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segunda-feira, 30 de julho de 2018

TEOR E SENTIDO DA PROMESSA CONTIDA NA CLÁUSULA: “E USA DE MISERICÓRDIA PARA COM MILHARES”


Por outro lado, apresenta-se a promessa de que a misericórdia de Deus haverá de ser propagada a mil gerações, promessa que ocorre nas Escrituras, aliás com freqüência, e é inserida no solene pacto da Igreja: “Eu serei o teu Deus, e de tua semente após ti” [Gn 17.7]. Contemplando isto, Salomão escreve que seriam bemaventurados os filhos dos justos após a morte destes [Pv 20.7], não apenas em razão de sua santa educação, que também ela própria não tem, na verdade, reduzida importância, mas ainda, em decorrência desta bênção prometida no pacto, para que a graça de Deus resida eternamente nas famílias dos piedosos. Daqui há conforto singular para os fiéis, e terror ingente para os ímpios, porque, se também após a morte, a lembrança tanto da justiça quanto da iniqüidade vale tanto diante de Deus, que a maldição deste e a bênção daquele se transmitem à posteridade, muito mais repousarão sobre as próprias cabeças dos que as têm praticado. No entanto, nada impede que a descendência dos ímpios por vezes se volte à prática do bem, a descendência dos fiéis degenere, pois aqui não quis o Legislador fixar uma regra perpétua que anulasse sua eleição. Ora, para conforto do justo e terror do pecador, é suficiente que ela não seja uma declaração vã ou ineficaz, embora nem sempre tenha lugar. Pois, da mesma forma que as penas temporais que são infligidas a uns poucos ímpios são testemunhas da ira divina contra os pecados e do juízo um dia a sobrevir a todos os pecadores, embora muitos passem impunemente até o fim da vida, assim também, quando o Senhor dá um exemplo desta bênção, de sorte que, por causa do pai, contemple o filho com sua misericórdia e benignidade, está a exibir prova de seu constante e perpétuo favor para com seus adoradores. Quando, uma vez, no filho persegue a iniqüidade do pai, Deus está a ensinar que espécie de juízo se reserva a todos os réprobos por suas próprias transgressões, certeza que aqui contemplou acima de tudo. Ademais, recomenda-nos, de passagem, a grandeza de sua misericórdia, que estende por mil gerações, quando somente quatro gerações reservara à punição.

João Calvino