Além disso, alegam ser de presunção temerária arrogar para si conhecimento
indubitável da vontade divina. Certamente que isto eu lhes concederia de bom grado,
se assumíssemos tanto que na pequenez de nosso entendimento houvéssemos de
pretender encerrar o desígnio incompreensível de Deus. Quando, porém, simplesmente
dizemos com Paulo que “não recebemos o espírito deste mundo, mas o Espírito
que procede de Deus”, em virtude de cujo ensino passamos a conhecer as coisas
que nos foram dadas por Deus” [1Co 2.12], que podem eles objetar em contrário
sem injuriar obstinadamente o Espírito de Deus? Porque, se é um horrendo sacrilégio
acusar de falsidade, ou de incerteza, ou de ambigüidade a revelação, cujo autor
é Deus, que pecado cometemos nós?
Com efeito, também alegam que não há falta de grande temeridade atrevermos
gloriar-nos de tal modo do Espírito de Cristo. Quem poderia crer ser tão grande o
embotamento dos que querem ser os mestres do orbe, e que tropeçam tão vergonhosamente
nos próprios elementos rudimentares da religião? Certamente que isso me resultaria
incrível, não fosse o que atestam os escritos que a eles subsistem. Paulo pronuncia
que os filhos de Deus são exclusivamente os que se deixam guiar por seu
Espírito [Rm 8.14]; estes, porém, querem que os filhos de Deus sejam os que se deixam
guiar por seu próprio espírito, no entanto são vazios do Espírito divino. Aquele
ensina que Deus é por nós chamado Pai, designativo que é ditado pelo Espírito, que é
o único que pode dar testemunho a nosso espírito de que somos filhos de Deus [Rm
8.16]; estes, ainda que não se retraiam da invocação de Deus, contudo eliminam o
Espírito, cuja direção deveriam apropriadamente invocar. Aquele nega que sejam servos
de Cristo quantos não se deixam guiar pelo Espírito de Cristo [Rm 8.9]; estes
inventam um cristianismo que não necessita do Espírito de Cristo. Aquele não admite
nenhuma esperança de bem-aventurada ressurreição, a não ser que sintamos que o
Espírito habita em nós [Rm 8.11]; estes inventam uma esperança vazia de tal senso.
Não obstante, talvez haverão de responder que não negam a necessidade de
sermos revestidos do Espírito, contudo, que é próprio da modéstia e da humildade
não o proclamarmos. Portanto, que quer Paulo dizer, quando ordena aos coríntios
que se examinem se porventura estão na fé; que se provem se porventura têm a
Cristo; e que é réprobo todo aquele que não o reconheça como nele habitando [2Co
13.5]? “Mas”, diz João, “sabemos que ele permanece em nós pelo Espírito que nos
deu” [1Jo 3.24; cf. 4.13]. E que outra coisa fazemos senão pormos em dúvida as
promessas de Cristo, enquanto queremos ser tidos por servos de Deus sem seu Espírito,
que proclamou haver de derramar sobre todos os seus [Is 44.3; Jl 2.28]? Que
dizer, senão que fazemos agravo ao Espírito Santo, quando separamos dele a fé, a
qual é obra exclusiva dele?
Uma vez que estes são os rudimentos primários da piedade, de misérrima cegueira
é que os cristãos se deixem taxar de arrogância quando ousam gloriar-se da
presença do Espírito Santo, de gloriar-se do fato de que à parte dele o próprio Cristianismo
não subsiste. Mas, de fato, com seu exemplo, declaram quão verazmente
Cristo falou que seu Espírito é desconhecido do mundo e que é conhecido somente
daqueles em quem ele habita [Jo 14.17].
João Calvino
Escola Bíblica Conhecedores da verdade - O objetivo deste blog e levar você a conhecer a verdade que liberta de todo o Engano. Nesses últimos tempos, muito se tem ouvido falar do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, porém de maneira distorcida e muitas vezes pervertida, com heresias disfarçada etc. “ ...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” João 8.32