Semente de eleição de que natureza, pergunto eu, então medrava naqueles que,
ao longo de toda sua vida, contaminados de variadas maneiras, como se em desesperada
impiedade, chafurdando-se em dissolução de todas a mais nefanda o execrável?
Se Paulo quisesse falar conforme esses tais, deveria mostrar-lhes quanto deviam
à benevolência de Deus, mercê da qual foram preservados para que não caíssem
em tão grandes torpezas. Assim, também Pedro deveria ter exortado os seus à gratidão
por causa da perpétua semente da eleição. Ao contrário, ele adverte que fora
suficiente o tempo passado para consumar as concupiscências dos gentios[1Pe 4.3].
O que dizer se passarmos aos exemplos? Gérmen de justiça de que natureza
havia em Raabe, a meretriz [Js 2.1], antes que viesse à fé? Que semente em Manassés,
quando embebeu Jerusalém imergindo-a, por assim dizer, no sangue dos Profetas?
[2Rs 21.16]. E no ladrão, o qual, finalmente, se moveu ao arrependimento, por
entre os últimos alentos? [Lc 23.42]. Portanto, longe de nós esses argumentos que,
à parte da Escritura, para si próprios temerariamente cogitam homens demasiadamente
curiosos! Permaneça, porém, para nós o que tem a Escritura: “Todos igualmente
se extraviaram, à semelhança de ovelhas perdidas; cada um se desgarrava
para seu caminho” [Is 53.6], isto é, para a perdição. Aqueles a quem o Senhor outrora
determinou tirar deste sorvedouro de perdição, os guarda para sua ocasião; os
preserva somente para que não se precipitem em imperdoável blasfêmia.
João Calvino