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quinta-feira, 25 de outubro de 2018

DOS MESTRES E MINISTROS DA IGREJA SUA ELEIÇÃO E OFÍCIO

 DEUS CONFIOU AO MINISTÉRIO DOS HOMENS O GOVERNO DE SUA IGREJA, EXPRESSÃO DA CONSIDERAÇÃO EM QUE OS TEM, INSTRUMENTO CONVENIENTE PARA INFUNDIR HUMILDADE E MEIO PARA FOMENTAR O AMOR E A UNIDADE ENTRE OS FIÉIS

Agora nos cabe falar da ordem mediante a qual o Senhor quis que sua Igreja fosse governada. Pois ainda que importe que exclusivamente reja e reine na Igreja, ele também preside nela ou exerce eminência sobre ela, e é indispensável que este império seja exercido e administrado somente por meio de sua Palavra. No entanto, visto que ele não habita entre nós em presença visível, de sorte que não nos declara sua vontade pessoalmente, por sua boca, dissemos que nisso se aplica o ministério dos homens e como que uma obra vicária, não lhes transferindo seu direito e honra, mas somente para que, pela boca deles, ele mesmo execute sua obra da mesma forma que também o artífice usa de um instrumento para fazer seu trabalho. Vejo-me na obrigação de reiterar novamente coisas que já expus previamente. Certamente que ele poderia fazer isso ou por si mesmo, sem qualquer outro auxílio ou instrumento, ou até por meio de anjos. Entretanto, muitas são as causas por que ele prefere fazê-lo por meio dos homens. Ora, deste modo declara, em primeiro lugar, sua consideração para conosco, quando dentre os homens toma aqueles que a seu favor desempenhem embaixada no mundo [2Co 5.20], que sejam seus intérpretes da vontade secreta; enfim, que representem sua pessoa. E assim, com evidência, comprova não ser vão que, de quando em quando, nos chame templos seus [1Co 3.16, 17; 6.19; 2Co 6.16], enquanto da boca dos homens, como se fosse do santuário, dá aos homens suas respostas. Em segundo lugar, este é um ótimo e ultilíssimo exercício à humanidade, enquanto nos acostuma a obedecer à sua Palavra, conquanto ela é pregada através de homens semelhantes a nós, por vezes até inferiores em dignidade. Se ele falasse pessoalmente do céu, não haveria de se maravilhar, sem tardança seus sacros oráculos seriam recebidos reverentemente pelos ouvidos e ânimos. Pois, quem não se apavoraria de seu manifesto poder? Quem não se sentiria aturdido com aquele imenso fulgor? Quando, porém, um homenzinho qualquer surgido do pó fala em nome de Deus, aqui, de mui excelente testemunho declaramos nossa piedade e deferência para com o próprio Deus, se nos exibimos dóceis a seu ministro, quando, no entanto, em coisa alguma este nos exceda. Portanto, também por esta causa o tesouro de sua sabedoria celestial está oculto em vasos frágeis e de barro [2Co 4.7], para que assuma mais segura comprovação de quão grande é nosso apreço por ele. Em terceiro lugar, nada era mais apropriado para fomentar mútuo amor do que os homens serem ligados entre si por este vínculo, enquanto um é constituído pastor para que, a um tempo, ensine aos demais, os que se ordenam discípulos recebem a doutrina comum de uma só boca. Ora, se cada um se bastasse a si mesmo, nem tivesse necessidade da ajuda de outrem, qual é a soberba do engenho humano, cada um desprezaria aos outros e seria por eles desprezado. Portanto, aquele que o Senhor previu haver de ser o mais firme nó para reter sua unidade, com esse apertou sua Igreja, enquanto ministrou aos homens a doutrina da salvação e da vida eterna, para que pelas mãos desses a comunicasse aos demais. A isto visava Paulo quando escrevia aos Efésios: “Um só corpo, um só Espírito, assim como também fostes chamados em uma só esperança de vossa vocação. Um só Senhor, uma só fé, um só batismo. Um só Deus e Pai de todos, que é sobre todas as coisas, e através de todas as coisas, e em todos nós. A cada um de nós, porém, foi dada graça segundo a medida do dom de Cristo. Pelo que diz: Quando subiu ao alto levou cativo o cativeiro e deu dons aos homens. O que desceu é aquele mesmo que subiu, para que preenchesse a todas as coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, outros para profetas, porém outros para evangelistas, outros para pastores e mestres, para a renovação dos santos, para a obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da idade plenamente adulta, para que não mais sejamos meninos que são levados em volta por todo vento de doutrina; pelo contrário, buscando a verdade em amor, cresçamos em tudo àquele que é a Cabeça, isto é, a Cristo, em quem todo o corpo, encaixado e compactado através de toda juntura de sua dispensação, conforme a ação na medida de cada parte, promove o crescimento do corpo para a edificação de si próprio através do amor” [Ef 4.4-16].

João Calvino