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quarta-feira, 19 de setembro de 2018

HÁ DUAS PRAGAS QUE É PRECISO ELIMINAR DA MENTE: A CONFIANÇA NA JUSTIÇA PROCEDENTE DAS OBRAS E A VANGLÓRIA QUE PROVOCAM

Nesta parte, devem-se, mais que qualquer coisa, alijar da mente duas pragas: que nada ponham de confiança na justiça procedente das obras, e que não se lhes atribuam nenhuma glória. As Escrituras, por toda parte, nos dissuadem de toda e qualquer confiança quando ensinam que todas as nossas justiças exalam mal cheiro à vista de Deus, salvo se derivarem perfume da inocência de Cristo; que nada podem senão exacerbar a vingança de Deus, a não ser que sejam mantidas na indulgência de sua misericórdia. De fato, dessa forma nada mais nos resta fazer, senão implorarmos a nosso juiz, com aquela confissão de Davi: Ninguém será justificado diante dele, caso exija conta de seus servos [Sl 143.2]. Onde, porém, Jó diz: “Se agi como um ímpio, ai de mim; mas, se agi justamente, nem assim levantarei a cabeça” [Jó 10.15], ainda que vise àquela suprema justiça de Deus, à qual nem mesmo os anjos satisfazem, entretanto isso ele mostra, ao mesmo tempo: quando, ante o juízo de Deus, nada se vê restar a todos os mortais senão que emudeçam. Pois não significa que prefere ceder a Deus por livre vontade em vez de expor-se ao risco de combater contra seu rigor, mas que não reconhece em si mesmo uma justiça capaz de cair por terra assim que compareça diante do juízo de Deus. Eliminada a confiança egoísta, necessariamente também se evapora toda jactância pessoal. Pois, quem confere o louvor da justiça às obras, por cuja confiança trema à vista de Deus? Portanto, é preciso que cheguemos ao lugar para onde nos chama Isaías, para que em Deus seja louvada e se glorie toda a semente de Israel [Is 45.25], porquanto mui verdadeiro é o que diz em outro lugar, que somos uma plantação da glória de Deus [Is 61.3]. Portanto, a mente estará então devidamente purificada quando a confiança nas obras se reclinará em qualquer aspecto, nem em sua glória exultará. Mas o erro de colocar sempre nas obras a causa de sua salvação insufla os homens estultos ao alento desta confiança falsa e fútil.

João Calvino