Mas em parte alguma lemos de se haver dito a algum outro: “Tu és Pedro, e
sobre esta pedra edificarei minha Igreja” [Mt 16.18]! Como se Cristo então estivesse
aí afirmando de Pedro outra coisa que o que eles mesmos, Paulo e Pedro, dissessem
de todos os cristãos! Pois aquele fala de Cristo como a pedra suprema e angular,
sobre a qual são edificados os que crescem como templo santo do Senhor [Ef 2.20,
21]; este, porém, declara que somos pedras vivas, bem fundamentadas naquela pedra
eleita e preciosa [1Pe 2.5, 6], mercê desta juntura e conexão estamos solidamente
ligados com nosso Deus e entre nós [Cl 2.19].
Dizem que ele está acima dos outros, porquanto tem o nome especialmente
referido. Certamente de bom grado concedo a Pedro esta honra: que ele seja colocado entre os primeiros no edifício da Igreja; ou, se também quiserem isto, que ele
seja o primeiro de todos os fiéis. No entanto não admitirei que se deduza disto que
tem o primado acima dos outros. Ora, que modo de concluir é este de que Pedro
excede aos outros no fervor do zelo, na doutrina, na magnitude de ânimo, aliás, tem
poder sobre eles? Como se realmente eu não pudesse concluir, e com melhor razão,
que André está acima de Pedro em eminência, porque o antecedeu no tempo e o
conduziu a Cristo [Jo 1.40, 42]. Mas não tomo isso em consideração. É incontestável
que Pedro tenha a primazia. Contudo, existe uma grande diferença entre honra e
eminência e poder. Vemos que os apóstolos concederam ordinariamente a Pedro a
honra de ser o primeiro a falar na assembléia dos fiéis, de certo modo exercesse
sobre eles a preeminência na discussão, na exortação, na admoestação. Mas de sua
autoridade sobre os demais, não lemos uma só palavra.
João Calvino