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quarta-feira, 18 de julho de 2018

COMO DEUS OPERA NO CORAÇÃO DOS HOMENS

A VONTADE HUMANA É CATIVA DO PECADO, ESCRAVIZADA AO DIABO

Foi suficientemente provado, salvo se me engano, que o homem é de tal forma mantido cativo pelo jugo do pecado, que de sua própria natureza não pode desejar o bem, nem aspirá-lo, nem esforçar-se por ele. Ademais, estabeleceu-se uma distinção entre compulsão e necessidade, donde se fizesse claro que, enquanto peca por necessidade, contudo em nada peca ele menos por vontade. Uma vez que, porém, enquanto é o homem entregue à servidão do Diabo, parece ser mais movido pelo arbítrio deste que por seu próprio, resta que se deve determinar qual seja o gênero de ação de um e do outro, isto é, do homem e do Diabo. Então, deve resolver-se a questão, se algo deva ser atribuído a Deus nas obras más em que a Escritura dá a entender que de alguma forma ele opera nelas. Em algum lugar, Agostinho compara a vontade humana a um corcel a aguardar o mando do cavaleiro; ele compara aos que o cavalgam a Deus ou ao Diabo. “Se Deus o monta”, diz ele, “tal qual moderado e perito ginete, com arte a dirige, a lerdeza acicata, a excessiva rapidez contém, o ardor e a fogosidade refreia, a obstinação reprime, pelo reto caminho conduz. Se, porém, dela se apossou o Diabo, como um cavaleiro estouvado e petulante, por extensões não trilhadas a arrebata, a valados impele, por despenhadeiros precipita, à insujeição e à altivez aguilhoa.” Por ora estaremos satisfeitos com esta comparação, já que não ocorre melhor. Portanto, que se diz estar a vontade do homem natural sujeita ao jugo do Diabo, tanto que daí é acionada, não significa que ela seja constrangida à obediência, relutante e renitente, como, por direito de senhorio, obrigamos a escravos indispostos a obedecerem a nossas ordens; pelo contrário, fascinada pelas artimanhas de Satanás, mostra-se-lhe necessariamente obediente a todo ditame. Ora, aqueles a quem o Senhor não faz dignos da direção de seu Espírito, por justo juízo os relega à ação de Satanás. Razão por que o Apóstolo diz [2Co 4.4] que o deus deste mundo cegou a mente dos incrédulos, destinados à perdição, para que não discirnam a luz do evangelho. E, em outro lugar [Ef 2.2], diz que ele opera nos filhos contumazes. O cegamento dos ímpios e quantas abominações daí se seguem são rotulados de obras de Satanás, cuja causa, no entanto, não se deve buscar fora da vontade humana, da qual brota a raiz do mal e na qual repousa o fundamento do reino de Satanás, isto é, o pecado.

João Calvino