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quinta-feira, 8 de novembro de 2018

À LUZ DE OUTROS ESCRITOS DE PAULO, A TESE É AINDA MAIS CORROBORADA DE QUE PEDRO NÃO FOI BISPO EM ROMA; O QUE ENCONTRAMOS ALI É O APOSTOLADO DE PAULO

Mais tarde Paulo é conduzido preso a Roma [At 28.16]. Lucas narra [At 28.15] que ele foi recebido pelos irmãos; quanto a Pedro, nada se menciona. Dali escreve a muitas igrejas. Em alguma parte das epístolas daí escritas também envia saudações em nome de outras pessoas; não diz uma palavra sequer que indique que Pedro então esteve ali. Pergunto, pois, quem acreditará que podia guardar silêncio, se Pedro estivesse ali presente? Mais ainda, na Epístola aos Filipenses, onde disse que ninguém cuida tão fielmente da obra do Senhor como o faz Timóteo, se queixa de que todos buscam o que é seu [Fp 2.19-21]. E ao próprio Timóteo ele expressa a queixa com mais gravidade: que ninguém esteve presente em sua primeira defesa; ao contrário, todos o desampararam inteiramente [2Tm 4.16]. Portanto, onde Pedro estava então? Ora, se dizem que ele estava em Roma, quão terrível ignomínia Paulo lhe imprime: que ele foi desertor do evangelho! Certamente que ele está falando de fiéis, porque acrescenta: “que Deus não lhes impute isso” [2Tm 4.16]. Por quanto tempo, pois, e em que época ocupou Pedro essa sé? Dirão, porém, que é constante a opinião dos escritores de haver ele governado essa igreja até a morte. Entretanto, entre esses mesmos escritores não está solidamente estabelecido quem foi seu sucessor, pois alguns afirmam ter sido Lino, e outros que foi Clemente. E narram muitas estórias absurdas acerca da disputa havida entre ele e Simão Mago. Tampouco dissimula Agostinho, disputando a respeito das superstições, de uma opinião inconsideradamente concebida de que se implantara em Roma o costume de que não jejuassem nesse dia em que Pedro vencera Simão Mago. Afinal, as coisas desse tempo são a tal ponto enredilhadas em uma variedade de opiniões, que não se deve dar fé inconsideradamente, quando lemos algo escrito. E no entanto, em razão deste consenso dos escritores, não discordo que ele tenha morrido aí; mas que ele foi bispo, especialmente por longo tempo, não há como me persuadir. Tampouco me preocupo muito com o fato de Paulo haver atestado que o apostolado de Pedro pertenceu peculiarmente aos judeus, enquanto que o seu pertenceu a nós [Gl 2.7, 8]. Conseqüentemente, para que aquele pacto que foi firmado entre eles [Gl 2.9] se cumprisse em relação a nós, aliás, para que a ordenança do Espírito Santo se firmasse entre nós, nos convém atentar mais para o apostolado de Paulo que de Pedro, porquanto de tal modo o Espírito Santo dividiu entre eles as províncias, que Pedro se destinasse aos judeus, e Paulo, a nós. Agora, pois, que os romanistas busquem seu primado em outra parte além da Palavra de Deus, na qual não encontrarão nenhum fundamento.

João Calvino