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segunda-feira, 30 de julho de 2018

VISITAR DEUS A INIQÜIDADE DOS PAIS NOS FILHOS NÃO EQUIVALE A VIOLAÇÃO DE SUA JUSTIÇA


Verifiquemos, em primeiro lugar, se vingança como essa não se coaduna com a justiça divina. Se a natureza inteira de homens a quem o Senhor não faz dignos da comunicação de sua graça é condenável, a esses sabemos estar preparada a perdição, contudo perecem por sua própria iniqüidade, não por ódio iníquo de Deus. Nem lhes é deixada qualquer desculpa por que à salvação não são ajudados pela graça de Deus a exemplo de outros. Portanto, uma vez que esta punição é aplicada aos ímpios e depravados em vista de suas abominações, assim que suas casas sejam privadas da graça de Deus por muitas gerações, quem haja de intentar incriminação a Deus por causa desta justíssima represália? Mas, sentencia o Senhor, em contraposição, que a pena do pecado paterno não haverá de passar-se ao filho [Ez 18.20]. Observa o de que aqui se trata: os israelitas, como fossem, por longo tempo e persistentemente, acometidos de muitas calamidades, começaram a reiterar o provérbio de que seus pais haviam comido uva verde, embotando assim os dentes dos filhos [Ez 18.2], querendo dizer com isso que, uma vez que seus pais tinham cometido os pecados cujas punições eles, de outra sorte justos e inculpados, tinham de sofrer, mais pela implacável ira de Deus do que por sua moderada severidade. O Profeta, porém, lhes proclama não ser assim, já que são castigados em virtude de suas próprias transgressões, nem se coaduna com a justiça de Deus que um filho justo sofra penalidade em função da maldade de um pai depravado, o que nem se contém no presente dispositivo do mandamento em consideração. Ora, se a visitação acerca da qual aqui se discute se consuma quando o Senhor detrai da família dos ímpios a graça, a luz de sua verdade e os demais recursos que assistem à salvação, nisto mesmo, que dele cegados e abandonados seguem os filhos nas pegadas dos pais, estão a sofrer as maldições divinas em virtude dos delitos paternos. Que, porém, são sujeitos não só às misérias temporais, mas ainda, por fim, à perdição eterna, são por isso punidos pelo justo juízo de Deus, não em razão de pecados alheios, mas em conseqüência da iniqüidade pessoal.

João Calvino