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quinta-feira, 16 de agosto de 2018

CRISTO ADQUIRIU MÉRITO NÃO PARA SI, QUE NÃO LHE ERA NECESSÁRIO, MAS PARA NÓS, POR QUEM MORREU NA CRUZ


Indagar, entretanto, se o próprio Cristo adquiriu mérito para si mesmo, o que fazem Lombardo e os escolásticos, é não menos curiosidade estulta do que temerária delimitação, quando isso mesmo asseveram. Pois, que necessidade houve de que o Filho único de Deus descesse a fim de adquirir para si não sei o que de novo? E expondo seu desígnio, Deus dirime toda dúvida. Ora, o Pai não diz ter granjeado provento para o Filho nos méritos deste; ao contrário, que o entregou à morte, não o poupou [Rm 8.32], porque amava o mundo [Jo 3.16]. E devem-se notar as elocuções proféticas: “Um menino nos nasceu” [Is 9.6]; igualmente: “Exulta, ó filha de Sião; eis a ti vem teu Rei” [Zc 9.9]. Feneceria também, de outra sorte, aquela confirmação de seu amor que Paulo enaltece: que Cristo sofreu a morte em favor dos próprios inimigos [Rm 5.10]. Pois daí concluímos que ele não teve motivo próprio, e isso ele afirma claramente, dizendo: “Por eles me santifico a mim mesmo” [Jo 17.19]. Ora, comprova que nada adquiriu para si ao transferir para outros o fruto de sua santidade. E isto, certamente, é especialmente digno de nota: Cristo, para que devotasse a todos nós à salvação, de si mesmo se esqueceu. o exaltou e lhe deu o nome” etc. [Fp 2.9]. Ora, por que méritos pôde ele como homem conseguir que fosse Juiz do mundo, Cabeça dos anjos, e que obtivesse a suprema autoridade de Deus, e nele residisse essa majestade de que todos os poderes dos homens e dos anjos não podem atingir sequer a milésima parte? Mas, a solução é fácil e plena: Paulo não está aí discorrendo acerca da causa da exaltação de Cristo, mas apenas lhe mostrando a conseqüência, para que nos fosse por exemplo. Evidentemente, não quis dizer aqui mais do que afirma em outro lugar, a saber: “que era necessário que Cristo padecesse e assim entrasse na glória do Pai” [Lc 24.26].

João Calvino