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terça-feira, 6 de novembro de 2018

IMPROCEDÊNCIA DO ARGUMENTO DE QUE O PRIMADO DO PAPA ACHA RESPALDO OU, MELHOR, CORRESPONDE À AUTORIDADE ÚNICA DO SUMO SACERDOTE LEVÍTICO

Este, pois, é o estado da questão: Se para a verdadeira constituição da hierarquia, como a chamam, ou da ordem eclesiástica, é necessário que uma sé tenha eminência entre as outras, tanto em dignidade quanto em poder, de sorte que seja a cabeça de todo o corpo. Nós, porém, sujeitamos a Igreja a leis demasiado iníquas se, à parte da Palavra de Deus, lhe impomos esta necessidade. Portanto, se nossos adversários querem conseguir o que postulam, é preciso primeiro mostrar que esta economia foi institituída por Cristo. Neste sentido, citam da lei o sumo sacerdócio, de igual modo, a suprema judicatura que Deus instituiu em Jerusalém. Mas a resposta é fácil, e é múltipla, caso alguém não fique satisfeito. Primeiro, o que foi útil em uma nação, não significa que isso deva estender-se ao mundo inteiro; de fato, a constituição de uma nação e do mundo inteiro será muito diversa. Porque os judeus estavam cercados de todos os lados por idólatras; para que não fossem arrastados em diferentes direções pela variedade de religiões, Deus colocou a sede de seu culto na parte central da terra, propondo aí um antístite único para quem todos voltassem as vistas, para que melhor fossem mantidos em unidade. Agora, quando a verdadeira religião se difundiu por todo o orbe, quem não vê ser inteiramente absurdo que se dê a um só a direção do Oriente e do Ocidente? Ora, é exatamente como se alguém afirmasse que por um só dirigente se deve governar o mundo inteiro, só porque um território não possui muitos dirigentes. Mas ainda há uma outra razão por que isso não deva ser imitado. Que aquele sumo pontífice foi um tipo de Cristo ninguém ignora. Agora, para o sacerdócio ser transferido, convém que aquele direito seja transferido [Hb 7.12]. No entanto, a quem ele foi transferido? Evidentemente, não ao papa, como ele próprio se atreve impudentemente a vangloriar-se, reivindicando este título em proveito próprio, mas a Cristo; e como este exerce o ofício por si só, sem vigário nem sucessor algum, a nenhum outro transfere a honra. Pois este sacerdócio não consiste apenas no ensino, mas também na propiciação de Deus, que Cristo cumpriu em sua morte, bem como naquela intercessão que agora exerce junto ao Pai.

João Calvino