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sábado, 22 de setembro de 2018

EMBORA INTERCESSORES EM FAVOR DE OUTROS, AOS FIÉIS NÃO ASSISTE A FUNÇÃO MEDIATORIAL, VISTO SER CRISTO O ÚNICO E PERPÉTUO MEDIADOR

Com efeito, o que os sofistas tartamudeiam é pura frivolidade, a saber, que Cristo é o Mediador da redenção; os fiéis, porém são os mediadores da intercessão. Como se realmente Cristo, havendo exercido mera mediação temporal, transferisse a seus servos a mediação eterna, e que jamais haverá de desvanecer! Os que subtraem tão pouco de sua honra, de fato o tratam de forma benigna! Entretanto, a Escritura age de modo totalmente diferente, com cuja simplicidade, não levada em conta por esses impostores, o homem piedoso deve viver contente. Ora, pois, quando João diz: “Se alguém pecar, temos um advogado junto ao Pai, Cristo Jesus” [1Jo 2.1], porventura ele entende que Cristo era outrora o patrono, e não lhe atribui, antes, uma intercessão perpétua? O que Paulo quis dizer, quando afirma que Cristo, assentado à destra do Pai, também intercede por nós? [Rm 8.34]. Quando, porém, em outro lugar [1Tm 2.5] Paulo o proclama “o único Mediador entre Deus e os homens”, porventura não tem em consideração as orações, das quais fizera menção pouco antes [1Tm 2.1,2]? Ora, após haver dito que se deve interceder em favor de todos os homens, em confirmação dessa tese Paulo acrescenta logo em seguida que “há um só Deus e um só Mediador” [1Tm 2.5]. Aliás, tampouco Agostinho o interpreta de outra maneira, quando assim fala: “Os homens cristãos mutuamente se recomendam a Deus em suas orações. Mas Aquele em favor de quem ninguém intercede, pelo contrário, ele mesmo é quem intercede por todos, este é o único e verdadeiro Mediador.”280 E: “o Apóstolo Paulo, embora eminente membro sob o Cabeça, no entanto, porque era membro do corpo de Cristo e sabia que, não figurativamente, o supremo e mais verdadeiro Sacerdote da Igreja penetrara até os recessos mais recônditos do véu dos Santos dos Santos, mas, ao contrário, através de verdade expressa e sólida, entrara até os mais íntimos recessos do céu da santidade não imaginária, mas eterna, também ele próprio se recomenda às orações dos fiéis [Rm 8.30; Ef 6.19; Cl 4.3]. Tampouco se faz mediador entre o povo e Deus; pelo contrário, roga que todos os membros do corpo de Cristo orem mutuamente uns pelos outros, ‘porquanto são os membros mutuamente solícitos, e, se um membro sofre, os demais com ele sofrem’ [1Co 12.25, 26]. E assim, as orações mútuas de todos os membros ainda a labutarem na terra sobem, reciprocamente, ao Cabeça que os precedeu ao céu, em quem está a propiciação por nossos pecados [1Jo 2.2]. Ora, se Paulofosse mediador, também os demais apóstolos o seriam, em qualquer caso; e assim muitos seriam os mediadores, nem subsistiria a afirmação do próprio Paulo, quando disse: ‘Porque há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem’ [1Tm 2.5], ‘em quem também nós somos um’ [Rm 12.5], ‘se conservarmos a unidade da fé no vínculo da paz’ [Ef 4.3].” Agostinho diz, 281 igualmente, em outro lugar: “Mas, se de fato buscares um sacerdote, ele está nos céus, onde intercede por ti aquele que na terra morreu por ti.” Aliás, tampouco o sonhamos prostrado de joelhos diante do Pai, a rogar por nós como um suplicante; mas com o Apóstolo entendemos que ele de tal sorte comparece diante da face de Deus, que o poder de sua morte merece a perpétua intercessão em nosso favor[Rm 8.34]; contudo, de tal sorte que, havendo adentrado o santuário do céu, até a consumação dos séculos, só ele leva a Deus as súplicas do povo que se conserva ao longe, no átrio.

João Calvino