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sexta-feira, 26 de outubro de 2018

OS DIVERSOS OFÍCIOS EXCLESIÁSTICOS DA IGREJA PRIMITIVA, SEGUNDO EFÉSIOS 4.11, E SUA NATUREZA

Aqueles que presidem ao governo da Igreja, segundo a instituição de Cristo, são chamados por Paulo [Ef 4.11], primeiro apóstolos; em seguida, profetas; terceiro, evangelistas; quarto, pastores; finalmente, mestres; dos quais apenas os dois últimos têm função ordinária na Igreja, os outros três o Senhor suscitou no início de seu reino, e às vezes ainda suscita, conforme convém à necessidade dos tempos. Qual é a função apostólica se faz evidente à luz deste mandado: “Ide, pregai o evangelho a toda criatura” [Mc 16.15]. Não se atribuem seus limites definidos; ao contrário, os envia para que conduza o mundo inteiro à obediência de Cristo, para que, espargindo o evangelho por toda parte que possam, em todos os lugares erijam seu reino. Por isso mesmo Paulo, como quisesse provar seu apostolado, recorda que não ganhou para Cristo uma única cidade, senão que propagava o evangelho ampla e extensivamente; nem pôs as mãos em fundamentos alheios, senão que plantava igrejas onde ainda não se ouvira o nome do Senhor [Rm 15.20]. Portanto, os apóstolos foram enviados para que reconduzissem o mundo inteiro da alienação à verdadeira obediência de Deus; e mediante a pregação do evangelho, implantassem por toda parte o reino; ou, se preferes, para, como os primeiros construtores da Igreja, lançassem seus fundamentos em todo o mundo [1Co 3.10]. Ele chama profetas não a quaisquer intérpretes da vontade divina, mas àqueles que exceliam em singular revelação, como agora nenhum subsiste, ou são menos evidentes. Por evangelistas entendo aqueles que, embora fossem menores que os apóstolos em dignidade, entretanto mais perto estavam em seu ofício, e até às vezes se assemelhavam a eles, como, por exemplo, Lucas, Timóteo, Tito e demais como eles; e talvez também os setenta discípulos que Cristo designou em segundo lugar após os apóstolos [Lc 10.1]. Segundo esta interpretação, a qual me parece coerente tanto com as palavras quanto com a opinião de Paulo, essas três funções não foram por isso instituídas na igreja para que fossem perpétuas, mas apenas para esse tempo em que deveriam ser implantadas igrejas onde nenhuma havia antes existido, ou certamente tinham de ser transpostas de Moisés para Cristo. Embora eu não negue que depois houve também apóstolos, ou pelo menos evangelistas no lugar deles, Deus às vezes os suscitava, como ocorreu em nosso tempo. Pois por meio deles se fez necessário que reconduzissem, da defecção do Anticristo, de volta a Igreja. Contudo, ao próprio ofício chamo extraordinário, porquanto ele não tem lugar nas igrejas regularmente constituídas. Seguem-se pastores e mestres, dos quais a Igreja jamais pode prescindir, entre os quais penso haver esta distinção: que os mestres não presidem a disciplina, nem a administração dos sacramentos, nem as admoestações ou exortações, mas apenas a interpretação da Escritura, para que entre os fiéis se retenha pura e sã a doutrina. O ofício pastoral, entretanto, contém em si todas estas funções.

João Calvino