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terça-feira, 10 de abril de 2018

Representar a Deus através de imagens é corromper-lhe a Glória


Como, porém, a Escritura, levando em conta o parvo e tacanho entendimento humano,costuma expressar-se de maneira acessível à mente popular, quando tem em mira distinguir dos falsos o Deus verdadeiro, contrasta-o especialmente com os ídolos, não que, em assim fazendo, aprove o que, mais sutil e elegantemente, ensinam
os filósofos, mas, antes, para que melhor exiba a estultícia do mundo; mais do que isso, sua completa loucura, enquanto, ao buscar a Deus, a todo tempo cada um se apega a suas próprias especulações.
Portanto, essa definição exclusiva, a qual, em referência à unicidade de Deus, por toda parte se manifesta, reduz a nada tudo quanto os homens, segundo a própria cogitação, engendram para si acerca da divindade, porquanto somente Deus é testemunha idônea de si próprio.
Enquanto isso, já que este degradante embrutecimento se apossou de todo o orbe, de tal modo que os homens buscassem representações visíveis de Deus, e por isso forjassem deuses da madeira, da pedra, do ouro, da prata, ou de outro qualquer material
inanimado e corruptível, a este princípio temos de apegar-nos: sempre que é lhe atribuída qualquer representação, a glória de Deus é corrompida por ímpio engano. E assim na lei, após haver arrogado unicamente para si a glória da Deidade, quando visa a ensinar que gênero de adoração aprova, ou repudia, Deus acrescenta de imediato: ‘Não farás para ti imagem esculpida, nem qualquer semelhança” [Ex 20.4], palavras com as quais nos coíbe o desenfreamento, para que não tentemos representá-lo por meio de
qualquer figura visível. E enumera, de maneira sucinta, todas as formas mediante as quais, já desde outrora, a superstição começara a converter sua verdade em mentira.
Ora, sabemos que o sol fora adorado pelos persas. Também, tantas quantas estrelas as pessoas estultas divisavam no céu, outros tantos deuses para si inventavam.
Quase não houve animal algum que para os egípcios não se convertesse em representação de alguma divindade. Os gregos, verdade seja dita, pareceram exceder em sabedoria aos demais, pois adoraram a Deus sob forma humana. Entretanto, Deus não compara essas imagens entre si, como se uma fosse mais apropriada, outra o fosse menos; ao contrário, repudia, sem exceção, todas as efígies esculturadas, pinturas e outras representações, mediante as quais os supersticiosos supuseram que
ele lhes haveria de estar perto.

João Calvino