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domingo, 22 de julho de 2018

O ALVO REAL DAS PROMESSAS E AMEAÇAS ABUNDANTES NA LEI


Mas, o Senhor não se contenta com haver granjeado reverência para com sua justiça. Para que também nos imbuísse o coração com o amor dessa justiça, ao mesmo tempo também com o ódio da iniqüidade, acrescentou promessas e ameaças. Porque, pois, o olho de nossa mente está demasiadamente enuviado para que seja afetado tão-só pela formosura do bem, o Pai clementíssimo, por sua bondade, nos quis atrair pela doçura das recompensas a amá-lo e buscá-lo. Portanto, declara ele que as virtudes têm nele recompensas, nem haverá de laborar em vão aquele que lhe tenha obedecido aos mandamentos. Proclama, por outro lado, que a injustiça não só lhe é execrável, mas ainda que não haverá de escapar impunemente, porquanto ele próprio haverá de ser o vingador de sua majestade ultrajada. E, para que de todos os modos ao mesmo tempo nos exortem, promete ele tanto as bênçãos da presente vida, quanto a bem-aventurança eterna, à obediência daqueles que tiverem observado os mandamentos; aos transgressores, porém, ameaça não menos com calamidades atuais do que com o suplício da morte eterna. Pois esta promessa: “Aquele que praticar estas coisas viverá por elas” [Lv 18.5]; e, de igual modo, a ameaça correspondente: “A alma que pecar, essa morrerá” [Ez 18.4, 20], sem nenhuma dúvida, quer atentem para a imortalidade, quer para a morte futura e que jamais haverá de findar-se. Todavia, onde quer que se mencione a benevolência ou a ira de Deus, sob aquela se contém a eternidade de vida; sob esta, a perdição eterna.
Mas, das bênçãos e maldições atuais, na lei se enumera longo catálogo [Lv 26.3-39; Dt 28]. E nas penalidades atesta-se, de fato, a suprema pureza de Deus, que não pode tolerar a iniqüidade; nas promessas, porém, além do supremo amor para com a justiça, que não se permite defraudar do devido galardão, atesta-se-lhe também a admirável benignidade. Pois, uma vez que, com tudo o que nos pertence, à majestade lhe somos insolventemente endividados, com ainda mais direito exige ele como dívida tudo quanto requer de nós. Mas, o pagamento de uma dívida não faz jus a recompensa. Logo, Deus se afasta de seu direito quando oferece recompensas por nossos atos de obediência, os quais não se exibem espontaneamente, como se não devidos. Quanto ao proveito que podemos tirar das próprias promessas, já foi exposto em parte, e se verá com mais clareza no devido lugar. Bastante é no presente, se sustentamos e refletimos que nas promessas da lei não há vulgar recomendação da justiça, para que se faça mais evidente quão grandemente agrada a Deus sua observância, e que as penalidades já foram estabelecidas para maior execração da injustiça, para que o pecador, seduzido pelos afagos dos vícios, não esqueça o juízo do Legislador que lhe está preparado.

João Calvino