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quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A DESDITOSA CONDIÇÃO FUTURA DOS RÉPROBOS EM TORMENTOS, SEPARADOS DE DEUS

Com efeito, visto que nenhuma descrição pode expressar adequadamente a gravidade da vingança divina contra os réprobos, seus tormentos e torturas nos são apresentados figuradamente, mediante coisas corpóreas, isto é, por meio de trevas, choro e ranger de dentes, fogo inextinguível, verme a corroer sem fim o coração [Mt 3.12; 8.12; 22.13; Mc 9.43; Is 66.24]. Ora, mercê de tais modos de falar, é certo que o Espírito Santo quis conturbar de horror todos nossos sentidos, como quando se diz “está preparada desde a eternidade uma pira profunda de fogo nutrida com muita lenha, cuja chama por baixo a sustenta o sopro do Senhor como uma torrente de enxofre” [Is 30.33]. Como nos importa ser assistidos por essas figuras para, em certa medida, concebermos a mísera sorte dos ímpios, assim se nos impõe fixar nisso especialmente o pensamento: quão calamitoso é viver alienado de toda associação com Deus; não só isso, mas sentir de tal forma adversa a majestade de Deus, que não se pode escapar ser por ela acossado. Ora, em primeiro lugar, sua indignação é como que um fogo violentíssimo, a cujo toque tudo é devorado e consumido; em segundo lugar, todas as criaturas de tal modo lhe servem para executar seu juízo, que aqueles a quem o Senhor assim fará manifesta sua ira haverão de sentir o céu, a terra, o mar, os animais e tudo quanto há como que inflamados de terrível indignação contra si e armados para sua destruição. Portanto, o Apóstolo não pronunciou algo vulgar quando diz que os infiéis “haverão de sofrer eternas penas de morte, afastados da face do Senhor e da glória de seu poder” [2Ts 1.9]. E quantas vezes, mediante representações materiais, os profetas incutem temor, embora não apresentem nada hiperbólico, consoante nossa lerdeza de entendimento, entretanto ingerem prenúncios do juízo futuro no sol, na lua e todo o edifício do mundo [Mt 24.29]. Conseqüentemente, nenhum descanso acham as infelizes consciências, a que não sejam acometidas e destroçadas de terrível torvelinho, a que não sintam que estão sendo desmanteladas por um Deus irado e, trespassadas, são lancinadas de mortíferos aguilhões, a que não tremam espavoridos ante o raio de Deus e não sejam esmagados pelo peso de sua mão, de sorte que é mais leve descer a abismos e voragens, quaisquer que sejam, que permanecer nesses terrores por um momento. De que natureza e quão grande é isto: ser por ele apertado de bloqueio eterno e que não haverá de cessar em nenhuma parte! Quanto a esta matéria, o Salmo 90 contém memorável afirmação: embora Deus, com um só olhar, consuma a todos os mortais, e a nada os reduza, a seus adoradores, entretanto, quanto mais timoratos são neste mundo, os impulsiona, de sorte que, sobrecarregados pela cruz, os incita a prosseguir avante, até que ele pessoalmente seja “tudo em todas as coisas” [1Co 15.28].

João Calvino