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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

O CONSOLADOR SENTIDO DA CLÁUSULA “QUE ESTÁS NOS CÉUS”, NÃO INDICANDO LOCALIZAÇÃO OU LIMITAÇÃO EM DEUS, MAS REALÇANDO-LHE A MAJESTADE E SOBERANIA

Acrescenta-se que ele está nos céus. Daqui não se deve raciocinar precipitadamente que ele está limitado à circunferência do céu, como se estivesse recluso e circunscrito em um recinto reservado. Pois que também Salomão confessa que os céus dos céus não o podem conter [1Rs 8.27]. E ele mesmo, por intermédio do Profeta, diz que o céu é seu trono, mas a terra é o estrado de seus pés [Is 66.1; At 7.49]; obviamente, querendo dizer com isso que não se confina a alguma região determinada; ao contrário, ele está difundido em tudo. Contudo, visto que, dada a sua obtusidade, nossa mente não podia, de outra sorte, conceber sua inenarrável glória, ela nos foi designada pelo termo céu, do que nada mais augusto ou mais pleno de majestade nos pode vir à contemplação. Enquanto, pois, onde quer que nossos sentidos apreendem qualquer coisa, aí costumam fixá-la, Deus é posto além de todo e qualquer lugar; de sorte que, quando queremos buscá-lo, somos elevados acima de todo sentido do corpo e da alma. Então, com esta forma de expressão, ele é elevado acima de toda possibilidade de corrupção ou mudança. Finalmente, denota-se que ele abraça e sustêm todo o mundo e com seu poder o rege. Portanto, isto é exatamente como se ele fosse definido como se fosse de magnitude ou sublimidade infinita, de essência incompreensível, de poder imenso, de imortalidade eterna. Quando, porém, ouvimos isto, nosso pensamento deve elevar-nos mais alto, uma vez que está a tratar-se de Deus; tampouco o imaginemos como fosse terreno ou carnal, nem o meçamos por nossas acanhadas medidas, nem conformemos sua vontade a nossos afetos. Ao mesmo tempo, a confiança nele deve cobrar-nos ânimo, de cuja providência e poder entendemos serem governados céu e terra. A conclusão, pois, é que sob o termo Pai se nos propõe aquele Deus que em Cristo nos apareceu em sua própria imagem, para que seja invocado por uma fé inabalável; tampouco o termo familiar Pai é só para engendrar confiança, mas também vale para que as mentes sejam sustentadas, a fim de que não sejam arrastadas a deuses duvidosos ou fictícios; ao contrário, que do Filho Unigênito se elevem ao único Pai dos anjos e da Igreja. Em segundo lugar, visto que seu trono está estabelecido nos céus, se nos adverte que, já que ele governa o mundo, de forma alguma nos aproximaremos dele em vão, já que espontaneamente se apresenta e oferece a nós. O Apóstolo afirma que, “é necessário que aquele que se aproxima Deus creia que ele existe, e que é o galardoador dos que o buscam” [Hb 11.6]. Cristo, neste lugar, atribui ambas essas coisas a seu Pai, para que nossa fé se assente nele; então, que estejamos firmemente persuadidos de que nossa salvação não é negligenciada por ele, já que se digna até mesmo de estender-nos sua providência. Com rudimentos como esses, Paulo nos prepara para que oremos corretamente, pois antes que prescreva que nossas petições se façam conhecidas diante de Deus, ele prefacia a imposição nestes termos: “Seja vossa eqüidade notória a todos os homens; perto está o Senhor” [Fp 4.5, 6]. Do quê se faz claro que suas petições revolvem em sua mente, hesitante e confusamente, os que não têm isto firmemente estabelecido: “Os olhos de Deus estão sobre os justos” [Sl 34.15; 1Pe 3.12].

João Calvino