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quarta-feira, 15 de agosto de 2018

PROCEDÊNCIA E LEGITIMIDADE DA INSERÇÃO E ESPECIFICIDADE DO ARTIGO “DESCEU AO HADES” NO CREDO


Além disso, não convém omitir sua descida ás regiões infernais, cuja importância não é de pouco valor para a efetivação da redenção. Ora, se bem que dos escritos dos antigos este artigo que se lê no Credo parece não ter sido particularmente usado outrora nas Igrejas, contudo, em se tratando da suma da doutrina, é preciso dar-lhe o lugar necessário, visto que ele contém mistério excelente e longe de desprezar-se de matéria da máxima relevância. Há, na verdade, também alguns dentre os antigos que não o omitem, donde é lícito conjeturar que, inserido após certo decurso de tempo, tornou-se costumeiro às igrejas não de imediato, mas gradualmente. Isto, certamente, está fora de controvérsia: que ele foi tomado pelo consenso de todos os piedosos, uma vez que ninguém há dentre os patrísticos que não registre em seus escritos a descida de Cristo às regiões infernais, ainda que divergindo na interpretação. Mas, pouco importa de quem, ou em que tempo, foi ele primeiramente inserido. Antes de tudo, deve-se atentar para isto no Credo: que ele constitui, em todas as partes, a suma plena e absoluta da fé, no qual nada se deve introduzir, senão o extraído da puríssimaPalavra de Deus. Não obstante, se alguns relutam em admitir esta cláusula, por razão que logo ficará evidente, se verá de quão grande interesse é ela para a suma de nossa redenção, de tal sorte que, se for excluída, se perde muito do fruto da morte de Cristo.266 Há também, por outro lado, os que afirmam que aqui não se diz algo novo, mas apenas se repete, em outras palavras, o que fora antes dito acerca do sepultamento, uma vez que nas Escrituras amiúde se emprega o termo Inferno em lugar de sepultura. O que argumentam quanto ao sentido do termo, concedo ser verdadeiro, ou, seja: não raro se toma inferno por sepultura, porém apresentam duas razões, às quais eu sou prontamente induzido a dissentir deles. Ora, de quão grande displicência teria sido em seguida, em virtude de um conjunto mais obscuro de palavras, complicar mais do que esclarecer algo que está longe de difícil, o que já foi exposto em palavras francas e claras? Com efeito, quantas vezes duas expressões que exprimem a mesma coisa são encadeadas na mesma conexão, devendo a segunda ser uma explicação da primeira. Mas, na verdade, que tipo de explicação será esta, se quem assim fala: “que Cristo foi sepultado” quer dizer “que ele desceu às regiões infernais”? Em segundo lugar, não é provável que nesta síntese, na qual resumidamente, quanto se pode fazer no menor número de palavras, se compendiam os principais artigos da fé, pudesse infiltrar-se, sorrateira, uma repeticiosidade tãosupérflua. Nem nutro dúvida de que prontamente hajam de concordar comigo quantos tenham ponderado um pouco mais diligentemente esta questão.

João Calvino