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sábado, 22 de setembro de 2018

DA ORAÇÃO, QUE É O PRINCIPAL EXERCÍCIO DA FÉ E MEDIANTE A QUAL RECEBEMOS DIARIAMENTE OS BENEFÍCIOS DE DEUS

A ORAÇÃO, COROLÁRIO ABSOLUTO E SEQÜELA NECESSÁRIA DA FÉ

 Destas coisas que foram discutidas até este ponto percebemos não obscuramente quão carente e vazio de todas as coisas boas é o homem e como lhe faltam todos os recursos de salvação. Portanto, se ele busca meios pelos quais socorra a sua carência, lhe é necessário que saia fora de si mesmo e os obtenha em outra parte para si. Também já demonstramos que o Senhor voluntária e liberalmente se nos revela em Cristo, no qual nos oferece a felicidade em vez da miséria e toda classe de riquezas em vez de pobreza; em quem nos abre os tesouros celestes, para que toda nossa fé contemple o Filho amado, toda nossa expectação dependa dele, toda nossa esperança se apegue a ele e repouse nele. Esta é, deveras, uma filosofia secreta e estranha e que não se pode desvendar pelo uso de silogismos. Mas de fato a aprendem integralmente aqueles a quem Deus abriu os olhos para que em sua luz vejam a luz [Sl 36.9]. Aliás, depois que fomos ensinados pela fé a reconhecer que tudo quanto nos é necessário e nos falta, isso está em Deus e em nosso Senhor Jesus Cristo, em quem de fato quis o Pai que residisse toda a plenitude de sua liberalidade [Jo 1.16; Cl 1.19], para que daí, como de uma fonte inesgotável, todos bebamos, resta que nele busquemos e dele, em súplicas, peçamos o que aprendemos nele residir. De outra sorte, conhecer a Deus como Senhor e administrador de todas as coisas boas. Que nos convida que lhas peçamos, contudo não ir a ele nem pedir propriamente com base em nosso proveito pessoal, como se uma pessoa não fizesse caso e desejasse que fosse enterrado e escondido sob a terra um tesouro que lhe foi revelado. Conseqüentemente, para mostrar que da invocação divina a verdadeira fé não pode estar ociosa, o Apóstolo estabeleceu esta ordem: assim como a fé é nascida do evangelho, assim através de nosso coração se afeiçoa por ela a invocar o nome de Deus [Rm 10.14-17]. E isto mesmo é o que havia dito um pouco antes: o Espírito de adoção, que sela o testemunho do evangelho em nossos corações, alça nossos espíritos a que ousem expor seus desejos a Deus, suscitar gemidos inexprimíveis, clamar com confiança: “Abba, Pai” [Rm 8.15, 16, 26]. Portanto, convém agora tratar mais extensivamente este último ponto, porquanto foi referido antes apenas de passagem e abordado como que superficialmente.

João Calvino