A condição dos diáconos, então, não foi outra além daquela dos dias dos apóstolos.
Pois recebiam dos fiéis as ofertas diárias e os proventos anuais da Igreja, para
que os aplicassem a seus verdadeiros usos, isto é, os distribuíssem para alimentar
em parte os ministros, em parte os pobres; contudo, sob o arbítrio do bispo, a quem,
ademais, prestavam anualmente contas de sua economia. Ora, que por toda parte os
cânones fazem o bispo o administrador de todos os bens da igreja, não se deve assim
entender como se ele próprio houvesse de desempenhar pessoalmente essa obrigação;
antes, que sua atribuição era prescrever a um diácono quem deveria ser recebido
à pensão pública da igreja e a quem, e quanto, devesse ser fornecido a cada um
daquilo que era restante, e que tinha a inspeção de ver se este executaria fielmente o
que seria de seu ofício. Pois assim se lê nos cânones que atribuem aos apóstolos:
“Preceituamos que o bispo tenha em seu poder as coisas da Igreja. Ora, se lhe foram
confiadas as almas dos homens, mais preciosas, muito mais cabível é que exerça ele
o cuidado dos fundos, para que, de seu poder, todas as coisas sejam dispensadas aos
pobres por intermédio dos presbíteros e diáconos, de modo que se ministre com
temor e toda solicitude.” E no Concílio de Antioquia foi decretado que fossem freados
os bispos que tratavam das coisas da Igreja sem o conhecimento dos presbíteros
e dos diáconos. Mas, não há por que discutir-se mais longamente acerca disto,
quando se manifesta de numerosas epístolas de Gregório que também nesse tempo,
quando, de outra sorte, as ordenanças eclesiásticas haviam sido muito deturpadas,
no entanto esta observância havia perdurado: que os diáconos, debaixo da autoridade
do bispo, fossem os ecônomos dos pobres.
É verossímil que, de início, aos diáconos fossem atribuídos subdiáconos, para
que do serviço deles se utilizassem em relação aos pobres; mas essa distinção foi
aos poucos obliterada. Contudo, começaram a criar-se então arcediago, quando a
abundância de recursos exigiria nova e mais exata maneira de administrar, se bem que Jerônimo registra que eles já existiam em sua época. Mas, nas mãos destes
estava a soma das rendas, das posses, das alfaias e o encargo das ofertas diárias. Daí
Gregório declarar que o arcediago de Salona incorreria em culpa se algo dos bens
da Igreja se perdesse, quer por negligência, quer por fraudulência dele.
Mas o fato de que se lhes havia confiado a leitura do evangelho ao povo e a
exortação a orar, que igualmente eram incumbidos de estender o cálice na santa
ceia, isto acontecia no propósito de adornar o ofício, para que o executassem com
reverência maior, quando fossem advertidos de tais apanágios de que, o que estivessem
a desempenhar, não era alguma gerenciação profana, mas antes uma função
espiritual e devotada a Deus.
João Calvino