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segunda-feira, 23 de julho de 2018

CRISTO REVELA O REAL SENTIDO DA LEI


Quando dizemos ser esse o sentido da lei, não estamos a impor uma interpretação nova, oriunda de nós mesmos; pelo contrário, estamos seguindo a Cristo, o melhor intérprete da lei. Como, pois, os fariseus imbuíram o povo de pervertida opinião, isto é, que cumpria cabalmente a lei quem, por ato externo, nada tivesse praticado contra a lei, Cristo condena este perigosíssimo erro e declara que é adultério a mera olhadela impudica para a mulher [Mt 5.28], e testifica que são homicidas todos quantos odeiam a um irmão, pois se fazem passíveis ao juízo aqueles que porventura sequer tenham concebido ira no íntimo; passiveis ao tribunal aqueles que, murmurando ou vociferando, tenham dado alguma demonstração de espírito ofendido; passíveis à Gehena de fogo aqueles que, com impropérios e invectiva, tenham irrompido em ira franca [Mt 5.22]. Aqueles que não perceberam estas coisas imaginaram a Cristo como outro Moisés, o portador da lei do evangelho, lei esta que cumpria a deficiência da lei mosaica. Donde esse popularizado axioma acerca da perfeição da lei do evangelho: que ela supera, por ampla distância, a antiga lei, o que, de muitos modos, é assaz pemicioso. Ora, do próprio Moisés, quando mais adiante coligirmos a suma de seus preceitos, evidenciar-se-á de quão indigna afronta esta maneira de ver tisna a lei divina. Insinua ela que a santidade dos patriarcas, na verdade, não se distanciou muito da hipocrisia e nos afasta daquela única e perpétua norma de justiça. Mui fácil, porém, é a refutação deste erro, porquanto pensaram que Cristo acrescenta à lei, quando apenas a restaura à sua integridade, enquanto, obscurecida pelas deturpações dos fariseus e maculada por seu fermento, a liberta e purifica.

João Calvino