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segunda-feira, 23 de julho de 2018

O ALCANCE DO MANDAMENTO À LUZ DE SEU PROPÓSITO


O que agora se aborda um tanto obscuramente far-se-á absolutamente claro pela própria reflexão, à medida que se for expondo os mandamentos. Por isso, basta haver assim abordado esta matéria, exceto que o último ponto, que de outra sorte não se entenderia, ou, entendido, talvez de início pudesse parecer absurdo, deverá ser confirmado sucintamente mediante prova específica. Isto não tem necessidade de prova: quando se ordena o bem, proíbe-se o mal que com ele conflita, pois ninguém há que não o conceda. Ordenarem-se também as disposições contrárias, quando se proíbem ações más, admitirá não muito relutantemente a opinião geral. É lugar comumque, de fato, se recomendam as virtudes, quando se condenam os vícios contrários. Nós, porém, postulamos algo mais do que estas expressões significam ordinariamente. Pois, pela virtude contrária ao vício significam os homens, na maioria das vezes, a mera abstenção do vício correspondente. Nós dizemos que ela vai além, a saber, às disposições e atos opostos. E desse modo, neste mandamento, “Não matarás” [Ex 20.13; Dt 5.17], o senso comum dos homens nada mais vislumbrará que se deve abster de todo malefício e do desejo de fazer o mal. Eu afirmo que, além disso, nele se contém que conservemos a vida do próximo com os recursos com que pudermos. E para que não fale sem razão, assim o confirmo: Deus proíbe que se fira ou se faça violência a um irmão injustamente, porque ele quer que sua vida nos seja cara e preciosa. Portanto, requer, ao mesmo tempo, aquelas efusões de amor que podem ser conferidas à sua preservação. E assim vemos como o propósito do mandamento sempre nos desvenda tudo quanto nele ou se nos ordena, ou se nos proíbe fazer.

João Calvino