Portanto, não pensemos que o Espírito Santo, com promessa desta natureza,
esteja enaltecendo a dignidade de nossas obras, como se elas merecessem tal recompensa.
Pois a Escritura nada nos deixa em virtude do quê sejamos exaltados à
vista de Deus; senão que, antes, tudo nisto se contém: que a arrogância nos contenha,
humilhe, prostre e nos esmague inteiramente. Mas o Espírito Santo, com as
promessas mencionadas, socorre nossa debilidade, que no momento sucumbiria e
se veria por terra, se não fosse sustentada com esta esperança e não mitigasse suas
dores e insatisfação com este consolo. Primeiro, que cada um pondere bem quão difícil é abrir mão e renunciar não só
a todas as suas coisas, mas também a si próprio. E no entanto, com esta instrução preliminar, Cristo inicia a seus discípulos, isto é, a todos os piedosos. Então, assim
os educa através da vida toda sob a disciplina da cruz, para que não ponham o coração
ou na cobiça, ou na confiança dos bens presentes. Em suma, assim trata com
eles quase sempre que, para onde quer que volvam os olhos, quão longe se divisa
este mundo, nada senão desespero percebem por toda parte a se lhes antepor, de
sorte que Paulo diz que seremos mais miseráveis que todos os demais homens, caso
esperemos somente neste mundo [1Co 15.19].
Para que nestas tão profundas angústias não sucumbam, o Senhor se faz presente
com eles, o qual insta a que mais alto levantem a cabeça e mais distante distendam
os olhos, para que nele encontrem a bem-aventurança que no mundo não vêem.
A esta bem-aventurança chama prêmio, recompensa, retribuição, não estimando o
mérito das obras, mas significando ser uma compensação às suas tribulações, sofrimentos,
aborrecimentos etc. Por essa razão, nada impede que à vida eterna, segundo
o exemplo da Escritura [2Co 6.13; Hb 10.35; 11.26], chamemos recompensa, porque
nela o Senhor afasta aos seus dos labores ao descanso, da aflição a um estado
próspero e desejável, da tristeza à alegria, da pobreza à afluência, da ignominia à
glória, enfim, todos os males que têm sofrido ele converta em bensmaiores. Assim
também nada haverá de inconveniente se considerarmos a santidade de vida como o
caminho; na verdade, não que faculte o acesso à glória do reino celeste, mas mercê
da qual os eleitos sejam conduzidos por seu Deus à sua manifestação, uma vez que
esta é sua boa vontade: glorificar aos que santificou [Rm 8.30]. Só não imaginamos
a correlação de mérito e recompensa em que despropositadamente se apegam os
sofistas, porquanto não atentam para este fim que estamos a expor. Quão contrário é,
porém, que olhem em outra direção, quando a um único alvo nos chama o Senhor!
Nada é mais claro que ser prometida recompensa às boas obras no propósito de suster
com alguma consolação a fraqueza de nossa carne; não, porém, no intuito de inflar os
ânimos de vanglória. Portanto, quem daí infere mérito de obras, ou na balança pesa
obra com recompensa, do reto desígnio de Deus desmesuradamente se desgarra.
João Calvino
Escola Bíblica Conhecedores da verdade - O objetivo deste blog e levar você a conhecer a verdade que liberta de todo o Engano. Nesses últimos tempos, muito se tem ouvido falar do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, porém de maneira distorcida e muitas vezes pervertida, com heresias disfarçada etc. “ ...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” João 8.32