Depois que se mostra ser aquele que
tem o direito de ditar ordens, a quem se deve obediência, para que não pareça
compelir tão-só pela necessidade, atrai também pela doçura, pronunciando ser o
Deus da Igreja. Pois subjaz à expressão uma relação mútua, que se contém na
promessa: “Ser-lhes-ei por Deus, eles me serão por povo” [Jr 31.33]. Donde
Cristo comprova a imortalidade de Abraão, Isaque e Jacó, ou, seja: que o Senhor
se tem atestado ser o Deus deles [Mt 22.32]. Portanto, é exatamente como se
falasse assim: “Eu vos escolhi para mim por povo, a quem houvesse de beneficiar
não apenas na presente vida, mas ainda houvesse de prodigalizar a
bem-aventurança da vida futura.” A que fim, porém, isto contemple, assinala-se
em vários lugares na lei. Ora, como o Senhor nos tem por dignos desta
misericórdia, que nos associe em consórcio a seu povo, “escolhe-nos”, diz
Moisés, “para que lhe sejamos por um povo especial, por um povo santo, e lhe
guardemos os mandamentos” [Dt 7.6; 14.2; 26.18, 19]. Donde essa exortação:
“Sede santos, porque eu sou santo” [Lv 11.44; 19.2]. Ademais, destas duas
preceituações se deriva essa exclamação que está no Profeta: “O filho honra ao pai
e o servo honra ao senhor. Se eu sou Senhor, onde está o temor? Se eu sou Pai,
onde está o amor?” [Ml 1.6].
João
Calvino