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quinta-feira, 1 de novembro de 2018

FUNÇÕES E SUSTENTO DOS SACERDOTES SECULARES, FONTE DE LAMENTÁVEL MERCANTILISMO E MERCENARISMO

Passo agora aos sacerdotes seculares, que em parte são, como dizem, beneficiários, isto é, têm sacerdócios, dos quais são sustentados; em parte exercem funções diárias, celebrando missa ou cantando, e tendo como prover seus estômagos.Os beneficios, ou têm o cuidado das almas, como episcopados e paróquias, ou são estipêndios de homens refinados, que adquirem seu meio de subsistência cantilando, como prebendas, canonicatos, personatos e dignidades, capelanias e afins. Se bem que, já transtornadas as coisas de alto e baixo, são conferidas abadias e priorados não somente a presbíteros seculares, mas ainda, por privilégio, isto é, como costume vulgar, até a meninos. No que respeita aos sacerdotes mercenários, que procuram diariamente seu meio de subsistência, que outra coisa poderiam fazer senão o que fazem, a saber, que de modo indigno de um homem livre, e vergonhoso, se prostituam ao ganho, especialmente em meio a tão grande multidão da qual o mundo ora está tão empanturrado? E assim, como não ousam mendigar abertamente, ou julgam pouco haverem de lucrar nesta maneira, andam à volta como cães famélicos, e com sua importunação o lançam no árido ventre. Se quiser demonstrar aqui a desonra que é para a Igreja que o estado presbiteral se encontre tão desolado, jamais acabaria. Não empregarei muitas lamentações para expor quão grande vergonha é. Apenas direi que, se o ofício do presbítero é apascentar a Igreja e administrar o reino espiritual de Cristo [1Co 4.1], como o ordena a Palavra de Deus e o exigem os cânones antigos, todos os sacerdotes que não têm outra coisa que fazer além de andar comerciando com suas missas, não só deixam de cumprir com seu dever, mas ainda não têm ofício legítimo no qual exercitar-se; porque não lhes permitem ensinar, nem lhes ensinam a apascentar as ovelhas. Em  suma, não têm mais que o altar, para oferecer Cristo em sacrifício; o que não é sacrificar a Deus, mas ao Diabo, como logo se verá.

João Calvino