Pregado na manhã do Dia do Senhor, 2 de junho de 1889. Por C.H. Spurgeon, no Tabernáculo Metropolitano, Newington
“Tendo aparência de piedade, mas negando-lhe
o poder. Afasta-te também desses.” (2 Timóteo 3:5 — tradução literal do inglês)
Paulo nos adverte sobre alguns
personagens que aparecerão nos últimos tempos. É uma lista mui terrível.
Semelhantes têm aparecido em outros momentos, mas somos guiados por sua
advertência a apreender que eles aparecerão em maior número nos últimos dias do
que em qualquer época anterior. “Porque haverá homens amantes de si mesmos,
avarentos, presunçosos, soberbos, blasfemos, desobedientes a pais e mães,
ingratos, profanos, sem afeto natural, irreconciliáveis, caluniadores,
incontinentes, cruéis, sem amor para com os bons, traidores, obstinados,
orgulhosos, mais amigos dos deleites do que amigos de Deus” [2 Timóteo 3:2-4].
Estes abundarão como moscas na decadência do
ano e tornarão os tempos excessivamente perigosos. Estamos nos aproximando
desse período, neste exato momento. Que essas pessoas, algumas delas, estão
dentro da Igreja é a parte mais dolorosa disso. Mas eles estarão assim, porque
eles são compreendidos nesta última cláusula do catálogo sombrio, o qual temos
considerado como o nosso texto: “Tendo aparência de piedade, mas negando a
eficácia dela”. Paulo não pinta o futuro com óculos cor de rosa; ele não é um
profeta de língua suave de uma idade de ouro na qual esta terra maçante seja
imaginada como sendo brilhante. Há irmãos e irmãs sanguíneos que estão ansiosos
para que tudo progrida cada vez melhor e melhor, até que, finalmente, esta
presente era amadureça em um milênio.
Eles não serão capazes de sustentar as suas
esperanças, pois a Escritura não lhes dá nenhuma base sólida de apoio. Nós, que
acreditamos que não haverá reino milenar sem o Rei e que não esperamos nenhuma
regra de justiça, exceto a partir do advento do Senhor justo, estamos mais
perto do alvo. À parte do segundo advento de nosso Senhor, o mundo é mais
propenso a afundar em um pandemônio a elevar-se em um milênio. A interposição
Divina parece-me a esperança estabelecida diante de nós na Escritura e, de
fato, é a única esperança adequada para a ocasião. Nós observamos o
escurecimento decadente das coisas. O estado da humanidade,embora melhore
politicamente, ainda assim torna-se cada vez pior espiritualmente. Certamente,
somos assegurados no versículo 13 que “os homens maus e enganadores irão de mal
para pior, enganando e sendo enganados”. Isso brotará na Igreja Cristã e ao
redor dela, um grupo de homens sem fé que professam ter fé, homens ímpios, que
se unirão com os santos, homens que têm a aparência de piedade, mas negam a
eficácia dela. Podemos chamar estes tempos de trabalhosos, se quisermos, mas
nós malmente chegamos ao limiar daqueles verdadeiros tempos difíceis que serão
trabalhosos para a Igreja, no qual ela precisará, ainda mais do que atualmente,
clamar fortemente para que o Senhor a mantenha viva. Com esta nuvem sobre o
nosso espírito, nós chegamos ao texto em si.
Vamos considerá-lo cuidadosamente e
que o Espírito Santo nos ajude! A verdadeira Religião é uma coisa espiritual,
mas necessariamente incorpora-se em uma forma. O homem é uma criatura
espiritual, mas o espírito humano precisa de um corpo para consagrar-se. E
assim, por essa necessidade, nós nos tornamos unidos ao materialismo. E se não
“metade pó, metade divindade”, como alguém disse, somos certamente tanto
matéria e alma. Em cada um de nós existe a forma ou corpo e a alma ou poder. É
assim com a Religião: é essencialmente uma coisa espiritual, mas requer uma
forma na qual incorpora e manifesta-se. O povo Cristão pende a um determinado
método exterior de procedimento, um modo exterior peculiar de profissão de sua
fé, que se torna para a verdadeira piedade o que o corpo é para a alma. A forma
é útil, a forma é necessária, a aparência deve ser vitalizada; assim como o
corpo é útil, é necessário e é vitalizado pela alma. Se vocês obtiverem tanto a
forma, como modelada na Palavra de Deus e o poder, como concedido pelo Espírito
de Deus, vocês fazem bem e são Cristãos vivificados. Se vocês obtêm o poder
somente, sem a forma ordenada, vocês mutilam um pouco a si mesmos.
Mas, se vocês obtêm a forma sem o
poder, então, habitam em morte espiritual. O corpo sem o espírito está morto. E
o que se segue após a morte com a carne? Ora, corrupção; corrupção tão horrível
que até mesmo o próprio amor tem que clamar: “sepulte a minha morta de diante
de minha face”. De modo que, se houver em alguém o corpo de religião sem a vida
da religião, isso conduz à decadência e assim, à corrupção; e isso tem a
tendência de decompor o caráter. A matéria-prima de um diabo é um anjo
desprovido de santidade. Vocês não podem fazer um Judas, exceto a partir de um
apóstolo. O eminentemente bom em forma exterior, quando, sem vida interior,
decompõe-se na coisa mais suja debaixo do céu. Não se maravilhem que estes são
chamados “tempos trabalhosos”, em que tais personagens abundam. Um Judas é um
peso terrível para que este pobre mundo suporte, mas uma tribo deles deve ser
um perigo, de fato. No entanto, se não da pior forma, são suficientes para
serem temidos os que têm a sombra da religião sem a sua substância. Dos tais eu
tenho que falar neste momento, dos tais que Deus lhes dê a graça Divina para
que se convertam! Que nenhum dentre nós jamais seja manchas em nossas festas de
amor, ou nuvens sem água levadas pelos ventos.
Mas, isso seremos se tivermos a aparência de
piedade sem o poder dela companhia. As ovelhas de Cristo gostam de estar juntas
no mesmo pasto e prosseguir em um rebanho os passos do Bom Pastor. Aqueles que
constantemente se associam em culto, unem-se em comunhão da Igreja e trabalham
juntos para fins sagrados têm a aparência de piedade e isso é de uma forma
muito útil e adequada. Mas ai, isso não tem valor sem o poder do Espírito
Santo. Alguns vão mais longe do que a adoração pública. Eles usam uma grande
quantidade de falar religioso. Eles livremente falam das coisas de Deus, em
companhia Cristã. Eles podem defender as doutrinas da Escritura, eles podem
pleitear seus preceitos e podem narrar a experiência de um crente. Eles são mais
afeiçoados a falar sobre o que está ocorrendo na Igreja, o bisbilhotar das ruas
de Jerusalém é muito agradável para eles. Eles temperam seu discurso com frases
piedosas, quando eles estão em companhia que aprovará isso. Eu não os censuro,
pelo contrário, eu gostaria que houvesse mais de santa conversação entre os
professos. Eu gostaria que pudéssemos reviver o velho hábito: “Os que temem ao
Senhor falam frequentemente um com o outro” [Malaquias 3:16].
A santa conversação faz com que o
coração brilhe e nos dá um antegozo da comunhão do glorificado. Mas pode haver
um cheiro de religião na conversa de um homem e, no entanto, pode ser um sabor
emprestado, como molhos quentes usados para disfarçar o ranço de carne antiga.
Aquela religião que vem de lábios exteriores, mas não surgem das fontes
profundas do coração não é aquela água viva que brotará para a vida eterna. A
língua piedosa é uma abominação, se o coração está destituído da graça Divina.
Mais do que isso, alguns têm uma aparência de piedade, mantida e anunciada pela
atividade religiosa. É possível ser intensamente ativo no trabalho exterior da
Igreja e ainda não saber nada sobre o poder espiritual.
Alguém pode ser aparentemente um
excelente professor de Escola Dominical e ainda ter a necessidade de ser
ensinado o que é nascer de novo. Alguém pode ser um pregador eloquente, ou um
diligente oficial na Igreja de Deus, e, no entanto, não saber nada sobre o
misterioso poder do Espírito da verdade no coração. É bom ser como Marta em
serviço. Mas uma única coisa é necessária: sentar-se aos pés do Mestre e
aprender, como fez Maria. Quando tivermos feito todo o trabalho que nossa
posição nos exige, podemos apenas ter exibido a aparência de piedade. A não ser
que ouçamos ao nosso Senhor e de Sua presença derivemos poder, seremos como o
bronze que soa e como o sino que retine. Irmãos, falo para mim e para cada um
de vocês em solene seriedade. Se muito falar, doação generosa e ocupação
constante pudessem ganhar o Céu, poderíamos facilmente nos assegurar disso, porém,
mais do que estes são necessários. Eu falo a cada um de vocês.
E se eu destacasse qualquer um mais do
que a outros, como sendo alvo de meu discurso, este seria o melhor dentre nós,
alguém que está fazendo mais por seu Mestre e que, no interior da alma está
pensando: “Essa advertência não se aplica a mim”. Ó, meu irmão ativo e
enérgico, lembre-se a palavra: “Aquele, pois, que cuida estar em pé, olhe não
caia” [1 Coríntios 10:12]. Se algum de vocês não gosta deste sermão de examinação,
seu desagrado prova o quanto você precisa dele. Aquele que não está disposto a
investigar a si mesmo deve estar incriminando-se por essa falta de vontade de
olhar para as suas questões. Se você está certo, não se oporá a ser pesado na
balança. Se você é, de fato, de ouro puro, ainda pode sentir ansiedade com a
visão da fornalha, mas você não será levado à ira com a perspectiva do fogo.
Sua oração será sempre: “Sonda-me, ó
Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece os meus pensamentos. E vê se
há em mim algum caminho mau, e guia-me pelo caminho eterno” [Salmos 139:23-24].
Não preciso ampliar além, pois vocês todos conhecem o que é uma aparência de
piedade e a maioria de nós que está aqui presente agarra-se a esta forma, que
nunca possamos desonrá-la! Confio que estamos ansiosos para fazer essa
aparência conforme as Escrituras para que a nossa forma de piedade seja aquela
que os primeiros santos tinham. Sejamos Cristãos de um tipo elevado, formados
no próprio molde de nosso Senhor. Mas não se tornem rigorosos pela forma e
negligenciem a vida interior, isto nunca funcionará. Lutaremos com a roupa de
um homem e permitiremos que o homem, ele mesmo, morra? Mas agora, como essas
pessoas não tinham o poder da piedade, como é que eles vieram a ter a aparência
dela? Isso requer várias respostas.
Alguns têm a aparência de piedade,
pela via hereditária. Seus antepassados sempre foram pessoas piedosas e eles
quase que naturalmente assumem a confissão de seus pais. Isso é comum e onde
isso é honesto, é mui louvável. É uma grande misericórdia quando, no lugar dos
pais, estarão os filhos. E espero que possamos antecipar que os nossos filhos
nos seguirão nas coisas de Deus, se, pelo exemplo, instrução e oração, temos
buscado isso diante do Senhor. Somos infelizes se não vemos nossos filhos
andando na verdade de Deus. Ainda assim, a ideia de membresia por direito de
nascimento é um mal e é tão perigoso quanto antibíblico. Se as crianças são
inseridas na Igreja simplesmente por causa de sua filiação terrena, com certeza
isso não é consistente com a descrição dos filhos de Deus, que é encontrada na
Escritura inspirada: “Os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne,
nem da vontade do homem, mas de Deus” [João 1:13].
Não geração, mas REGENERAÇÃO faz o Cristão.
Vocês não são Cristãos porque podem traçar uma linha de descendência carnal ao
longo de vinte gerações de filhos de Deus. Vocês devem, vocês mesmos, nascer de
novo. Pois, exceto que um homem nasça do alto, não pode ver o reino de Deus.
Muitos, sem dúvida, tomam posse naturalmente da aparência de piedade por causa
de laços familiares, isto é uma obra miserável. Ismael é filho pesaroso de
Abraão, Esaú de Isaque e Absalão de Davi. A graça não corre no sangue. Se vocês
não têm base melhor para a sua religião do que a sua paternidade terrena, vocês
estão em uma situação infeliz. Outros aceitaram a aparência de piedade pela
força da autoridade e influência. Eles eram como rapazes, colocados como
aprendizes de homens piedosos. Como moças, que estavam sob a orientação de
mestres piedosos.
E enquanto cresciam, ficaram sob a
influência de pessoas de inteligência e caráter superior que estavam do lado do
Senhor. Isso explica a sua aparência de piedade. Muitas pessoas são produtos
dos seus ambientes, religião ou irreligião é para eles o resultado das
circunstâncias. Essas pessoas foram levadas a fazer uma profissão de fé em
Cristo porque os outros o fizeram e amigos os encorajaram a fazê-lo. O profundo
exame do coração, que eles deveriam ter exibido, foi suprimido e eles foram
encontrados entre o povo de Deus, sem ter que bater no postigo para a entrada.
Eu não quero que ninguém condene a si mesmo, porque ele foi guiado ao Salvador
por amigos piedosos, longe disso; mas, no entanto, há o perigo de que falhemos
em ter arrependimento pessoal e fé pessoal e estejamos contentes em nos apoiar
sobre as opiniões dos outros. Eu tenho visto a aparência de piedade assumida
por conta de relacionamentos. Muitas vezes uma corte e casamento conduziram a
uma religiosidade formal, mas a um coração faltoso. O futuro marido é induzido
a fazer uma profissão de fé por causa de alguém que era uma Cristã sincera e
não quebraria o mandamento do Senhor ao entrar em jugo desigual com um
incrédulo.
A piedade nunca deve ser fingida para
que possamos colocar um anel de casamento no dedo, este é um triste abuso da
confissão religiosa. Outros tipos de amizade também têm levado homens e
mulheres a professarem uma fé que nunca tiveram e para unirem-se visivelmente à
Igreja, enquanto que em espírito e em verdade eles nunca foram realmente uma
parte dela. Eu expus essas coisas para vocês para que possa haver um grande
exame de coração entre todos nós e para que possamos candidamente considerar
como obtivemos a nossa aparência de piedade. Certas pessoas assumem a forma de
piedade, a partir de uma disposição religiosa natural. Não suponham que todas
as pessoas não-convertidas não tenham religião. Muita religiosidade é
encontrada nos pagãos e há povos que têm, naturalmente, mais reverência do que
outros. O alemão, com sua profunda filosofia, muitas vezes é livre, não apenas
da superstição, mas da reverência. O russo é de raça naturalmente religiosa,
para não dizer supersticiosa. Estou falando à maneira dos homens, o russo
sempre tira o chapéu para santos lugares, fotos e pessoas e ele é pouco
inclinado a descrer ou a zombar. Percebemos tais diferenças entre os nossos
próprios conhecidos: um homem é facilmente enganado pelos céticos, enquanto
outro está disposto, com a boca aberta, a acreditar em cada palavra. Alguém é
naturalmente um infiel, outro é tão naturalmente crédulo.
Eu quero dizer, então, que, para
alguns, a aparência de piedade recomenda a si mesma, porque eles têm uma
inclinação natural à esta forma. Eles não poderiam ser felizes a menos que
estejam frequentando um local onde Deus é cultuado, ou sem que sejam contados
entre os crentes em Cristo. Eles lidam com a religião, como eles fazem em sua
vida de negócios. Permitam-me lembrá-los do valor questionável daquilo que
brota da natureza humana caída. Seguramente isso não traz ninguém para o reino
espiritual, pois “o que é nascido da carne é carne”. Apenas “o que é nascido do
Espírito é espírito”. “Vocês precisam nascer de novo”. Cuidado com tudo o que
surge no campo sem a semeadura do lavrador, pois passará a ser uma erva
daninha. Ó, senhores, chegará o dia em que Deus nos provará com fogo e o que
veio da natureza não regenerada não resistirá ao teste, mas será totalmente
consumido! Não duvido que, nestes dias lustrosos, muitos têm uma aparência de
piedade por causa do respeito que isso lhes traz. Houve um tempo em que ser
Cristão era ser insultado, se não fosse preso e, talvez, queimado na fogueira.
Os hipócritas eram em menor número naqueles dias, pois uma confissão custava
muito.
No entanto, por estranho que pareça,
houve alguns que eram como Judas mesmo naqueles tempos. Hoje, a religião segue
seu caminho em chinelos de veludo; e em certas classes e níveis, se os homens
não fizessem alguma confissão religiosa, seriam vistos com suspeita e,
portanto, os homens tomarão o nome de Cristão sobre si e usarão a religião como
uma parte da vestimenta. Atualmente a cruz é usada como um colar. A cruz como o
instrumento de vergonha e morte de nosso Salvador é esquecida, e em seu lugar,
é feita o distintivo de honra, uma joia com que homens ímpios podem adornar-se.
É este o indicativo da falsidade dos tempos? Acautelem-se da busca por respeito
através de uma piedade hipócrita. A honra obtida por uma profissão sem coração
é, aos olhos de Deus, a maior desgraça. O ator pode pavonear-se em sua imitação
de realeza, mas ele deve tirar a coroa e as vestes quando a cena findar. E o
que ele, então, será? Desde os dias de Iscariotes até agora, alguns assumiram a
forma de piedade para lucrar com isso. Obter lucro da piedade é imitar o filho
da perdição. Esta é uma estrada perigosa e ainda assim, muitos arriscam suas
almas pelo lucro que encontram nela.
Aparente zelo por Deus pode realmente
ser zelo pelo ouro. O imperador Maximiliano mostrou grande zelo contra a
idolatria e publicou um decreto para que as imagens de ouro e prata fossem
derretidas. Ele era extremamente zeloso sobre isso. As imagens deviam todas ser
derretidas e o metal confiscado para o imperador. Foi astutamente suspeitado
que este grande iconoclasta não foi totalmente estimulado por motivos
altruístas. Quando um empreendimento traz a água ao moinho, não é difícil
mantê- lo. Alguns amam a Cristo porque eles carregam a Sua bolsa de dinheiro
para Ele. Acautelem-se desse tipo de piedade que faz um homem hesitante até que
ele veja se um dever recompensará ou não e, em seguida, faz ele ficar ansioso
porque espera que isso atenderá ao seu propósito. Mais uma vez, eu não duvido
que uma forma de piedade venha a muitos porque traz a leveza de consciência e
eles são capazes, como o Fariseu, de agradecer a Deus que eles não são como os
demais homens. Eles não foram à Igreja? Será que eles não pagaram por seus
bancos? Eles agora podem ir para o seu negócio diário sem essas fisgadas de
consciência que viriam por negligenciar as exigências da religião. Essas
pessoas professam que foram convertidas e elas são contadas com os crentes.
Mas, infelizmente, não pertencem a
eles. De todas as pessoas estas são mais difíceis de alcançar e menos
susceptíveis de serem salvas. Elas se escondem por trás da fortificação de uma
religião nominal. Elas estão fora do alcance do tiro e projétil da repreensão
do Evangelho. Eles pairam entre os pecadores e assumem seus alojamentos entre
os santos. Triste é que situação do homem que usa o nome da vida, mas nunca foi
vivificado pelo Espírito Santo. Assim, tenho mui debilmente buscado mostrar o
que estes homens tinham e por que eles tinham. Vamos agora lembrar o que eles
não tinham. Eles tinham “aparência” de piedade. Mas eles negaram “o poder”. O
que é esse poder? O próprio Deus é o poder da piedade; O Espírito Santo é a
vida e a força dela. A piedade é o poder que traz um homem a Deus e vincula-o a
Ele. A piedade é o que cria o arrependimento em direção a Deus e a fé nEle. A
piedade é o resultado de uma grande mudança do coração com referência a Deus e
Seu caráter. A piedade olha para Deus e lamenta sua distância dEle. A piedade
apressa-se a aproximarse e não descansa até que ela esteja em casa com Deus. A
piedade faz um homem semelhante a Deus. A piedade conduz um homem a amar a Deus
e servi-lO. Ela traz o temor de Deus diante de seus olhos e o amor de Deus em
seu coração. A piedade conduz à consagração, à santificação, à concentração. O
homem piedoso procura primeiro o reino de Deus e a Sua justiça e espera que as
outras coisas sejam acrescentadas a ele. A piedade faz com que um homem tenha
comunhão com Deus e dá-lhe uma participação com Deus em Seus desígnios gloriosos.
E por isso o prepara para morar com
Deus para sempre. Muitos que têm a aparência de piedade são estranhos a este
poder e por isso estão em religião mundana, em oração mecânica; em público uma
coisa e em privado outra. A verdadeira piedade repousa em poder espiritual e os
que estão fora disso estão mortos enquanto vivem. Qual é a história comum
daqueles que não têm esse poder? Bem, queridos amigos, o seu curso geralmente
transcorre assim, eles não começam negando o poder, mas eles começam a tentar
agir sem ele. Eles gostariam de tornarem-se membros da Igreja e como eles temem
que eles não estejam aptos para isso, eles olham sobre algo que se pareça com a
conversão e novo nascimento. Eles tentam convencer a si mesmos de que eles
foram transformados, eles aceitam emoção como a regeneração, e a crença na
doutrina pela crença em Cristo. É mais difícil no começo contar bronze como o
ouro, mas ele progride mais fácil, enquanto se persiste nisso. Remendando uma
conversão e fabricando uma regeneração, eles se aventuram adiante. No início,
eles têm uma boa quantidade de suspeita de si mesmos, mas eles diligentemente
matam cada questionamento, tratando-o como uma dúvida desnecessária. Assim, aos
poucos, eles acreditam em uma mentira. O próximo passo é fácil, eles enganam a
si mesmos e passam a acreditar que eles são certamente salvos. Tudo agora é
certo para a eternidade, assim eles imaginam. E eles cruzam os braços em calma
segurança, reunindo-se com o povo de Deus, eles erguem uma ousada fachada e
falam tão bravamente como se fossem os verdadeiros soldados do Rei Jesus. É só
um nome. Muito em breve, privadamente, em seus corações, eles pensam que é
assim e eles inventam doutrinas que correspondam a isso. Olhando para eles,
veem Cristãos inconsistentes e crentes em falta e eles dizem para si mesmos:
“Não há muito na fé, afinal. Eu sou tão bom quanto qualquer um desses crentes e
talvez melhor, embora eu tenha certeza que não há nenhuma obra do Espírito em mim”.
Assim, dentro de seus próprios corações eles creem, o que, a princípio, eles
não ousam falar: eles consideram a piedade uma coisa vazia. Aos poucos, em
alguns casos, essas pessoas profanamente negam o poder Divino da nossa santa fé
e, em seguida, eles se tornam os maiores inimigos da cruz de Cristo. Estes
traidores, nutridos na própria Casa de Deus, são os piores inimigos da verdade
de Deus e da justiça. Eles ridicularizam o que uma vez eles professavam
reverenciar. Eles mediram o milho de Cristo com o seu próprio alqueire. E
porque nunca sentiram os poderes do mundo vindouro, eles imaginam que ninguém
mais o tem sentido também. Olhem para a Igreja dos dias atuais. A escola
moderna, eu digo.
Em seu meio, vemos pregadores que têm
uma aparência de piedade, mas negam a eficácia dela. Eles falam do Senhor
Jesus, mas negam sua Divindade, que é o Seu poder. Eles falam do Espírito
Santo, mas negam sua Personalidade, onde reside Sua própria existência. Eles
retiram a substância e o poder de todas as doutrinas da Revelação, embora eles
ainda finjam acreditar nelas. Eles falam de redenção, mas eles negam a
substituição, que é a essência dela. Eles exaltam as Escrituras, mas negam sua
infalibilidade, onde reside o seu valor. Eles usam as frases da ortodoxia e não
acreditam em nada em comum com os ortodoxos. Eu não sei qual abominar mais:
seus ensinamentos ou o seu espírito, certamente estes são dignos um do outro.
Eles queimam a essência e preservam a casca. Eles matam a verdade e depois
fingem reverenciar o seu sepulcro, “se dizem judeus, e não o são” [Apocalipse
2:9]. Isso é horrível, mas o mal está amplamente difundido e na presença dele
os filhos de Deus estão concebendo compromissos, vendendo o seu Senhor e
tornando-se participantes com os desprezadores de Sua verdade. “Tendo aparência
de piedade, mas negando a eficácia dela”. É o pecado da época, o pecado que
está arruinando as Igrejas de nossa terra. II. Em segundo lugar, devemos
observar a TOLICE ÍMPIA desta conduta hipócrita. Aqueles que descansam na mera
demonstração de piedade estão agindo de uma forma impudente e vou tentar
expô-la. Primeiro, eles degradam o próprio nome de Cristo. Irmãos, se não há
poder espiritual na piedade, ela não vale nada. Queremos ausência de nuvens sem
chuva. De fingidos e meros pretensos temos mais do que suficiente. Aqueles que
não têm o poder da piedade mostramos uma imagem muito prejudicial da religião.
Eles fazem a religião de nosso Senhor ser comparável a um espetáculo em uma
feira, com figuras refinadas e alta percussão do lado de fora e interiormente
nada digno de consideração por um momento. O melhor do espetáculo está do lado
de fora. Ou se há algo dentro, é um baile de máscaras, onde todos atuam com
peças emprestadas, mas ninguém é o que parece ser. Gracioso Senhor, nunca
permita que nós possamos agir de modo a fazer com que o mundo pense que o nosso
Redentor não é nada mais do que um hábil diretor de teatro, onde nada é real,
mas tudo é pantomima1 . Irmãos e irmãs, se vocês oram em absoluto, orem a Deus
para torná-los completamente verdadeiros.
Que vocês sejam feitos de metal
verdadeiro! Seria melhor para vocês que nunca tivessem nascido do que vocês
desonrarem a Cristo entre os filhos dos homens, levando-os a concluírem que a
religião é toda uma peça de atuação. A tolice disto é ilustrada pelo fato de
que não existe um valor de tal forma morta. A aparência de piedade sem o poder
não é digna da dificuldade que esta toma apresenta para ser elaborada e
mantida. Joias de imitação são bonitas e brilhantes. Mas se você as leva ao
joalheiro, ele não dará nada por elas. Há uma religião que é toda colar de
joias, uma piedade que brilha, mas não é ouro. E no dia em que vocês desejarem
realizar algo a partir dela, serão miseravelmente desapontados. Uma aparência
de piedade unida a um coração profano não tem valor para Deus. Eu li que o
cisne não era autorizado a ser oferecido sobre o altar de Deus, porque, apesar
de suas penas serem brancas como a neve, mas sua pele é escura. Deus não
aceitará aquela moralidade externa que esconde impureza interior. Deve haver um
coração puro, bem como uma vida limpa. O poder da piedade deve trabalhar
interiormente, ou então Deus não aceitará a nossa oferta. Não há nenhum valor
para o homem ou para Deus em uma religião que é uma aparência morta.
Consequentemente, não há utilidade em
mera formalidade. Se a sua religião não tem vida espiritual, qual é a utilidade
dela? Você poderia ir para casa em um cavalo morto? Será que você caça com
cachorros mortos? Alguém gostaria de ir para a batalha com um capacete de
papelão? Quando a espada cair sobre ele, qual seria o uso de um capacete assim?
Que clamor foi levantado por espadas ruins! A falsa religião é em algo melhor?
No profundo __________ [1] Pantomima: é um teatro gestual que faz o menor uso
possível de palavras e o maior uso de gestos através da mímica inverno, vocês
podem se aquecer diante de um fogo pintado? Poderiam jantar a imagem de uma
festa quando vocês estão com fome? Deve haver vitalidade e substancialidade ou
então a aparência é totalmente inútil. E pior do que inútil, pois ela pode
lisonjeá-los em mortal presunção. Além disso, não há nenhum conforto nela. A
aparência sem o poder não tem nada nela para aquecer o coração, para elevar os
espíritos, ou para fortalecer a mente no dia da doença, ou na hora da morte.
Ó Deus, se a minha religião tem sido
uma mera aparência, o que farei na enchente do Jordão? Minha confissão refinada
desparecerá em absoluto e nada virá dela com o que eu possa enfrentar o último
inimigo. Pedro chamou os hipócritas de “fontes sem água” [2 Pedro 2:17]. Vocês
estão com sede e alegremente espionam um poço, ele é bem cercado com um
meio-fio e equipado com um guincho e um balde. Vocês se apressam para retirar
água. O que foi? Será que o balde veio vazio? Vocês tentam de novo. Como é
amargo o seu desapontamento! Um poço sem água é um escárnio. É um mero poço de
destruição, uma ilusão mortal. São alguns de vocês possuidores de uma religião
que nunca lhes rende uma gota de consolo? Ela é uma escravidão para vocês?
Vocês seguem a Cristo como um escravo segue o seu mestre? Fora com essa
religião! A piedade que é digna de se ter é uma alegria para um homem, é a sua
escolha, o seu tesouro, seu tudo. Quando ela não lhe rende regozijo deliberado,
ainda assim ele a valoriza como a única fonte de onde a alegria dele é
esperada. Ele segue a Cristo com amor, a partir do desejo de seu coração por
Ele e não a partir da força do hábito, ou pelo poder do medo. Ter a aparência de
piedade sem o poder dela é falta de constância em sua religião. Vocês nunca
viram uma miragem, talvez. Mas aqueles que têm viajado no Oriente, quando
voltam para casa, certamente falam sobre elas.
É um dia muito quente e sedento e
vocês estão andando em um camelo. De repente, levantam-se diante de uma cena
bonita. Bem perto de vocês estão ribeiros de águas, fluindo entre camas de
vimes e bancos de canas e juncos. Acolá estão palmeiras e laranjeiras. Sim, e
uma cidade ergue-se em uma colina, coroada com minaretes e torres. Vocês estão
alegres e pedem ao seu guia para levá-los mais perto da água, que brilha no
sol. Ele severamente responde: “Não faça caso, é uma miragem. Não há nada ali,
senão areia ardente”. Vocês mal podem acreditar nele. Parece tão real! Mas eis
que tudo se foi, como um sonho noturno. E assim é a esperança que é construída
sobre a aparência de piedade sem o poder. As formigas brancas comerão toda a
substância de uma caixa e ainda a deixam de pé até que um toque faz com que
toda a estrutura caia em pó, cuidado com uma confissão da qual a substância
tenha sido devorada. Não acreditem em nada que não tenha o selo da eternidade
sobre ele. Tenha cuidado, pobre criança, você pode soprar a sua bolha e a luz
do sol pode pintá-la com o arco-íris. Mas em um instante ela se vai, e nem um
traço dela permanece. Seu mundo transitório de beleza é para você e suas
crianças companheiros e não para os homens.
Na realidade, este tipo de religião
está em oposição a Cristo. É Janes e Jambres mais uma vez, o mago da hipocrisia
está tentando fazer milagres que pertencem apenas a Deus. Na aparência, ele
produziria as mesmas maravilhas como o dedo de Deus. Mas ele falha. Queira Deus
que nós nunca sejamos culpados de resistir à verdade de Deus por meio de uma
profissão [de fé] mentirosa. Os homens falsos produzem graves prejuízos à
verdadeira piedade. Pois, como Eúde, eles vêm com uma pretensa mensagem de Deus
e com sua espada afiada em ambos os lados, eles atacam a piedade vital em seu próprio
coração. Ninguém pode fazer tanto dano à Igreja de Deus, quanto o homem que
está dentro de seus muros, mas não dentro de sua vida. Esta piedade nominal,
que é desprovida de poder, é uma coisa vergonhosa. Eu concluo com isso. É uma
coisa vergonhosa para esta vida, pois o Senhor Jesus a abomina. Quando passou
pela figueira, que era tão precoce com suas folhas, mas tão vazia de frutos,
Ele ali viu a semelhança do professo vanglorioso que não tem santidade real e
Ele disse: “Nunca mais nasça fruto de ti!” [Mateus 21:19]. Sua Palavra a
murchou de uma vez, isso permaneceu como um terrível emblema do fim de uma
falsa confissão. Quanta vergonha estará sobre um infrutífero professo sem vida
na eternidade, quando os segredos de todos os corações serão revelados! Que
vergonha e desprezo eterno o aguardarão quando sua falsidade for detectada e
sua baixeza deverá preencher todas as santas mentes com horror! Oh,
acautelai-vos do inferno do falso professo! Eu terei acabado quando eu
adicionar algumas palavras de instrução. A aparência de piedade é mui preciosa.
Que aqueles que sentem o poder da
piedade o honrem e o usem. Não desprezem isso, porque os outros o têm
danificado. Venham adiante e façam uma confissão aberta da religião. Mas
assegurem que vocês têm o poder dela. Clamem a Deus para que vocês nunca usem
uma luva que seja maior do que o seu braço, quero dizer, que nunca possam ir
além do que é real e verdadeiramente seu próprio. Será melhor para vocês irem a
Deus como uma alma perdida e clamarem por misericórdia, do que professarem a si
mesmos salvos quando vocês não o são. No entanto, confessem a Cristo, sem falta
ou medo. Não tenham vergonha de Jesus por causa dos maus modos dos Seus
discípulos. Consideram o mau cheiro dos falsos professos como parte da cruz que
vocês devem suportar por seu Senhor. Pois, estar associado a alguns que não são
verdadeiros parece inevitável nesta vida, no entanto, escolhamos cuidadosamente
nossa companhia. Agora, uma palavra de discriminação. Aqueles a quem o meu
texto não tem nada a dizer serão os primeiros a levá-lo para casa para si.
Quando eu anuncio com meu coração um sermão fiel, certas almas trêmulas, a quem
eu de bom grado consolo, estão seguras em pensar que eu quero me destinar a
elas. A pobre mulher, em profunda aflição, vem a mim, clamando: “Senhor, eu não
tenho nenhum sentimento”. Caro coração, ela tem dez vezes mais sentimento.
Outro suspira: “Eu tenho certeza que eu sou um hipócrita”. Eu nunca encontrei
com um hipócrita que se achava assim. E eu nunca encontrarei. “Oh”, disse
outro, “eu me sinto condenado”. Aquele que se sente condenado pode esperar por
perdão. Se vocês têm medo de si mesmos eu não tenho receio de vocês. Se vocês
termem diante da Palavra de Deus, vocês têm uma das mais seguras marcas de
eleitos de Deus. Aqueles que temem estar enganados raramente estão enganados.
Se vocês se examinarem e permitirem que a Palavra de Deus vos examine, está
tudo bem convosco. O comerciante falido teme ter seus livros examinados. O
homem sensato ainda paga um contador para revisar seus negócios. Use a
discriminação e nem se absolvam e nem se condenem sem razão. Se o Espírito de
Deus o leva a chorar em segredo pelo pecado e a orar em segredo por graça
Divina; se Ele o leva a buscar santidade; se Ele o leva a confiar somente em
Jesus, então você conhece o poder da piedade e nunca a negou. Você que clama:
“Oh, que eu sentisse mais do poder do Espírito Santo, pois sei que Ele pode me
consolar, santificar e fazer-me viver a vida do Céu na terra!”, você não é
atingido pelo texto ou sermão. Pois, você não tem negado o poder. Não, não,
este texto não pertence a você, mas para outra classe completamente diferente
de pessoas. Deixe-me dar-lhes uma palavra de admoestação.
Aprendam com o texto que há algo na
piedade que vale a pena aspirar. A “aparência” da piedade não é tudo, há um
“poder” bendito. O Espírito Santo é o poder e Ele pode operar em vocês para que
queiram e efetuem a boa vontade de Deus. Venham a Jesus Cristo, queridas almas.
Não venham ao ministro, nem à Igreja, em primeiro lugar. Mas venham a Jesus.
Venham e prostrem-se aos Seus pés e digam: “Senhor, eu não serei consolado, sem
que Tu me consoles”. Venham e levem tudo em primeira mão de Seu Senhor
crucificado. Em seguida, vocês conhecerão o poder da piedade. Acautelai-vos da
religião de segunda mão, ela nunca é digna de ser carregada para casa. Obtenham
a sua piedade direto do Céu, pelo lidar pessoal de sua própria alma com o seu
Salvador. Professem apenas o que vocês possuem e descansem apenas no que vos
foi dado do alto. Sua vida celeste ainda pode ser muito débil, mas o grão de
mostarda crescerá. Você pode ser o menor em Israel, mas é melhor do que ser o
maior na Babilônia.