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domingo, 12 de agosto de 2018

ESSAS DIFERENÇAS DOS TESTAMENTOS LONGE ESTÃO DE IMPLICAR INCONSTÂNCIA OU MUTABILIDADE EM DEUS

Nestes quatro ou cinco tópicos penso que foi bem e fielmente exposta, quanto basta a uma singela maneira de ensinar, toda a diferença de Antigo e Novo Testamentos. Contudo, porque alguns alegam como grande absurdo esta variação no governar a Igreja, a maneira diversa no ensinar, tão grande mudança de ritos e cerimônias, também a estes importa responder antes que passemos a outras considerações. Mas isso se pode fazer sucintamente, porquanto as objeções não são tão sólidas que seja necessária laboriosa refutação. Não é consentâneo, dizem eles, que Deus, que é consigo perpetuamente consistente, haja sofrido tão grande mudança que desaprovasse depois o que uma vez ordenara e recomendara. Respondo que não se deva julgar que Deus seja mutável, visto que, segundo sabia ser apropriado a cada uma, acomodou diferentes fórmulas a eras diferentes. Se um lavrador prescreve a sua família umas tarefas no inverno, outras no verão, não o argüiremos, por isso, de inconstância ou o julgaremos desviar-se da reta norma da agricultura, que se conformou à ordem perpétua da natureza. De igual modo, se um pai de família instrui, governa, trata a seus filhos de uma forma na infância, de outra na adolescência, de outra na juventude, não diremos, por isso, ser ele leviano ou descambar de sua opinião. Portanto, por que lançamos a Deus o estigma de inconstância pelo fato de que, mediante marcas apropriadas e congruentes, tenha ele distinguido a diversidade dos tempos?
A segunda dessas ilustrações deve satisfazer-nos inteiramente. Paulo compara os judeus a crianças, os cristãos a jovens [Gl 4.1-7]. Que há fora de ordem neste regime de Deus, que os confinou a rudimentos que com eles se coadunavam, segundo o nível de sua idade, e a nós nos instruiu através de uma disciplina mais firme e, dir-se-ia, mais viril? Portanto, nisto refulge a constância de Deus: que em todos os séculos tem ensinado a mesma doutrina e o mesmo culto de seu nome que preceituou desde o início persiste em requerê-lo. Que mudou a forma externa e o modo, nisto Deus não se mostra sujeito a mudança. Pelo contrário, apenas acomodou-se à capacidade dos homens, que é variável e mutável.

João Calvino