Total de visualizações de página

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

AS ORAÇÕES EXPRESSAS VERBALMENTE OU CANTADAS E AS CONDIÇÕES DE SUA ACEITABILIDADE

Além disso, daqui é mais do que claro que nem a voz, nem o canto, se intervenham na oração, têm qualquer relevância ou são do mínimo proveito diante de Deus, a não ser que procedam do profundo afeto do coracão; do contrário provocam sua ira contra nós, caso saiam apenas da ponta dos lábios e da garganta, ao mesmo tempo que isso equivale a abusar de seu sacrossanto nome e dirigir-lhe zombaria à majestade; assim como evocamos das palavras de Isaías que, ainda que se estendam mais amplamente, são pertinentes também para condenar este defeito. “Este povo”, diz Isaías, “se aproxima de mim com sua boca e me honra com seus lábios, porém seu coração está longe de mim, e me teme movido por preceito e doutrina de homens. Portanto, eis que farei entre este povo um grande e estupendo milagre, porque de seus sábios perecerá a sabedoria e dos anciãos se desvanecerá a prudência” [Is 29.13, 14; Mt 15.8, 9]. Contudo, tampouco condenamos aqui a voz ou o canto, senão que, antes, muito os recomendamos, contanto que acompanhem o afeto da alma. Ora, assim exercitam a mente na cogitação de Deus e a retêm atenta, a qual, como é escorregadia e versátil, facilmente se afrouxa e se distrai em direções variadas, a menos que seja sustentada por variados auxílios. Além disso, como em cada parte de nosso corpo, uma a uma, de certo modo deve luzir a glória de Deus, convém que especialmente a língua, que foi criada peculiarmente para declarar e proclamar o louvor de Deus, seja firmada e devotada a este ministério, quer cantando, quer falando. Entretanto, o mais importante uso da língua é nas orações públicas, que são pronunciadas na assembléia dos fiéis, mercê das quais ocorre que, com uma voz comum e como que com a mesma boca, glorifiquemos a Deus, todos juntos, a quem adoramos em um só espírito e com a mesma fé. E isto abertamente, para que todos mutuamente recebam, cada um de seu irmão, a confissão de fé, e sejam convidados e incitados a buscar seu templo.

João Calvino