Total de visualizações de página

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

A CONFISSÃO ENSINADA NAS ESCRITURAS É CONFISSÃO A DEUS, NÃO A SACERDOTES

Com efeito, para que toda a matéria se faça mais evidente e mais desembaraçada, em primeiro lugar, mencionaremos fielmente que tipo de confissão nos foi ensinado na Palavra de Deus; em seguida, também faremos menção de suas invenções, certamente não todas (pois quem exauriria esse mar imenso?), mas apenas essas que abarcam a suma de sua confissão secreta. Aqui envergonha relembrar quão freqüentemente o tradutor antigo verteu o termo confessar em lugar de louvar, o que até aos ignorantes mais parvos foi dado a conhecer, exceto que vem a propósito pôr-se à mostra sua ousadia em transferirem para seu edito tirânico o que fora escrito sobre os louvores de Deus. Para provar que a confissão tem o condão de alegrar as mentes, forçam essa expressão do Salmo [42.4]: “na voz de exaltação e de confissão.” Ora, se tal metamorfose semântica for tida como procedente, então podemos engendrar o que bem quisermos. Quando, porém, a tal ponto tenham eles perdido o pejo, lembrem-se os leitores piedosos de que pela justa represália de Deus foram entregues a uma mentalidade réproba, para que sua ousadia viesse a ser ainda mais detestável. Pois, se nos apraz aquiescer ao simples ensino da Escritura, não haverá perigo de que alguém nos ludibrie com mentiras desse gênero. Pois ali se prescreve uma forma de confissão, a saber, uma vez que o Senhor é Aquele que perdoa, esquece, apaga os pecados, que a ele confessemos nossos pecados no propósito de obter seu perdão. Ele é o médico: então, apresentemos-lhe nossas feridas. Ele foi ultrajado e vilipendiado: dele, pois, roguemos paz. Ele é o que esquadrinha os corações e está consciente de todos os pensamentos: apressemo-nos a derramar nosso coração diante dele. Ele é, enfim, Aquele que chama a si os pecadores: não nos demoremos a achegar-nos a ele. “Meu pecado”, diz Davi, “te fiz conhecido, e minha injustiça não a escondi de ti. Eu disse: Contra mim confessarei minha injustiça ao Senhor e tu remitiste a iniqüidade de meu coração” [Sl 32.5]. Tal é outra confissão do próprio Davi: “Compadece-te de mim, ó Deus, segundo tua grande misericórdia” [Sl 51.1]. Tal é também a confissão de Daniel: “Temos pecado, Senhor, temos agido perversamente, temos praticado impiedades e temos sido rebeldes, desviando-nos de teus preceitos” [Dn 9.5]. E outras que ocorrem por toda parte nas Escrituras, cuja enumeração quase encheria um volume. “Se confessarmos nossos pecados”, diz João, “fiel é o Senhor para que nos perdoe nossos pecados” [1Jo 1.9]. Confessamo-nos a quem? Evidentemente a ele próprio, isto é, se de coração aflito e abatido, diante dele nos prostrarmos, se nos acusarmos e nos condenarmos sinceramente perante ele, roguemos para que sejamos absolvidos por sua bondade e misericórdia.

João Calvino