E se examinarmos seus costumes e sua vida? Onde estará aquela “luz do mundo”
[Mt 5.14] que Cristo requer? Onde o “sal da terra” [Mt 5.13]? Onde aquela
santidade que seja um como que padrão perpétuo de conduta? Nenhuma classe de
homens hoje é de pior reputação no luxo, na efeminação, nos prazeres, por fim em
todo gênero de dissoluções. De nenhuma classe de mestres há mais refinados ou
mais hábeis de toda impostura, fraude, traição, perfídia; em parte alguma há tanto
de solércia ou de ousadia para fazer o mal. Deixo de mencionar a arrogância, a
soberba, a rapacidade, a crueldade; deixo de lado a dissoluta licenciosidade em
todos os aspectos da vida; o mundo está cansado de suportar coisas do gênero, o que
não há como eu exagerar em demasia. Digo apenas uma coisa, a qual é impossível que pessoalmente neguem: dentre
os bispos quase não há sequer um, dos prepostos de paróquias em cem não há um de
quem, se houver de passar sentença quanto aos costumes, segundo os cânones antigos,
não deva ou ser excomungado, ou ao menos ser deposto do ofício. Isto, como a
disciplina que se usava antigamente há muito que caiu em desuso e está como que
sepultada, pode parecer incrível, mas é assim mesmo. Assim, pois, que todos os
servidores e sequazes do papa se gloriem de sua ordem sacerdotal. Evidentemente,
nem de Cristo, nem de seus apóstolos, nem dos pais, nem da Igreja antiga é a origem
da ordem eclesiástica que eles têm.
João Calvino