Entretanto, vejamos como admiravelmente arrazoam. Afirmam que Pedro exerceu
o principado entre os apóstolos; portanto, a igreja na qual teve sua sede deve ter
este privilégio. Mas, onde ele teve primeiro sua sede? Em Antioquia, dizem eles.
Logo, a igreja antioquense, com direito, reivindica para si o primado. Declara que
ela outrora era a primeira, mas que Pedro, emigrando aí, transferiu a Roma a honra
que trouxera consigo. Ora, sob o nome do papa Marcelo existe uma epístola aos
presbíteros antioquenses na qual assim fala: “A sé de Pedro esteve inicialmente
entre vós, a qual, mais tarde, o Senhor transferiu para cá. Assim sendo, a igreja
antioquense, que outrora era a primeira, cedeu sua vez à sé romana. Mas, pergunto
eu, em virtude de quê oráculo aquele bom homem foi pelo Senhor assim mandado?
Ora, se esta questão tiver que ser decidida pelo direito, então é indispensável
que respondam: porventura querem que este privilégio seja pessoal, real, ou misto?
Pois há de ser uma dessas três opções. Se for pessoal, então não tem nada a ver com
lugar; se, porém, for real, então, uma vez que foi estipulado um lugar, não se retira
dele em razão ou de morte ou de afastamento da pessoa. Resta, pois, a conclusão de
que foi misto; mas então não há que considerar simplesmente o lugar sem correspondência
com a pessoa. Que decidam pelo que quiserem; e facilmente convencerei
que de forma alguma se pode atribuir a Roma o primado que ela reivindica.
João Calvino