É preciso considerar,
em primeiro lugar, o que é um juramento. De fato, é a invocação de Deus por
testemunha para confirmar-se a veracidade de nossa palavra. Entretanto, as
imprecações que contêm manifestos insultos a Deus são indignas de que sejam
contadas entre os juramentos. Patenteia-se em muitas passagens da Escritura que
invocação desta natureza, quando devidamente articulada, é uma expressão de
culto divino, como quando Isaías vaticina que os assírios e os egípcios
haveriam de ser convocados para uma relação pactual com Israel. “Falarão”, diz
ele, “a língua de Canaã e jurarão no nome do Senhor” [Is 19.18], isto é, ao
jurarem pelo nome do Senhor, estarão proferindo uma confissão de sua religião.
De igual modo, quando fala acerca de estender-se-lhe o reino: “Quem quer que a
si se abençoar, se abençoará no Deus dos fiéis; e quem jurar na terra, jurará
pelo Deus verdadeiro” [Is 65.16]. Assim, Jeremias: “Se os entendidos”, diz ele,
“ensinarem o povo a jurar por meu nome, assim como ensinaram a jurar por Baal,
serão edificados no meio de minha casa” [Jr 12.16]. E, com invocarmos o nome do
Senhor em testemunho, diz-se, com razão, que estamos atestando nosso
reconhecimento de sua divina soberania. Pois, dessa forma, o confessamos ser a
eterna e imutável verdade, a quem invocamos não só como a testemunha idônea da
verdade acima das demais, mas ainda como seu enunciador único, que pode trazer
à luz as coisas escondidas e, ademais, como o conhecedor dos corações. Pois
onde falecem os testemunhos dos homens, retrocedemos a Deus como nossa
testemunha, especialmente quandose tem de asseverar o que jaz oculto na
consciência. Por essa razão, inflama-se acerbamente o Senhor para com aqueles
que juram por deuses estranhos e interpreta esse gênero de juramento como prova
de manifesta defecção: “Teus filhos me abandonaram e juram por aqueles que não
são deuses” [Jr 5.7]. E a gravidade deste delito declara-a pela ameaça das
penas: “Exterminarei aqueles que juram pelo nome do Senhor e juram por Milcom”
[Sf 1.5].
João Calvino