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quarta-feira, 18 de julho de 2018

A CONVERSÃO NÃO É UM PRODUTO CONJUNTO DE DEUS E DO HOMEM


A todos estes testemunhos interpretam cavilosamente os mais sutis, insistindo em que nada impede que nós próprios apliquemos nossas forças e Deus traga ajuda a nossas fracas tentativas. Adicionam, ademais, passagens dos profetas em que a operação de nossa conversão parece ser dividida meio a meio entre Deus e nós: “Convertei-vos a mim e eu me converterei a vós” [Zc 1.3]. Que tipo de ajuda nos traga o Senhor foi demonstrado supra, tampouco aqui se faz necessário repeti-lo. Desejo ao menos que isso me seja concedido: em vão se procura em nós a capacidade de cumprir a lei pelo fato de que o Senhor no-la ordena à obediência, quando é evidente que, para se cumprir todos os preceitos de Deus, a graça do Legislador não só é necessária, mas ainda nos é prometida, pelo que daí se evidencia que, no mínimo, se exige de nós mais do que sejamos capazes de executar. Na verdade, não se pode diluir de quaisquer cavilações essa afirmação de Jeremias: que foi sem efeito o pacto de Deus firmado com o povo antigo, porque o era apenas da letra; nem ser além disso estabelecido de outra maneira, que é o Espírito quem plasma os corações à obediência [Jr 31.32]. Também de nada lhes serve para firmar seu erro esta injunção: “Convertei-vos a mim e eu me converterei a vós” [Zc 1.3]. Pois aí por conversão de Deus se denota não aquela em virtude da qual o coração nos renova para o arrependimento, mas aquela mediante a qual se atesta benévolo e propício pela prosperidade das coisas, assim como pelas coisas adversas às vezes indica seu desagrado. Portanto, uma vez que o povo, atormentado de muitas formas, de misérias e calamidades, se queixava de que Deus se afastara dele, responde que não lhes haveria de faltar sua benignidade, se volvessem à retidão de vida e a ele próprio, que é modelo de justiça. Esta passagem, pois, é indevidamente torcida quando é arrastada a este ponto: que a obra da conversão parece estar repartida entre Deus e os homens. Por isso, temos abordado estes tópicos mais sumariamente, porque o lugar deste assunto será mais propriamente na parte em que se procederá à consideração da lei.

João Calvino