No que tange aos santos que, mortos na carne, vivem em Cristo, se lhes atribuímos
alguma oração, não sonhemos com isso que eles mesmos tenham outro caminho
de rogar a Deus senão Cristo, que é o único caminho [Jo 4.16]; tampouco que
suas preces sejam aceitáveis a Deus em outro nome. E assim, uma vez que a Escritura
volve nossa mente unicamente para Cristo, e já que o Pai celestial quer nele convergir todas as coisas [Ef 1.10; Cl 1.20], foi da máxima obtusidade, para não
dizer da máxima insânia querer assim engendrar-nos acesso por meio deles paraque
fôssemos afastados para longe daquele à parte de quem nem a eles próprios se lhes
patenteia qualquer entrada. Não obstante, quem haja de negar que isto foi feito por
alguns séculos e que hoje é feito onde quer que floresça o papismo?
Para obter a benevolência de Deus, põem diante dele os méritos santos e, na
maioria das vezes, pondo Cristo de parte, suplicam a Deus através dos nomes deles.
Porventura, repito, não significa isto transferir para eles o ofício daquela singular
intercessão que supra reivindicamos para Cristo? Ademais, quem, quer anjo, quer
demônio, jamais atribuiu a qualquer dos homens sequer uma sílaba acerca de intercessão
dessa natureza, que imaginam para eles? Ora, na Escritura não consta nada
disso. Portanto, com que razão foi ela inventada? Incontestavelmente, enquanto o
engenho humano busca para si, afoitamente, subsídios dos quais não é munido através
da Palavra de Deus, põe à mostra cristalinamente sua carência de fé. Porque, se
a consciência desses tais for invocada, os quais se comprazem na intercessão dos
santos, descobriremos que isso não procede de outra parte senão porque laboram
em ansiedade, como se aqui Cristo fosse deficiente, ou fosse excessivamente severo.
Acima de tudo, com essa perplexidade eles ultrajam a Cristo e o despojam do
título de único Mediador, o qual, assim como lhe foi dado pelo Pai como singular
prerrogativa, assim também não deve ser transferido a outrem. E de fato com isso
mesmo lhe obscurecem a glória do nascimento e lhe esvaziam a cruz; enfim, tudo
quanto ele fez ou sofreu, o esbulham e o defraudam de seu louvor quando, de fato,
tudo tende que só ele seja tido na conta de Mediador. Ao mesmo tempo, rejeitam a
benignidade de Deus, o qual lhes é exibido por Pai; pois, não lhes é Pai, a não ser
que reconheçam Cristo como seu Irmão. Negam isto abertamente, salvo se refletirem
em seu íntimo que ele nutre por eles fraterno afeto, do quê nada pode ser mais
suave ou mais terno. Por isso, a Escritura no-lo oferece com exclusividade, nos
remete a ele e nos sustém nele. Ambrósio afirma que “ele é nossa boca, através da
qual falamos com o Pai; nossos olhos, através dos quais vemos o Pai; nossa destra,
através da qual nos oferecemos ao Pai. A não ser que ele interceda, nem nós, nem
todos os santos, temos alguma coisa com Deus.” Se objetam, dizendo que as
preces públicas que nos templos proferem são concluídas com este apêndice, por
Cristo, nosso Senhor, é isso frívolo subterfúgio, visto que não menos se profana a
intercessão de Cristo quando é misturada às preces e méritos dos mortos, que se for
omitida inteiramente, a referência seria meramente aos mortos. Além disso, em todas
as suas litanias, hinos e jaculatórias, onde não deixam nada de honra a conferir
aos santos mortos, não se faz nenhuma menção a Cristo.
João Calvino
Escola Bíblica Conhecedores da verdade - O objetivo deste blog e levar você a conhecer a verdade que liberta de todo o Engano. Nesses últimos tempos, muito se tem ouvido falar do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, porém de maneira distorcida e muitas vezes pervertida, com heresias disfarçada etc. “ ...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” João 8.32