Em terceiro lugar, resta explicar o que significa dizermos que o arrependimento
consta de duas partes, a saber: da mortificação da carne e da vivificação do Espírito.
Isto, contudo, ainda que um pouco simples e vulgarmente de acordo com a capacidade
e mentalidade do povo, o expõem com toda clareza os profetas, quando dizem:
“Desiste do mal e faz o bem” [Sl 34.14; 37.27]; de igual modo: “Lavai-vos, sede
limpos, removei de meus olhos o mal de vossas obras. Cessai de agir perversamente,
aprendei a fazer o bem, buscai o juízo, vinde em socorro do oprimido” etc. [Is
1.16, 17]. Pois, quando mandam o homem retroceder da maldade, em seguida exigem
a mortificaçãode toda a carne, a qual está saturada de maldade e de perversidade.
Coisa mui difícil e árdua é despir-nos de nós mesmos e apartar-nos de nossa
disposição natural. Ora, não se deve julgar que a carne já foi bem mortificada, a não
ser que tenha sido abolido tudo quanto temos de nós próprios. Como, porém, todo
afeto da carne é inimizade contra Deus [Rm 8.7], o primeiro passo para a obediência
de sua lei é essa renúncia de nossa natureza.
Em seguida, os profetas assinalam a renovação do Espírito em termos dos frutos
que daí se produzem, a saber: da justiça, do juízo e da misericórdia. Ora, na
verdade, não terá sido bastante desincumbir-se corretamente de tais deveres, a não
ser que a própria mente e o coração primeiro tenham se revestido do sentimento da
justiça, do juízo e da misericórdia. Isto se dá quando o Espírito de Deus assim nos
imbui a alma, embebida de sua santidade, não só de novos pensamentos, mas também
de novos sentimentos, para que possa com razão ser tida por nova. E, na realidade,
uma vez que por natureza estamos alienados de Deus, a menos que preceda a
renúncia de nós mesmos, jamais nos inclinaremos àquilo que é reto. Por isso, com
muita freqüência somos exortados a despir-nos do velho homem, a renunciar ao
mundo e à carne, dando adeus a nossas concupiscências e sendo renovados no espírito
de nosso entendimento [Ef 4.22, 23]. Com efeito, a própria palavra mortificação
nos adverte de quão difícil é esquecer a natureza antiga, porque daqui inferimos
que, não de outra maneira, somos conformados ao temor de Deus e aprendemos os
rudimentos da piedade, mas também que, violentamente imolados pela espada do
Espírito, somos reduzidos a nada. Como se Deus declarasse que, para que sejamos
contados entre seus filhos, é necessário que nossa comum natureza seja destruída!
João Calvino
Escola Bíblica Conhecedores da verdade - O objetivo deste blog e levar você a conhecer a verdade que liberta de todo o Engano. Nesses últimos tempos, muito se tem ouvido falar do evangelho de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo, porém de maneira distorcida e muitas vezes pervertida, com heresias disfarçada etc. “ ...e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” João 8.32