A cada um desses pontos responderei em poucas palavras. Silencio, porém, no
momento, com que direito, ou com que falta de direito, amarram eles com suas leis
as almas dos fiéis, uma vez que isso será considerado em seu devido lugar. No
entanto, o fato de imporem uma lei quanto à enumeração de todos os pecados, que
negam ser o pecado perdoado, salvo sob uma condição: se tenha sido concebida
firmemente a intenção de confessar-se; que vociferam não haver nenhum acesso ao
paraíso, caso seja negligenciado o ofício de confessar-se, na verdade isso de modo
algum se deve admitir.
É necessário enumerar todos os pecados? Davi, porém, segundo penso, que meditara
consigo, cuidadosamente, a confissão de seus pecados, no entanto exclamava:
“Quem discernirá seus erros? Purifica-me, Senhor, de meus erros ocultos” [Sl 19.12].
E, em outro lugar: “Minhas iniqüidades passaram sobre minha cabeça; como carga
pesada são demais para minhas forças” [Sl 38.4]. Certamente ele compreendia quão
grande era o abismo de nossos pecados, quão numerosas as faces de nossos delitos,
quantas cabeças esta hidra ostentava e quão longa cauda arrastava. Portanto, Davi
não se entregava a compendiar uma relação deles, mas do profundo de suas misérias
clamava ao Senhor: “Estou quebrantado, estou aniquilado e sufocado; cercaramme
as portas dos infernos, me acho imerso em fundo poço, a perder as forças e a
morrer, que tua mão me tire daí.” Ora, quem cogitará um cômputo de seus pecados,
quando vê que Davi não pode fazer a contagem dos seus?
João Calvino