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quinta-feira, 19 de julho de 2018

A GRAÇA NOS RENOVA A VONTADE, DONDE AS AÇÕES LOUVÁVEIS SEREM FRUTO DA GRAÇA QUE NOS REGE A VONTADE


Daqui transparece que a graça de Deus, como é esta expressão tomada quando se trata da regeneração, é a norma do Espírito para dirigir e regular a vontade do homem. Não a pode regular sem corrigi-la, sem reformá-la, sem renová-la – donde dizemos que o princípio da regeneração é que seja abolido o que é nosso –, sem, ao mesmo tempo, movê-la, ativá-la, impulsioná-la, conduzi-la, sustê-la. Do quê dizemos, com verdade, serem integralmente dele todas as ações que daí emanam. Entrementes, não negamos ser mui verdadeiro o que Agostinho ensina: que a vontade não é destruída pela graça; ao contrario, é antes reparada, pois que ambos esses conceitos se harmonizam esplendidamente, de modo que se pode dizer que a vontade do homem é restaurada, enquanto, corrigida a viciosidade e depravação, é ela dirigida à verdadeira norma da justiça, e ao mesmo tempo se pode dizer que é criada no homem uma vontade nova, porquanto está viciada e corrompida a tal ponto que ele tem por necessário induzir-lhe no íntimo uma nova natureza. Ora, nada obsta que, com propriedade, se diga que efetuamoso que o Espírito de Deus efetua em nós, ainda que nossa vontade de si própria nada contribua que seja desvinculado de sua graça. E por isso é preciso ter em lembrança o que, em outro lugar, citamos de Agostinho: que certos indivíduos labutam em vão no afã de descobrir na vontade do homem qualquer coisa própria de bom, pois tudo quanto de mistura porfiam os homens impingir à graça de Deus, em louvor do livre-arbítrio, outra coisa não é senão corrupção, exatamente como se alguém diluísse vinho com água barrenta e amargosa. Mas, se bem que provém da pura injunção interior do Espírito o que quer que de bom haja na vontade, uma vez que, entretanto, o querer nos é naturalmente ingênito, nos é dito não sem causa que efetuamos essas coisas cujo louvor, de direito, Deus para si reivindica, em primeiro lugar, porque nosso é, por sua benignidade, tudo quanto ele opera em nós, uma vez que compreendamos que não procedem de nós; em segundo lugar, visto que nossa é a mente, nossa a vontade, nosso o esforço, estes são por ele dirigidos para o bem.

João Calvino