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quarta-feira, 18 de julho de 2018

FUNÇÃO E EFICÁCIA DAS EXORTAÇÕES AO RÉPROBO E AO JUSTO


Ora, a que fim servem as exortações? É certo que, se pelos ímpios são desdenhadas, movidos por coração obstinado, se lhes tornarão em testemunho quando acontecer de virem diante do tribunal do Senhor; além de quê, já agora mesmo lhes fustigam e ferem a consciência, porquanto, por mais que as escarneça o mais insolente de todos, não obstante não as pode condenar. O que, porém, haverá de fazer um mísero homenzinho, dirás, quando lhe é negada a maleabilidade de coração, que era necessária para a obediência? Pois bem, que subterfúgio invoca, visto que não pode imputar a dureza do coração a ninguém, senão a si próprio? Conseqüentemente, os ímpios, preparados para de bom grado ridicularizá-las, se houver ocasião, são encolhidos por seu poder, queiram ou não. Sua principal utilidade, porém, deve considerar-se em relação aos fiéis, em quem, uma vez que o Senhor tudo faz mediante seu Espírito, assim não negligencia o instrumento de sua Palavra e neles dele faz uso não sem eficiência. Portanto, firme se eleve o que é verdadeiro, a saber: toda a força dos piedosos repousa na graça de Deus, segundo esse dito do Profeta: “E lhes darei um coração novo para que nele andem” [Ez 11.19, 20]. Objetarás, no entanto: “Por que os piedosos são agora admoestados de seu dever e não antes deixados à direção do Espírito?” “Por que são espicaçados de exortações, quando não podem ser açodados mais do que os impele a impulsão do Espírito?” “Por que são castigados quando são desviados do caminho, uma vez que têm caído em virtude da necessária fraqueza da carne?” Ó homem, quem és tu que imponhas lei a Deus? Se para receber esta própria graça mercê da qual se deve obedecer à exortação, ele nos quer preparar mediante exortação, que tens tu que murmures ou improperes em referência a esta dispensa- ção? Se em relação aos piedosos de nenhum outro proveito fossem exortações e repreensões, senão para que os convencessem de pecado, por isso mesmo sua imputação não deveria ser de todo inútil. Ora, operando o Espírito interiormente, elas valem muitíssimo para inflamar o desejo do bem, para sacudir a indiferença, para alijar a volúpia da iniqüidade e seu envenenado dulçor; até mesmo em contrário, para gerar-lhes ódio e tédio, quem ousa acusá-las de supérfluas? Se alguém deseja resposta mais clara, assim a terá: Deus opera em seus eleitos de duas maneiras: interiormente, através do Espírito; exteriormente, mediante a Palavra. Pelo Espírito, iluminando-lhes a mente e plasmando o coração ao amor e ao cultivo da retidão, os faz novas criaturas. Pela Palavra, despertando-os para que desejem, busquem, alcancem essa mesma renovação. Em ambos – o Espírito e a Palavra – eleevidencia a operação de sua mão, segundo a maneira de sua dispensação. A mesma Palavra, quando a dirige aos réprobos, se bem que não para sua correção, contudo a outro uso a faz valer: para que não só, no presente, sejam premidos pelo testemunho da consciência, mas ainda mais inescusáveis se tornem no dia do Juízo. Assim Cristo, embora declare que ninguém vem a ele, a não ser aquele a quem o Pai trouxer, e que os eleitos vêm depois que tiverem ouvido e aprendido do Pai [Jo 6.44, 45], contudo ele próprio não negligencia o ofício docente; pelo contrário, empenhadamente convida, com sua própria voz, àqueles que, por necessidade, devam ser interiormente ensinados pelo Espírito Santo, para que façam algum progresso. Paulo assinala que o ensino ministrado aos réprobos não é ocioso, visto que lhes é odor de morte para morte [2Co 2.16], embora para Deus seja suave fragrância [2Co 2.15].

João Calvino