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sábado, 14 de julho de 2018

A COMPREENSÃO HUMANA NA ÁREA DAS ARTES


Seguem-se as artes, sejam as liberais, sejam as manuais, aprendendo as quais, visto que certa aptidão nos é inata a todos, também nelas se evidencia o poder da agudeza humana. Mas, ainda que nem todos sejam aptos para aprender todas elas, todavia é marca bastante segura da energia comum o fato de que não se acha quase ninguém em quem não se evidencie proficiência em alguma arte. Nem se encontra à mão somente a energia e capacidade para aprender, mas também para inventar algo novo em cada arte, ou para aperfeiçoar e burilar o que hajas aprendido de outrem que veio antes de ti. Como issoimpeliu improcedentemente a Platão a que ensinasse que compreensão dessa natureza nada é senão recordação de viver anterior, assim, de mui excelente razão nos compele a confessar que o princípio lhe é ingênito no entendimento humano. Logo, estas evidências atestam claramente que por natureza é instilada nos homens a compreensão universal da razão e da inteligência. Todavia, este bem é tão universal que cada um deve reconhecer nele a peculiar graça de Deus a seu favor. A esse reconhecimento o próprio Criador de nossa natureza amplamente nos desperta enquanto cria os imbecis, nos quais põe à mostra de que dotes a alma do homem excele quando não inundada de sua luz, luz que em todos, tão natural subsiste, que a cada um é dádiva inteiramente graciosa de sua beneficência. Com efeito, a invenção ou o ensino sistemático das próprias artes, ou seu conhecimento mais íntimo e mais eminente, que é próprio de poucos, por certo que não é sólida prova da perspicácia universal. Contudo, porque atinge indistintamente a piedosos e a ímpios, com razão se conta entre os dons naturais.

João Calvino