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sábado, 22 de setembro de 2018

TERCEIRA REGRA DA ORAÇÃO CORRETA: TOTAL RENÚNCIA DA AUTOCONFIANÇA, HUMILDE RECONHECIMENTO DO DEMÉRITO PESSOAL E SINCERO DESEJO DE PERDÃO

A estas duas regras há que acrescentar-se uma terceira: que quem se apresenta diante de Deus com o intuito de orar, renuncie todo pensamento de glória pessoal, se desnude de toda noção de dignidade pessoal, enfim, abra mão de toda confiança em si próprio, em sua humildade dê glória absolutamente a Deus; para que, se algo, por mínimo que seja, reivindiquemos para nós, com nossa vanglória fracassamos diante de sua face. Encontramos freqüentes exemplos desta submissão nos servos de Deus, a qual lança por terra toda arrogância, dos quais, quanto mais santo é cada um deles, tanto mais profundamente se humilha quando comparece à presença do Senhor. Assim Daniel, a quem o próprio Senhor recomendou com tão grande encômio: “porque”, diz ele, “não lançamos nossas súplicas perante tua face fiados em nossas justiças, mas em tuas muitas misericórdias. Ó Senhor, ouve; ó Senhor, perdoa; ó Senhor, atende-nos e age sem tardar; por amor de ti mesmo, ó Deus meu; porque tua cidade e teu povo são chamados por teu nome” [Dn 9.18, 19]. Nem tampouco se deve dizer que, segundo o costume popular, ele se põe entre os demais contando-se como um deles; mas, antes, em sua própria pessoa se declara pecador e se refugia na misericórdia de Deus, como ele mesmo fracamente testifica dizendo: “Quando confessei meus pecados e os de meu povo” [Dn 9.20]. Davi também prescreve esta humildade com seu exemplo pessoal: “Não entres em juízo com teu servo, porque a tua vista nenhum vivente será justificado” [Sl 143.2].
Em tal forma ora Isaías: “Eis que tu te iraste, porque temos pecado; fundado em teus caminhos está o mundo, por isso seremos preservados. E todos ficamos saturados de imundície, e todas as nossas justiças são como um pano sujo, e todos nós murchamos como uma folha, e nossas iniqüidades nos espalham como o vento. E não há quem invoque teu nome, quem se anime a chegar-se a ti. Pois que escondeste de nós tua face e nos fizeste derreter na mão de nossa iniqüidade. Agora, pois, Senhor, tu és nosso Pai; nós somos o barro, tu és nosso modelador, e nós somos a obra de tua mão. Não te ires, Senhor, nem te lembres da iniqüidade para sempre. Agora, pois, volve teus olhos; todos nós somos teu povo” [Is 64.5-9]. Ele aqui, como eles, não se apóia em nenhuma outra confiança além desta: que, julgando-se do número dos servos de Deus, não desesperam de que haverão de estar sob seu cuidado. Jeremias não age de outra forma: “Posto que nossas iniqüidades testificam contra nós, age, Senhor, por amor de teu nome” [Jr 14.7]. Portanto, o que está escrito por autor incerto que se atribui ao profeta Baruque, mui verazmente e ao mesmo tempo mui santamente foi escrito, afinal por quem quer que seja: “A alma triste e desolada sobre a magnitude de seu mal, curvada e debilitada, a alma faminta e os olhos deficientes, dão-te glória, Senhor. Derramamos nossas orações em tua presença e diante de tua face, não segundo as justiças dos pais, pedimos misericórdia, ó Senhor nosso Deus, mas, porque tu és misericordioso; tem misericórdia de nós, porque temos pecado diante de ti” [Baruque 2.18, 19; 3.2].

João Calvino