Portanto, isto obtemos pelo benefício da oração: que penetremos até essas riquezas
que nos foram reservadas junto ao Pai celeste. Pois a oração é uma determinada
comunicação dos homens com Deus, mercê da qual, havendo adentrado o santuário
do céu, na própria presença com ele, eles instam acerca de suas promessas, para que,
onde a necessidade assim o requer, experimentem não haver sido vão o que creram,
acenando ele apenas com a Palavra. Vemos, pois, que Deus não nos propõe coisa
alguma a esperar dele, sem que por sua vez nos mande que as peçamos por meio da
oração; tão verdadeiro é que temos dito, que com a oração encontramos e desenterramos
os tesouros que se mostram e descobrem nossa fé por meio do evangelho. Mas, quão necessária, e de quantos modos, seja útil o exercício da oração não há
como explicar suficientemente pelo uso de palavras. Realmente, não sem causa é
que o Pai celeste atesta que a única cidadela da salvação está na invocação de seu
nome, através da qual de fato evocamos a presença não só de sua providência, mediante
a qual está vigilante em cuidar de nossos interesses, mas também de seu
poder, mediante o qual nos sustenta, fracos e quase a desfalecer, e de sua bondade,
mediante a qual nos receba à graça, a nós miseramente sobrecarregados de pecados,
pela qual, enfim, conseguimos que ele todo se exiba presente em nós. Daqui nos
nasce extraordinária paz e tranqüilidade de consciência, porque havendo exposto ao
Senhor a necessidade que nos angustiava, descansamos plenamente nele, sabendo
que conhece muito bem todas as misérias Aquele de quem estamos seguros que nos
ama e que pode suprir absolutamente todas as nossas necessidades.
João Calvino