar que é ele uma criatura efêmera, e não obstante quer que um metal, a cuja divindade deu origem, seja considerado deus! Pois, de onde tiveram os ídolos seu princípio senão no arbítrio dos homens?
Muito justo é o motejo daquele poeta profano:
“Outrora eu era um tronco de figueira, um inútil pedaço de lenho,
Quando um artífice, incerto se deveria fazer um banco etc.,
Preferiu que eu fosse um deus.”
Desta forma, um homenzinho terreno, que a vida exala quase que a cada instante, mercê de sua arte, transfere o nome e a dignidade de Deus a um tronco sem vida!
Não obstante, uma vez que esse epicureu, cinicamente a gracejar, não se importou com religião alguma, postos de parte seus motejos e os de outros, punja-nos, ou, melhor, trespasse-nos a repreensão do Profeta [Is 44.15-17], dizendo que são mui insensatos os que, de um mesmo lenho, se aquecem, acendem o forno para cozer pão, assam carne ou a cozinham, e esculpem um deus, diante do qual se prostram simploriamente a orar. E assim é que, em outro lugar [Is 40.21], não somente os incrimina como réus em face da lei, mas ainda os exprobra de que não aprenderam dos fundamentos da terra, quando, na verdade, nada menos próprio do que desejar
reduzir Deus, que é imensurável e além de compreensão, à medida de cinco pés!
E no entanto o costume revela ser natural aos homens esta monstruosidade que repugna abertamente à ordem da natureza.
Além disso, é preciso ter-se em mente que as superstições freqüentemente se referem nestes termos – que são obras das mãos dos homens, que carecem da autoridade divina [Is 2.8; 31.7; 37.19; Os 14.3; Mq 5.13] – para que isto seja estabelecido: que são abomináveis todas as formas de culto que os homens inventam para si próprios.
No Salmo [95], o Profeta acentua essa insânia, dizendo que aqueles que foram a tal ponto dotados de inteligência, que sabem que todas as coisas são movidas somente pelo poder de Deus, imploram o auxílio de coisas inanimadas e destituídas de sensibilidade. Mas, visto que a corrupção da natureza arrebata a demência tão crassa,
tanto a todos os povos quanto a cada indivíduo em particular, por fim o Espírito fulmina com terrível imprecação: “Semelhantes se lhes tornem aqueles que os fazem e quantos neles põem a confiança” [Sl 115.8]. Deve-se notar, porém, que não se proíbe menos uma gravura do que uma imagem escupida, com o quê se refuta a improcedente ressalva dos gregos. Pois pensam que se portam esplendidamente, se não fazem representações esculturais de Deus,
enquanto se esbaldam em gravuras mais desabridamente que quaisquer outros povos.
O Senhor, entretanto, proíbe não apenas que lhe seja talhada imagem por estatuário, mas ainda que lhe seja modelada representação por qualquer sorte de artífice, porquanto é, com isso, afeiçoado em moldes inteiramente falsos e com grave insulto de sua
majestade.

João Calvino