Total de visualizações de página

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

A RESSURREIÇÃO DE NOSSO CORPO É OBRA DA ONIPOTÊNCIA DE DEUS, COMO O AFIRMA A ESCRITURA, A QUAL NOS INCITA À ESPERANÇA E AO DELEITE ETERNOS

O que dissemos, que para estarmos seguros da ressurreição temos que aplicar os sentidos para o imenso poder de Deus, isso, sucintamente, o ensina Paulo. “Para ser conforme”, diz ele, “seu corpo glorioso, segundo seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas” [Fp 3.21]. Portanto, não há nada menos consentâneo do que visualizar aqui algo que se possa processar por força da própria natureza, quando se nos impõe milagre inestimável, que por sua magnitude os sentidos nos absorve. Paulo, no entanto, propondo uma prova da própria natureza, assim refuta a estultícia daqueles que negam a ressurreição. “Ó estulto”, diz ele, “o que semeias não medra, a menos que primeiro morra” etc. [1Co 15.36]. Ele diz que na semeadura se visualiza uma imagem da ressurreição, porquanto a messe nasce da putrefação. E nem seria tão difícil de crer, se prestássemos atenção como deveríamos a tantos milagres como se oferecem a nossos olhos em todas as partes do mundo.384 Lembremo-nos, por outro lado, que ninguém é realmente persuadido da ressurreição futura, a não ser aquele que, arrebatado pela admiração, dá sua glória ao poder de Deus. Transportado por esta confiança, Isaías exclama: “Teus mortos viverão; meu cadáver ressurgirá; despertai e louvai, ó moradores do pó” [Is 26.19]. Nas circunstâncias desesperadoras, eleva-sea Deus, o Autor da vida, com quem estão as saídas da morte, como se diz no Salmo [68.20]. Também Jó, mais parecendo a um cadáverque a um ser humano, confiado no poder de Deus, não duvida de que naquele dia se haverá de elevar na plenitude de seu ser: “Sei que meu Redentor vive, e que por fim se levantará sobre a terra [isto é, para aí exibir seu poder]. E depois de consumida minha pele, contudo ainda em minha carne verei a Deus. Vê-lo-ei, por mim mesmo, e meus olho, não outros, o contemplarão” [Jó 19.25-27]. Ora, visto que certos indivíduos torcem, mais sutilmente, estas passagens, como se não devessem ser expostas em referência à ressurreição, no entanto, confirmam o que desejam inverter, porquanto em seus males, os santos buscam conforto, não de outra fonte, mas da similitude da ressurreição, o que se vê melhor à luz da passagem de Ezequiel. Ora, como os judeus rejeitassem a promessa de seu regresso, e objetassem que em nada mais provável era que um caminho lhes fosse aberto do que os mortos saírem do sepulcro, ao Profeta se oferece a visão de um campo repleto de ossos secos: Deus ordena que eles recebam carne e nervos[Ez 37.1-10]. Posto que, sob essa figura, Deus eleva o povo à esperança do regresso, contudo, ele toma da ressurreição a base da espera, assim como ela nos é o modelo primordial de todos os  livramentos que os fiéis experimentam neste mundo. Assim Cristo, depois de ensinar que a voz do evangelho é vivificante, visto que os judeus não o recebiam, em seguida adiciona: “Não vos admireis disto, porque vem a hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a voz do Filho de Deus e deles sairão” [Jo 5.28]. Portanto, a exemplo de Paulo, em meio às lutas, cantemos já o triunfo alegremente, porque Aquele que nos prometeu a vida futura é poderoso para guardar nosso depósito [2Tm 1.12], e assim nos gloriemos de que nos foi reservada a coroa da justiça que o justo Juiz nos haverá de conferir [2Tm 4.8]. Assim sucederá que, quantas misérias e aflições padeçamos nos servirão como porta da vida futura. Porque está bem conforme à natureza de Deusretribuir com aflição aos ímpios que nos afligem; a nós, porém, que somos injustamente afligidos, descanso na manifestação de Cristo com os anjos de seu poder, em chama de fogo [2Ts 1.6, 7]. Mas, cabe-nos frisar o que pouco depois acrescenta, a saber, que virá “para que seja glorificado em seus santos e seja cercado de admiração em todos os que crerem”, porque da parte deles houve fé no evangelho [2Ts 1.10].

João Calvino